A praia em Katoku, no Japão, é parte do Património Mundial da UNESCO. A construção de um paredão está a dividir a população local.
Nesta praia cercada por montanhas em Katoku, no Japão, quase não há sinais de presença humana. São poucas as casas que se escondem entre a vegetação, deixando a praia intocada pela civilização.
Em julho deste ano, a praia passou a fazer parte do Património Mundial daUNESCO, já que é a casa de quase uma dúzia de espécies em vias de extinção.
Dois meses depois, a praia estava cheia de retroescavadoras prontas a retirar uma grande parte da duna de Katoku e enterrar dentro dela uma enorme parede de cimento destinada a conter a erosão.
Segundo o The New York Times, o projeto do paredão demonstra como nem mesmo os mais preciosos tesouros ecológicos conseguem sobreviver à obsessão de construção do Japão. Esta tem sido uma resposta comum à ameaça de desastres naturais — e uma fonte vital de estímulo económico e capital político.
Os apoiantes do projeto — a maioria dos seus 20 residentes — dizem que a sobrevivência da vila está em jogo, uma vez que foi atingida por fortes tempestades nos últimos anos. Os opositores, por sua vez, argumentam que um paredão destruiria a praia e o seu ecossistema.
Jean-Marc Takaki, imigrante francês de 48 anos, começou a fazer campanha contra o paredão em 2015, depois de se mudar para uma cidade próxima para ficar mais perto da natureza. Quando visitou Katoku pelo primeira vez, em 2010, Takaki diz que nunca tinha visto um sítio assim.
“Se eles terminarem de construir isto, não sei o que vamos fazer aqui”, disse Takaki ao jornal norte-americano.
Katoku não é um caso único. Ao longo de cada centímetro habitável da costa japonesa, há estruturas de cimento semelhantes à desta praia. Foi esta a solução encontrada para preparar o país para um evento semelhante ao terramoto e tsunami de 2011.
“Em que medida é que o cimento está lá por causa das coisas que precisam de ser protegidas e até que ponto isso faz parte da cultura japonesa?”, pergunta Jeremy Bricker, professor da Universidade de Michigan, especializado em engenharia costeira.
Em alguns casos, o cimento pode ser substituído por amortecedores naturais, como areia ou vegetação, explicou Bricker.
“O Japão está tão focado em promover o trabalho para empreiteiros tradicionais — isto significa usar cimento — que não houve tanto ênfase em soluções flexíveis”, acrescentou.
Em Katoku, durante décadas, os habitantes locais recusaram as ofertas do governo para blindar a costa com cimento. No entanto, em 2014, dois tufões varreram a praia e arrancaram as árvores que protegiam a aldeia — abalando a confiança dos residentes locais na capacidade de proteção da baía.
O governo local recomendou uma parede de cimento de mais de 500 metros de comprimento para impedir que o oceano devorasse a praia. Devido à contestação de alguns habitantes, concordou-se em diminuir o tamanho para metade.
Tomohiko Wada é um dos vários advogados que estão a processar para impedir a construção: “Os moradores queriam fazer algo, e o governo local disse ‘cimento’, porque é isso que o Japão faz”.