“Há pior que na Madeira”: Almeirim, a terra monopartidária

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PS, PS, depois PS. Com percentagens que chegam a ultrapassar os 70%. O que se passa na terra da sopa da pedra?

Não foi a primeira vez, certamente não foi a última: a indicação de um leitor do ZAP originou um artigo.

No dia seguinte às eleições regionais na Madeira, salientámos o facto de – para não variar – o PSD ter vencido no arquipélago.

Foi sempre assim em democracia. Desde o 25 de Abril, mais concretamente desde as primeiras eleições, o PSD venceu sempre as eleições na Madeira. E quase sempre com maioria absoluta.

Na sequência desse artigo, um leitor chamou-nos a atenção: “Há pior que na Madeira”, escreveu num e-mail.

O leitor destacou um concelho onde, eleição após eleição, é sempre o mesmo partido a ganhar.

Convidou-nos a espreitar o caso de Almeirim – foi o que fizemos.

PS, PS, PS…

Nas últimas eleições autárquicas (2021), o PS ganhou com 68%. Entre 7 mandatos, seis foram entregues a socialistas, deixando apenas 1 para a CDU, que teve pouco mais de 10%.

Em 2017, o PS tinha vencido com uma percentagem incrível de 74%, novamente com 6-1 em mandatos perante a CDU.

Em 2013, quase 60% e 5 mandatos (curiosamente com empate entre CDU e PSD+CDS, que tiveram exactamente o mesmo número de votos, e 1 mandato cada).

Nas eleições de 2009, praticamente 53% dos votos para o PS. Em 2005, os socialistas chegaram aos 55%. Um pouco acima (quase 59%) em 2001, também para o PS.

Olhando para o século passado, praticamente 62% para o PS em 1997 e em 1993.

Mas, ao contrário do que acontece com o PSD na Madeira, nem sempre houve vitória do PS neste concelho inserido em Santarém.

Em 1989 os socialistas ganharam por pouco (30%-26%) e tiveram 2 mandatos, tal como PRD e CDU.

Mas em 1985 foi o PRD que venceu. O partido sempre associado a Ramalho Eanes deixou a APU no segundo lugar, o PSD no terceiro e o PS… no quarto posto. Apenas 1 mandato, com 19% para os socialistas.

Foi um fenómeno isolado: vitória do PS em 1982, em 1979 e 1976. Nos dois primeiros casos acima dos 50% de votos, no último com 44%.

Ou seja, em 13 eleições autárquicas, o PS só perdeu uma vez. Mas não é bem isso que se destaca.

Até porque há concelhos/freguesias onde é sempre, ou quase sempre, o mesmo partido a ganhar as autárquicas. Por exemplo ali ao lado, no Cartaxo, desde o 25 de Abril o PS ganhou sempre até 2017; só nas últimas eleições, em 2021, é que foi derrotado pelo PSD.

Mas, mais do que estes triunfos constantes, quase todas foram vitórias “esmagadoras”, deixando os adversários longe. Semelhante ao que acontece por exemplo em Arraiolos (Évora), onde os comunistas ganham sempre, e confortavelmente.

Porquê?

Dizem os naturais de Almeirim que este domínio do PS – e da esquerda no geral, já que os comunistas costumam ficar no segundo lugar – ainda vem do 25 de Abril. Ou melhor, do que acontecia antes do 25 de Abril.

Numa terra repleta de latifundiários, os donos das propriedades ficavam lá no topo e o povo cá em baixo “não tinha nada”, enquanto os latifundiários “tinham tudo”.

Logo desde o 25 de Abril, a grande maioria dos locais, ou escolheu PS, ou PCP. É uma terra tradicionalmente de esquerda. Desde sempre, desde que há eleições.

São as razões que também dominam diversos locais no Alentejo, ao longo dos últimos 50 anos.

E basta recordar que a ponte que une Almeirim e Santarém chama-se Ponte Salgueiro Maia; na noite de 24 de Abril de 1974, os militares saíram de Santarém, ali ao lado.

E ainda há outro factor: a Compal é a grande empregadora em Almeirim; e os trabalhadores são quase todos operários, todos “em campanha” pela esquerda.

O que está conotado com a direita é salazarista.

A tradição ficou. Almeirim não é bem uma terra monopartidária – porque há mais do que um partido – mas, no dia de ir votar, é quase.

Os números recentes, a rondar ou mesmo a ultrapassar os 70%, estão também relacionados com o actual presidente Pedro Ribeiro (PS, claro), que convence a população local.

Mas está a mudar…

As próximas eleições autárquicas são só em 2025, no próximo ano. Mas as legislativas deste ano já mostram que o domínio incontestável do PS pode ter acabado.

É certo que o PS ganhou. Mas ficou-se pelos 33%, contra os quase 26%… do Chega.

Num concelho repleto de imigrantes nepaleses ou indianos, há muitos eleitores locais a “virar” para o Chega, tal como acontece em diversos outros concelhos em Portugal.

Em 2025 o panorama que se repete há quase 40 anos pode acabar.

Nuno Teixeira da Silva, ZAP //

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