Estão a faltar sedimentos nas profundezas do oceano. Nenhum estudo os conseguiu encontrar

Uma meta-análise de mais de uma centena de locais geográficos em todo o mundo, abrangendo todas as massas de terra continentais, revelou uma extensa lacuna no registo geológico global: nenhum dos estudos analisados encontrou a enorme quantidade de sedimentos que deveria haver no fundo do oceano.

Há muitas décadas que prevalece a teoria de que um grande arrefecimento, acompanhado por uma descida significativa do nível do mar, terá afetado o clima da Terra há cerca de 34 milhões de anos.

Um dos efeitos deste evento climático de grande escala deveria ter sido uma enorme quantidade de sedimentos arenosos depositados no fundo do oceano, que deveriam ter permanecido preservados até hoje.

Esses sedimentos deveriam oferecer pistas sobre o que causou mudanças climáticas tão significativas durante este antigo capítulo da história do nosso planeta.

No entanto, os sedimentos do oceano profundo que os cientistas esperavam encontrar, marcando um dos períodos mais drásticos de alterações climáticas da Terra desde a extinção dos dinossauros, aparentemente não existem.

Segundo um novo estudo, conduzido por uma equipa de investigadores da Universidade de Stanford, que analisou dados de centenas de estudos anteriores, nunca foi descoberta qualquer quantidade significativa de sedimentos que coincidisse com este período.

As conclusões do estudo, publicado na Earth-Science Reviews, lançam um mistério — que apresenta novas questões sobre o que alguns consideram ser uma aparente lacuna no registo geológico do nosso planeta.

Um caso curioso de sedimentos desaparecidos

Os resultados do estudo conduziram os investigadores a uma questão inevitável. “Para onde foi todo o sedimento?” diz Stephan Graham, professor na Stanford Doerr School of Sustainability e autor principal do estudo.

Encontrar as respostas a esta pergunta desconcertante poderia finalmente permitir a investigadores como Graham e os seus colegas desvendar a dinâmica do que aconteceu ao nosso planeta durante este período e o impacto das alterações climáticas nos sistemas sedimentares marinhos.

A aparente “lacuna” no registo geológico, indicada pela ausência desta camada de sedimentos, aponta para a variedade de fatores que podem influenciar mudanças climáticas dramáticas, observações que também podem ajudar os investigadores a compreender melhor os elementos que impulsionam as mudanças modernas que ocorrem no clima da Terra.

Segundo Zack Burton, professor assistente de Ciências da Terra na Montana State University, esta é a primeira vez que uma perspetiva global dos sistemas sedimentares oceânicos do planeta responde ao período de extrema transição que ocorreu entre o Eoceno e o Oligoceno, a segunda e terceira épocas do que outrora foi formalmente designado por Período Terciário.

“Pela primeira vez, analisámos globalmente uma resposta pouco estudada dos maiores sistemas de movimentação de massas sedimentares do planeta durante a transição extrema do Eoceno-Oligoceno”, afirma Burton, primeiro autor do novo estudo, em comunicado da universidade.

História do clima quente e frio da Terra

Durante o período em questão, registou-se um arrefecimento significativo em todo o planeta, o que levou à acumulação de água congelada na Antárctida, anteriormente sem gelo.

O nível do mar em todo o mundo desceu à medida que a água se acumulava perto dos pólos, e o início de alterações climáticas significativas acabou por provocar a extinção generalizada de animais, tanto em terra como no mar.

Durante milhões de anos antes disso, os dados climáticos indicam que a Terra tinha mantido as temperaturas mais quentes e os níveis do mar mais elevados desde o desaparecimento dos dinossauros.

Uma abundância de depósitos arenosos está correlacionada com este período, tal como identificado em investigação anterior publicada por Burton e a sua equipa, que atribuem à erosão da terra que foi levada para o mar por sistemas meteorológicos intensos durante este período.

Levando a sua investigação mais longe, a equipa começou então a examinar os períodos Eocénico e Oligocénico, com uma pesquisa maciça de literatura científica que remonta a mais de um século — que lhes permitiu analisar o arrefecimento extremo que se seguiu a um dos períodos quentes mais longos da Terra.

“O processo de reavaliar, reinvestigar e reanalisar a literatura que, nalguns casos, já foi publicada há décadas, é um desafio“, afirmou Burton, salientando que também pode “conduzir a descobertas excitantes e inesperadas, como as que conseguimos fazer aqui”.

Segundo o Debrief, o que descobriram foi inesperado, uma vez que a equipa nunca tinha previsto encontrar tão poucas provas de sedimentos do Eocénico e Oligocénico posteriores.

Não encontrámos uma deposição abundante de areia, como no nosso estudo dos climas quentes do início do Eocénico”, diz Burton.

Em vez disso, vimos que inconformidades erosivas proeminentes e generalizadas — por outras palavras, lacunas no registo rochoso – se desenvolveram durante o arrefecimento climático extremo e a mudança oceanográfica do Eocénico-Oligocénico”, acrescenta.

Porque pode existir uma “lacuna” no registo geológico

Quanto aos processos que podem ter causado tão pouca deposição de sedimentos, Burton e a equipa sugerem que pode ter havido movimento devido às correntes do fundo do oceano que impediram os sedimentos de se depositarem durante este período.

Outra possibilidade é que os sedimentos normalmente depositados em bacias mais próximas da costa possam ter sido transportados para mais longe, acabando por se depositar nas planícies abissais profundas, que cobrem mais de 50% da superfície da Terra, mas que continuam a ser algumas das áreas menos exploradas do nosso planeta.

Quaisquer que tenham sido os processos que ocorreram, os investigadores estão confiantes de que estiveram presentes a nível global e afectaram não só o fundo dos oceanos, mas também praticamente todas as áreas das massas terrestres da Terra.

“As nossas descobertas podem ajudar a informar-nos sobre os tipos de mudanças radicais que podem ocorrer na superfície da Terra face às rápidas alterações climáticas”, afirma Graham. “O passado geológico informa o presente, e, particularmente o futuro”.

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