Confrontos no Leste da Ucrânia testam limites da crise com Moscovo

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Carlos Barrera / Reuters

Imagens da destruição de um jardim-de-infância no Leste da Ucrânia

Joe Biden voltou a alertar para a iminência de uma invasão russa da Ucrânia, que diz poder acontecer “nos próximos dias”. Kremlin considera declarações “lamentáveis”.

Segundo o Público, a tensão em torno da Rússia e da Ucrânia voltou a disparar com o regresso das hostilidades no Donbass.

Os bombardeamentos ocorridos na linha da frente da guerra, travada desde 2014, levaram os Estados Unidos e os seus aliados a alertar, uma vez mais, para a iminência de uma ofensiva russa sobre a Ucrânia.

Comparado com outros confrontos esporádicos que se registam periodicamente há vários anos entre o Exército ucraniano e as forças separatistas pró-russas no Leste da Ucrânia, os bombardeamentos desta quinta-feira nem foram dos mais destrutivos.

Não houve informação de mortes e o principal incidente foi a destruição parcial de um jardim-de-infância na localidade de Stanitsia Luhanska, na zona controlada por Kiev, em que ficaram feridas quatro pessoas.

As forças separatistas de Donetsk, citadas pelos órgãos de comunicação russos, dizem que a Ucrânia fez 93 disparos de morteiro ao longo do dia e que houve um civil ferido.

No entanto, num contexto de alarme elevado, os confrontos ganharam uma dimensão exacerbada por se aproximarem do tipo de operação que os serviços secretos norte-americanos têm antecipado há semanas como prelúdio de uma ofensiva.

Poucas horas depois de conhecidos alguns pormenores dos confrontos, o Presidente dos EUA, Joe Biden, disse ter razões para acreditar que a Rússia está envolvida numa “operação de bandeira falsa para criar uma desculpa” para iniciar uma invasão do território ucraniano, algo que pode acontecer “nos próximos dias”.

A urgência do momento levou o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, a alterar a sua agenda para intervir na reunião do Conselho de Segurança da ONU, onde expôs aquilo que acredita que Moscovo tem planeado.

“Primeiro, a Rússia planeia fabricar um pretexto para o seu ataque. Este pode ser um acontecimento violento pelo qual a Rússia vai responsabilizar a Ucrânia, ou uma acusação chocante que a Rússia vai apresentar contra o Governo ucraniano”, explicou Antony Blinken.

O secretário de Estado dos EUA deu exemplos como “a descoberta inventada de valas comuns, um ataque de drones encenado contra civis, ou um ataque falso, ou mesmo real, com recurso a armas químicas”.

Os alertas pelos EUA para planos orquestrados pelo Kremlin para poder justificar um ataque contra a Ucrânia têm sido frequentes nas últimas semanas, denotando a estratégia adotada pela Casa Branca de antecipar as ações da Rússia, esvaziando-as do potencial fator de surpresa.

Blinken deixou ainda um desafio à Rússia: “O Governo russo pode anunciar aqui hoje, sem equívocos ou desvios, que a Rússia não irá invadir a Ucrânia”.

A Rússia tem negado todas as acusações feitas por Washington, condenando o que diz ser a “histeria” ocidental, mas nunca rejeitou a hipótese de ser obrigada a defender militarmente os interesses russos no país vizinho.

Ainda recentemente, o Presidente russo, Vladimir Putin, fez referência ao “genocídio” da população russófona do Donbass.

Desta vez, o Kremlin acusou as forças ucranianas de “aumentar ainda mais a tensão” no Leste do país e disse que as palavras de Biden são “lamentáveis”.

As equipas de observadores ao serviço da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), responsáveis por monitorizar os confrontos no Donbass, deram nota de mais de 500 explosões desde a madrugada de quinta-feira, mas não forneceram mais detalhes.

Diplomacia afunda-se

A discórdia entre Washington e Moscovo mantém-se quanto ao posicionamento das tropas russas perto da fronteira da Ucrânia.

Os EUA, secundados pela NATO, dizem que a Rússia não só não fez recuar as suas forças, como está a aumentar o número de efetivos.

