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Resolvido parte do mistério dos “navios fantasma” que se teletransportam

SkyTruth/Global Fishing Watch/Orbcomm/Spire

Circle spoofing

Investigadores começam a desvendar parte do mistério dos navios que se “teletransportam” milhares de quilómetros na sua geolocalização.

Em 2019, o barco nigeriano “Princesa Janice” fez uma viagem impossível. Em vez de fazer a sua típica rota de e para plataformas petrolíferas no Golfo da Guiné, foi misteriosamente transportado milhares de quilómetros até à costa da Califórnia.

Passado um tempo, as imagens de GPS mostravam a embarcação a avançar para terra e a atravessar montanhas e desertos até ao estado do Utah.

Este é apenas um das dezenas de “navios fantasma” que circulam ao largo da Califórnia, nos Estados Unidos. Sem que se soubesse como nem porquê, os barcos mexiam-se em movimentos elípticos, a uma velocidade exata de 20 nós, escreve o Big Think.

Se todo este panorama parecer impossível de acreditar, é porque é mesmo. Na realidade, não era a embarcação que se “teletransportava” milhares de quilómetros, mas sim a sua posição virtual comunicada pelo Automatic Identification System (AIS), um sistema de monitorização de curto alcance utilizado em navios com base em GPS.

A Califórnia não era o único destino destes navios, sendo que alguns iam parar a Madrid ou a Hong Kong, por exemplo. No entanto, foi este incidente específico na costa ocidental norte-americana que o investigador Bjorn Bergman tomou como base para o seu estudo de um fenómeno conhecido como “circle spoofing”.

Problemas deste género com GPS não são novos. Aliás, a Rússia tem uma equipa militar própria que bloqueia os sinais de GPS sempre que Vladimir Putin aparece em público.

O Irão, por sua vez, alega ter usado um tipo de “GPS spoofing” para enganar um drone operado pela CIA no Afeganistão para pousar num aeródromo iraniano. A captura ajudou o Irão a clonar o seu próprio drone em apenas um ano.

Enquanto no “GPS spoofing” a localização é adulterada para um local específico, no “circle spoofing” a posição é dinâmica, tendo um padrão circular.

Em 2019, ao chegar ao porto de Shangai, o transponder AIS e unidades GPS do navio porta-contentores norte-americano MV Manukai falharam. O incidente foi denunciado e analistas descobriram uma epidemia de ataques spoofing na zona, tendo sido registado o mesmo problema com outras 300 embarcações nesse dia.

Explicar a razão para este fenómeno sempre pareceu algo distante para os cientistas. Contudo, o Centro de Estudos Avançados de Defesa (C4ADS, na sigla em inglês) encontrou uma maneira engenhosa de descartar a possibilidade de o AIS dos navios ser o culpado pela localização fictícia.

Os investigadores analisaram dados de localização anónimos fornecidos pela aplicação de fitness Strava, usada por 10 milhões de ciclistas de Shangai e verificaram que também os ciclistas estavam aparentemente a andar em círculos, quando se aproximavam do mar.

Isto provou que os ataques de spoofing visavam todos os dispositivos GPS e não apenas os AIS dos navios.

Relatos de “circle spoofing” perto de vários terminais de petróleo na China sugerem que pode ser uma forma de defender essas instalações de ataques. Outra teoria sugere que pode ser um sinal de que o “GPS spoofing”, anteriormente caro e complexo, foi agora “comoditizado”, podendo ser usado por dispositivos relativamente mais simples.

Enquanto parte do mistério foi resolvido, o resto permanece uma incógnita.

Daniel Costa, ZAP //

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