Em 2010, por cada 100 euros de depósitos, havia… 159 euros em empréstimos. Capital, liquidez, exposição ao risco: a realidade agora é outra.
O alarme soou há cerca de três semanas, quando o Silicon Valley Bank foi encerrado nos EUA.
O alarme repetiu-se e reforçou-se poucos dias depois, desta vez na Europa, com a queda do Credit Suisse.
O banco suíço já estava a dar sinais claros de que poderia ruir, desde o ano passado. E já na altura temeu-se uma crise semelhante à de 2008, quando o Lehman Brothers faliu.
Muitos portugueses – e não só – terão pensado num possível efeito dominó, temendo que os bancos portugueses também iriam cair, um após outro.
No entanto, os números apresentados nesta quarta-feira pelo portal Eco deixam a ideia de que isso não deverá acontecer. A banca lusa está mais bem preparada do que há 15 anos.
Começando pelos empréstimos em situação de incumprimento, o cenário é outro. Houve uma autêntica “limpeza” nesse aspecto, nos últimos anos. Desde Junho de 2016, trimestre após trimestre, o rácio de malparado desceu sempre; atingiu os 3,2% do total do crédito em Setembro do ano passado. Traduzindo: em cada 100 euros de crédito dado à economia, apenas 3,2 euros é crédito problemático (chegou a ser 17,9%, há sete anos). Há agora maior protecção das casas das famílias e dos bancos.
Os bancos estão claramente menos expostos ao risco. Os activos ponderados pelo risco eram quase 67% em 2007; no ano passado ficaram-se pelos 42,4%. Este factor inclui os riscos subjacentes às carteiras dos bancos: empréstimos a clientes, títulos de dívida, valores mobiliários e todo o tipo de activos. Depois, cada activo tem ponderador de risco diferente; as acções têm maior risco do que os títulos do governo ou o dinheiro em caixa, por exemplo, e por isso exigem maiores protecções.
A solidez dos bancos portugueses também é outra. A regulação apertou, as exigências também. Os bancos têm agora mais fundos próprios (30 mil milhões de euros) para reagir a eventuais perdas – os contribuintes, em princípio, ficarão de fora se for preciso “salvar” um banco. O rácio de capital, o rácio de fundos próprios de nível 1, era 6,6% em Março de 2009; passou para um máximo de 16,4% no final de 2020 e as últimas contas (Setembro 2022) apresentam um rácio de 15,3%. É mais do dobro dos números de há 15 anos (7,1% em Março de 2008).
O rácio de transformação de depósitos em empréstimos – negócio tradicional de qualquer banco – é de 79%; por cada 100 euros de depósitos, há 79 euros emprestados (e a render juros). Se recuarmos a Junho de 2010, verificamos que nessa altura, por cada 100 euros de depósitos, havia… 159 euros em empréstimos.
Por fim, a capacidade para absorver turbulência nos depósitos, o “estado líquido” dos bancos. Desde 2015 os bancos são obrigados a cumprir rácios de cobertura de liquidez. Ou seja, têm que ter activos líquidos e não onerados que possam ser facilmente vendidos nos mercados – com pouca ou nenhuma perda de valor – e suficientes para suportar um período de stress de 30 dias. Esse rácio de cobertura de liquidez era de 150% em 2016 e, no ano passado, estava em 254%. Uma margem considerável, também aqui.
O problema da banca é o risco potencial que neste momento está presente em quase todos os bancos. Não se esqueçam que os bancos estão cheios de ativos com remuneração fixa a 1% e pouco mais do que isso quando agora se refinanciam a 3,5%.
Se precisarem de vender ativos, então o problema deixa de ser potencial e passa a ser bem real (terão de os vender por duas ou três vezes o valor que pagaram por eles, de modo a assegurar uma taxa de lucro competitiva para quem os adquire; caso contrário ninguém os comprará). E aí os problemas passam a ser todos bem reais.
O mesmo poderá vir a passar-se caso, num futuro próximo, o valor médio do imobiliário caia. Neste momento o banco tem, por exemplo, um imóvel avaliado em 500 mil para segurar um empréstimo de 400 mil. E quando o valor da casa passar para 350 mil? O ativo deixa de cobrir o valor do empréstimo (é uma queda muito exagerada mas no passado já houve quedas muito significativas). Mais um risco potencial que poderá não passar disso, caso o banco não precise de liquidez.