Um alto responsável da Administração Biden, falando sob anonimato, disse que a Rússia acrescentou mais sete mil soldados aos cerca de 150 mil que tem concentrados em vários pontos da fronteira ucraniana.

A acumulação de militares e equipamento das Forças Armadas russas ao longo de toda a fronteira com a Ucrânia, incluindo na Bielorrússia onde estão envolvidos em manobras conjuntas, é um fator crucial para aquela que já é descrita pela NATO como a maior crise de segurança na Europa desde o fim da Guerra Fria.

Esta semana, a Rússia disse que, tendo terminado os exercícios na região da Crimeia, começou a retirar as suas tropas da região.

Esta quinta-feira, o Ministério da Defesa deu mais pormenores sobre esta movimentação. O porta-voz Igor Konashenkov disse que unidades de logística do distrito militar ocidental regressaram à base de Dzerzhinsk, no centro da Rússia, enquanto outros batalhões voltaram às províncias da Chechénia e do Daguestão.

O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, explicou que a retirada dos soldados é “um processo que leva tempo”.

Eles não podem simplesmente levantar voo e ir embora“, afirmou. O Governo russo também reafirmou que as unidades militares instaladas na Bielorrússia vão abandonar o país depois de dia 20, a data em que terminam os exercícios.

Os canais diplomáticos entre a Rússia e os EUA também parecem estar cada vez mais fechados, dificultando as hipóteses de vir a ser alcançada uma solução política para a crise.

A Rússia expulsou o embaixador-adjunto da embaixada norte-americana em Moscovo, Bart Gorman, como retaliação por uma decisão idêntica por parte das autoridades dos EUA, segundo o Kremlin.

O Kremlin fez chegar aos EUA a sua reação às propostas norte-americanas sobre a segurança europeia, acusando a Casa Branca de não ter dado “respostas construtivas” às preocupações manifestadas pela Rússia.

Moscovo quer garantias vinculativas de que a NATO não vai aceitar a adesão da Ucrânia e da Geórgia, e de que os militares norte-americanos na Europa de Leste sejam retirados – exigências rejeitadas por Washington e pelos seus aliados.

Perante a posição norte-americana, a Rússia diz estar preparada para adotar “medidas de natureza técnico-militares“, um termo já utilizado por Putin, mas que o Governo russo não especificou.

ZAP //

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4 Comments

  1. Parece que a maior parte das pessoas que vivem nos territórios ucranianos já ocupados pelos russos, dizem que querem ser independentes da Ucrânia. O ocidente vai comprar uma guerra coma Rússia, se afinal a maior parte do povo daquela zona quer ser independente da Ucrânia.

    • A Rússia invade países soberanos por razões falsas (como cabalmente demonstrado em vários estudos científicos, veja por exemplo alguns estudos do Sinan Aral publicados na Science e na Nature), e os outros é que querem comprar guerras? E também acha que os referendos do Putin sem qualquer monitorização externa, tal como o organizado na Crimeia a seguir à invasão, são fiáveis? A si pergunto-lhe o seguinte: é tolo ou é apenas mais uma peça na máquina de propaganda russa? Obrigado.

      • Eu já falei com pessoas que vieram daquela zona e elas disseram que os EUA é que querem provocar a guerra. por isso, por aqueles lados eles tem uma opinião bem diferente da do ocidente. Quanto ao resto,as pessoas que vivem nos territórios ucranianos ocupados pelos separatistas dizem que não querem ser ucranianas o mesmo acontece na crimeia, quem lá vive diz que não quer ser ucraniano, prefere fazer parte da rússia, Isto foi mencionado pelos jornalistas ocidentais que entrevistaram as pessoas dessas zonas. neste caso são as próprias pessoas dos territórios ocupados que querem fazer parte da Rússia.

        • Pois, mas como o mundo pode constatar, e ao contrário das “pessoas com quem falou”, a população Ucraniana não deu propriamente as boas vindas aos Russos. A incrível resistência dos Ucranianos à invasão fala por si. E mesmo que a maioria da população dessas zonas quisesse ser Russa (algo que factualmente e comprovadamente não é verdadeiro), não é com uma invasão que isso se resolve.

          O que é sabido é que o Kremlin emprega muitas pessoas para colocar desinformação neste tipo de fóruns.

          Cumprimentos.

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