A Comissão Europeia ameaçou esta quinta-feira o Reino Unido com uma ação legal para contestar o projeto de lei britânico que viola o Acordo de Saída da União Europeia (UE) e afeta as relações futuras de Bruxelas e Londres.
Depois de o governo britânico ter admitido que a nova proposta de lei para retificar parte do acordo de saída do Reino Unido da UE pode representar uma violação do direito internacional, o vice-presidente da Comissão Europeia responsável pelas Relações Interinstitucionais, Maros Sefcovic, foi esta quarta-feira a Londres manifestar as “graves preocupações” comunitárias numa reunião extraordinária do Comité Misto UE-Reino Unido.
No final do encontro, o executivo comunitário avisou em comunicado que Maros Sefcovic “recordou ao governo britânico que o Acordo de Saída contém uma série de mecanismos e recursos legais para resolver violações das obrigações legais contidas no texto, que a União Europeia não se acanhará de utilizar”.
“O vice-presidente declarou, de forma inequívoca, que a implementação atempada e integral do Acordo de Saída, incluindo o protocolo sobre a Irlanda e Irlanda do Norte é uma obrigação legal. A UE espera que o compromisso e o espírito deste acordo sejam plenamente respeitados”, acrescenta a instituição na nota de imprensa.
E alerta: “A violação dos termos do Acordo de Saída violaria o direito internacional, minaria a confiança e poria em risco as futuras negociações em curso sobre as relações”.
Segundo Bruxelas, se o projeto de lei for aprovado, verifica-se, de facto, uma “clara violação” do direito internacional, desde logo no que toca à legislação aduaneira e aos auxílios estatais.
Por essa razão, Maros Sefcovic “apelou ao governo britânico para retirar estas medidas do projeto de lei no mais curto espaço de tempo possível e, no máximo, até ao final do mês”, adianta o executivo comunitário.
Porém, o Governo britânico reiterou esta quinta-feira a intenção de manter a proposta de lei que invalida certas cláusulas do acordo para o Brexit, rejeitando o ultimato de Bruxelas que pede um recuo até final do mês.
“Expliquei ao vice-presidente Sefcovic que não poderíamos e não o faríamos e, em vez disso, enfatizei a importância vital de chegar a um acordo através do Comité Misto sobre estas questões importantes. Eu deixei perfeitamente claro que não retiraríamos a legislação”, disse, em declarações transmitidas na estação Sky News.
Sefcovic foi a Londres para se reunir de emergência com o ministro do Conselho de Ministros britânico, Michael Gove, sobre a polémica proposta de lei, apresentada na quarta-feira no parlamento londrino, que visa modificar as disposições acordadas com Bruxelas sobre a fronteira entre as duas Irlandas.
Tanto Sefcovic quanto Gove fazem parte da chamada Comissão Mista UE- Reino Unido, que supervisiona a implementação do acordo, alcançado no ano passado, antes de o país deixar o bloco europeu a 31 de janeiro.
A proposta de lei sobre o mercado interno britânico destina-se a regular o comércio interno do Reino Unido se não houver um acordo de comércio entre Londres e Bruxelas quando o atual período de transição terminar a 31 de dezembro.
A lei, se for aprovada pelo parlamento, dá ao governo britânico o poder de “modificar ou cessar a aplicação” de certas regras relativas à circulação de mercadorias contidas no protocolo sobre a Irlanda do Norte, violando o direito internacional.
O protocolo para a Irlanda do Norte, que só se aplicaria se não houvesse acordo no final do período de transição, pretende evitar uma fronteira física com a Irlanda, membro da UE, a fim de não prejudicar o processo de paz na Irlanda do Norte.
Assim, contempla que a região britânica permaneça no mercado único europeu de mercadorias em conjunto com a Irlanda, o que implica a criação de um sistema de controlo aduaneiro com o resto do Reino Unido, um dos aspetos fundamentais que o governo Johnson deseja alterar.
Esta quinta-feira terminou em Londres a oitava ronda de negociações para um acordo de comércio pós-Brexit, conduzidas, pelo lado europeu, pelo negociador-chefe da UE para o processo, Michel Barnier, e, pelo lado britânico, por David Frost.
ZAP // Lusa