O governador do Banco de Portugal (BdP), Mário Centeno, avisou que as famílias devem ser responsáveis relativamente ao consumo e às poupanças, de forma a não colocar em causa o esforço dos últimos anos no corte do endividamento.
“Às famílias requer-se uma atitude de responsabilidade nas decisões de consumo e poupança, muitas vezes com recurso ao crédito. No momento em que vivemos, o crédito assume maior importância, mas, pela natureza creditícia, traz maior risco”, afirmou Centeno, durante uma audição da comissão parlamentar de Orçamento e Finanças, convocada no âmbito do plano de atividades do Banco de Portugal, citado pelo Expresso.
Às empresas, “requer-se uma posição robusta” e “as melhores decisões de investimentos”, enquanto o Estado tem que ter “capacidade financeira para substituir-se aos restantes agentes económicos”, indicou o governador do BdP esta terça-feira.
Quanto às moratórias nos créditos, considerou que estas são essenciais e que os bancos têm de fazer um esforço de preservação de capital, que “deverá ser acompanhado por medidas para ultrapassar a crise”. “Em conjunto com outras instituições, será necessário criar políticas que evitem paragens abruptas. O contributo de todos é essencial”, alertou.
Centeno frisou que as moratórias deverão ser “avaliadas” nos próximos meses, sendo, “neste momento, uma importantíssima forma de liquidez em crise muitas agudas”, que “se devem manter ativas, mas devem ir evoluindo e adaptando à crise”. Reconheceu, ainda, que o volume de moratórias no crédito em Portugal é “muito maior do que a média do conjunto da área do euro e da média da União Europeia [UE]”.
“Tenho a certeza que todos os que beneficiam de moratórias têm consciência de que não se trata de um perdão de dívida”, referiu o Governador, assinalando um aumento significativo de depósitos das famílias no total de moratórias, que atingiu os 20%. “Estamos a falar de um adiamento de pagamentos e devemos entender a necessidade de assim que possível retomar este processo” de pagamentos, salientou.
Em setembro, havia empréstimos de 46 mil milhões de euros sob moratórias de crédito (24,4 mil milhões de crédito a famílias, 21,6 mil milhões de crédito a empresas). O fim da moratória legal está previsto para o final de setembro.
Para Centeno, “o país deve permanecer focado na resposta à crise”, sendo necessário manter as políticas de apoio à economia. A atual crise não é “estrutural” nem de “sobreendividamento”, requendo “a manutenção e a adaptação das políticas económicas até ao seu final”, sublinhou, citado pelo Diário de Notícias.
Centeno avisa NB sobre bónus a gestores em 2020
Relativamente à atribuição de bónus do Novo Banco aos gestores, Centeno apontou o impacto negativo da decisão e considerou que não deverá repetir-se em 2020. “Não vemos como [uma decisão] adequada em 2020”, esclareceu. Ainda assim, defendeu que o quadro legal e a atividade dos bancos devem ser respeitados, noticiou o Público.
O governador do BdP avançou igualmente que impacto no défice na venda do Novo Banco era claro desde o início, uma vez que as injeções do Fundo de Resolução teriam efeito nas contas públicas. “Foi sempre referido que o risco latente no balanço do Novo Banco estava lá no momento da venda”, apontou.
“Foi por isso que foram criados os mecanismos e os instrumentos de monitorização acrescidos desses ativos e da forma como evoluem ao longo do tempo”, reiterou. Sobre os efeitos da venda nos contribuintes, respondeu que “é o sistema bancário que financia o Fundo de Resolução e que responde pelas perdas do Fundo de Resolução”.
“Não quero mistificar nem desmistificar os impactos. Eles existem, são coletivos. Quando um banco da dimensão do BES sofre as perdas que o BES sofreu, os impactos não se circunscrevem nem à instituição, nem infelizmente aos seus acionistas, nem a quem tomou as decisões que levam a estes resultados”, declarou.
Sobre o processo dos lesados do BES houve “um quadro legislativo criado na última legislatura” que dava “um papel muito claro à CMVM e ao Banco de Portugal”. “Há um processo de liquidação do BES onde aqueles que têm direitos podem ou não ver satisfeitas as suas pretensões”. “Todos devem cumprir os seus contratos, as suas responsabilidades”, o oposto “seria dramático”, notou.
No que toca ao pedido do relatório de análise ao comportamento do BdP na sequência da resolução do BES, espera que o processo que decorre no Tribunal da Relação sobre o sigilo “possa ser, com sucesso, resolvido proximamente”.
Respondendo a uma questão sobre a pressão dos contabilistas para apresentarem contas falsas e uma eventual resposta que o BdP para este problema, Centeno assinalou as “inúmeras reclamações” sobre a prática bancária, acrescentando que os contabilistas têm “não devem fazer proclamações públicas, mas fazer chegar essas provas ao supervisor”.