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Venezuela: “Coloco o lixo na rua e em 20 minutos alguém passa e come esse lixo”

Jeffrey Arguedas / EPA

Uma luso-venezuelana relatou à Lusa que a crise no país é tanta que o lixo que coloca na rua ao final do dia é devorado em minutos.

A luso-venezuelana e integrante do conselho das comunidades portuguesas Fátima Pontes Loreto relatou à Lusa que a crise no país é tanta que o lixo que coloca na rua ao final do dia é devorado em minutos. Filha de madeirenses que cedo emigraram para a Venezuela, Fátima garante que viveu uma infância e juventude felizes e que nunca imaginou vivenciar as situações que hoje tanto a impressionam.

A Venezuela está muito pobre, há muita fome. Na minha casa, eu coloco o lixo lá fora e em 20 minutos passa gente e vemo-los a comer esse lixo. Isto nunca se havia visto na Venezuela. Existiram casos semelhantes há muito tempo atrás, mas eram questões de malandragem, mas agora é fome”, contou.

Fátima Pontes Loreto é professora universitária e, por isso, reconhece que a sua situação pessoal está ainda um pouco distante da restante população venezuelana, afirmando que é recorrentemente acusada de não compreender o que se passa no país.

“Eu vivo numa urbanização, na cidade de Valência, e os meninos passam e batem à minha porta e gritam: “milionária! vocês são ricos, não entendem. Por isso é que Nicolás Maduro vos tem de tirar daqui”. Mas isso não é assim. Esse é o doutrinamento do senhor Hugo Chávez e mantém-se porque trata-se de um populismo barato“, lamentou Fátima Loreto.

Sendo uma das integrantes do conselho das comunidades portuguesas na Venezuela, um órgão consultivo do Estado português, esta lusodescendente procura ao máximo ajudar a comunidade lusitana que reside naquele país, garantindo, no entanto, que é uma das mais afetadas em todo este momento de crise.

“A nossa comunidade é uma das mais afetadas na Venezuela. Eu acabo de ter um caso importante de um português, fora da minha região que estava num hospital como um indigente. O senhor teve um AVC, e o filho, aproveitando-se da situação do pai, vendeu todas as suas propriedades, pois ele era um grande construtor civil. O filho vendeu tudo e deixou o pai na rua, a viver numa área de serviço”, contou Fátima, relatando de forma emocionada que o senhor acabaria por morrer, dias depois de ter sido resgatado das ruas.

Outros dos aspetos que a lusodescendente refere como marcante na atualidade daquele país é o aumento da criminalidade, informando que o consulado de Portugal em Caracas foi assaltado na semana passada.

“Os assaltos são típicos. É algo já natural e, lamentavelmente, pelas seis horas da tarde já temos de estar dentro das casas. À parte de que não há luz, o que faz aumentar a insegurança. Assaltaram também o consulado de Portugal em Caracas e roubaram os telemóveis, dinheiro, tudo. É uma tristeza aquilo que estamos a passar”, admite.

Como professora, Fátima afirma que a classe docente tem sofrido pressões por parte de Maduro, para que o reconheçam publicamente como Presidente, ameaçando com cortes nos salários. Mas a lusodescendente declarou à Lusa que não cede a pressões, e que o seu apoio pertence a Juan Guaidó, o autoproclamado Presidente interino da Venezuela.

Na Venezuela residem cerca de 300.000 portugueses ou lusodescendentes. Os mais recentes dados das Nações Unidas estimam que o número atual de refugiados e migrantes da Venezuela em todo o mundo situa-se nos 3,4 milhões.

Só no ano passado, em média, cerca de 5.000 pessoas terão deixado diariamente a Venezuela para procurar proteção ou melhores condições de vida.

ZAP // Lusa

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