Cancro da próstata associado a dieta pobre em proteínas durante a gravidez

Uma nova investigação relaciona a alimentação durante o período de gravidez com o aumento do risco de cancro da próstata na descendência, sugerindo que uma gravidez pobre em proteínas pode ser responsável por aumentar a probabilidade de desenvolver cancro.

Num estudo realizado na Universidade Estadual Paulista (UNESP), no Brasil, detetaram-se alterações significativas na expressão genética associada a um desequilíbrio hormonal na descendência de ratos. Este desequilíbrio parece estar relacionado com o aumento de risco de cancro da próstata.

“Uma gestação e lactação pobre em proteínas desregula as vias moleculares envolvidas no desenvolvimento normal da próstata, comprometendo o seu crescimento na descendência. Isto já era conhecido”, explica Luís António Júnior, autor do estudo e professor no Instituto de Biociências de Botucatu

“No entanto, descobrimos agora que esta desregulação acontece através da expressão de mais de 700 genes, incluindo o gene ABCG1, diretamente responsável pelo cancro da próstata”, acrescenta.

A relação entre a alimentação do progenitor e o desenvolvimento de cancro na descendência não é uma novidade para a comunidade científica.

De facto, sabe-se que o desenvolvimento de doenças não está apenas relacionado com a nossa predisposição genética, mas também com o ambiente em que estamos inseridos. O ramo da genética que descreve a influência do ambiente é a epigenética.

As alterações epigenéticas são reversíveis e não alteram a sequência de DNA. Ao invés, estas alteram a forma como o organismo lê uma sequência de DNA e, por conseguinte, alteram o nível de expressão de determinados genes.

Este padrão de expressão genética pode, por sua vez, ser transmitido às gerações futuras. Por isso é que o ambiente em que os nossos progenitores viveram pode influenciar o contexto em que nos vamos desenvolver no futuro.

Quando a interação entre a predisposição genética e o ambiente externo é desadequada durante a fase embrionária e durante os primeiros anos de vida há um aumento no risco de desenvolver várias doenças crónicas não transmissíveis, tais como o cancro, diabetes, doenças respiratórias crónicas e doenças cardiovasculares.

De acordo com um estudo internacional publicado em 2009, o risco de cancro da próstata estava aumentado em homens judeus que, durante a primeira infância, estiveram expostos à fome e aos horrores vividos durante o Holocausto.

Neste estudo, procurou-se compreender os mecanismos celulares envolvidos neste processo através de experiências com ratos. Para tal, os cientistas procuraram perceber se o nível de expressão genética estava alterado em ratos cujos progenitores tiveram uma alimentação pobre em proteínas.

Os investigadores desenharam o perfil de expressão global de micro RNA e RNA mensageiro. O micro RNA modula a expressão do RNA mensageiro através de eventos epigenéticos. Portanto, tanto o micro RNA como o RNA mensageiro têm um papel preponderante na expressão genética.

Após obterem o perfil de expressão genética, os investigadores sequenciaram o RNA e analisaram as sequências utilizando ferramentas bioinformáticas.

Os resultados mostraram que, de facto, os genes relacionados com o cancro da próstata estavam mais expressos nos ratos que sofreram deficiência alimentar intrauterina.

Esta desregulação, por sua vez, deve-se a um tipo de microRNA específico, o microRNA-206, que é regulado pelos níveis de estrogénio no início da vida.

“Também descobrimos que o miR-206 modula a expressão do recetor de estrogénio alfa, que se acredita estar associado ao aumento do risco de cancro da próstata em idade adulta”, acrescenta Justulin.

“Estes ratos tinham mais níveis de estrogénio. E estes níveis aumentavam ainda mais à medida que envelheciam, à medida que os níveis de andrógenos diminuem. Este desequilíbrio hormonal está associado ao desenvolvimento de cancro da próstata em humanos”, explica o autor do estudo, publicado recentemente na revista Scientific Reports.

Quando os investigadores procuraram relacionar os resultados do estudo com um banco de dados do cancro da próstata humano, descobriram que o gene ABCG1, cuja expressão estava alterada, era um potencial gene DOHaD. Isto é, um gene associado a distúrbios no desenvolvimento da próstata, que tem efeitos duradouros e que pode aumento o risco de desenvolver cancro.

“Com estes resultados conseguimos mostrar que as alterações no perfil de expressão genética podem persistir ao longo da vida dos ratos, tornando-os predispostos ao cancro da próstata, à medida que envelhecem”, acrescenta Justin.

“Curiosamente, identificámos marcadores moleculares que são frequentemente desregulados em ratos com desnutrição materna, bem como em pacientes com cancro da próstata humano”, diz o investigador

“Os dados sugerem que a desnutrição materna é um fator ambiental chave na origem do cancro da próstata na descendência de ratos”, conclui o autor do estudo.

Patrícia Carvalho, ZAP //

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