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Indiano tirou mais de cinco mil toneladas de lixo de uma praia em Bombaim

UNEP / Flickr

O Patrono dos Oceanos da ONU, Lewis Pugh, juntou-se ao Afroz Shah e aos Voluntários Residentes Versova (VRV) em Bombaim, na Índia, para a maior limpeza de praia da história

O indiano Afroz Shah foi o responsável pela “maior ação de limpeza de praia do mundo”, que decorreu em Bombaim, na Índia. Ao mudar-se para um apartamento em frente à praia de Versova, deparou-se com uma extensão de areia com mais de 2,5 quilómetros coberta lixo, o que o levou a agir a e a retirar da mesma mais de cinco mil toneladas de detritos.

De acordo com uma reportagem do P3, divulgada na sexta-feira, foi em 2015 que o advogado Afroz Shah, de 36 anos, mudou-se para perto de Versova. A praia, nessa altura, continha “mais plástico do que aquele que conseguimos imaginar: uma parede com 1,7 metros de altura de resíduos despejados na areia ou que lá chegaram vindos do mar, também altamente poluído”.

Sem conseguir aguentar o que via, decidiu, sozinho, começar a apanhar o lixo, tendo no primeiro dia enchido cinco sacos. No entanto, rapidamente percebeu que a tarefa o superava. Foi nessa altura que surgiu aquela que a Organização das Nações Unidas (ONU) apelidou de “maior ação de limpeza de praia do mundo”.

Foi esta iniciativa que trouxe o advogado indiano ao Porto, para falar no Climate Change Leadership, que teve lugar no Centro de Congressos da Alfândega entre 05 e 07 de Março e que contou com a presença do antigo vice-presidente dos Estados Unidos Al Gore, ativista do combate às alterações climáticas e “político em recuperação”.

“Chamo a esta minha jornada ‘Date with the Ocean’ [‘Encontro com o Oceano’, em tradução livre]. Imagina que estás num encontro com a companhia certa e não queres que termine. É exatamente assim que me sinto”, contou ao P3. “E acho que encontrei o parceiro certo”, sublinhou Afroz Shah, referindo-se ao oceano.

Durante quase três anos, teve encontros semanais, todos os sábados e domingos, na praia de Versova. A partir de outubro de 2015, ao contrário do que aconteceu das primeiras vezes, começou a contar com a ajuda de dezenas de voluntários, que passaram a centenas e a milhares. Formou-se um movimento, embora “sempre informal”.

Através desta iniciativa, mais de cinco mil toneladas de lixo foram retiradas da praia por estudantes, moradores, políticos e estrelas de Bollywood. Pela primeira vez em 20 anos, escreveu o Guardian em 2018, tartarugas marinhas escolheram Versova para nidificar.

Segundo o P3, Afroz Shah concilia tudo com o trabalho de segunda a sexta, num escritório de advocacia. Aos fins de semana, a sua casa é o centro de comandos das operações dos voluntários, aos quais se junta sempre que pode.

“Eu era uma pessoa muito privada, mas a pressão pública está a crescer de forma orgânica”, indicou. Comprometeu-se a entregar o tempo livre a uma causa, a “liderar pelo exemplo”. No Facebook e no Twitter partilha os objetivos que vai alcançando.

Mas confessa-se cansado e a ponderar cortar nas horas dedicadas ao Direito. “O que faço agora é criar milhares de Afroz em cada cidade, para que o trabalho se torne mais simples. Aos jovens, digo: ‘Assume o teu lugar'”, contou.

https://twitter.com/AfrozShah1/status/1105047150876999680

O advogado assumiu o seu lugar e as Nações Unidas reconheceram-no: em dezembro de 2016, recebeu da organização a distinção “Champion of the Earth” por ter liderado a limpeza da praia de Versova. “Senti-me confuso: recebi um prémio por apanhar lixo”, recordou, ainda incrédulo.

“O meu país tem 1,5 mil milhões de pessoas. Já imaginaram se todas pegassem num saco e apanhassem plástico?”, acrescentou o indiano, que, desde que dedicou o primeiro fim de semana a Versova, já contou com a participação de 200 mil voluntários.

“Consistência, persistência e sinceridade” é aquilo que tenta incutir nos voluntários, sobretudo nas crianças e nos adolescentes. “Não basta dizer que vão limpar a praia hoje ou amanhã. É preciso fazê-lo sempre”.

Os jovens, acredita, não são apenas “os líderes do futuro”. São líderes “agora”, têm voz. “Vejam o exemplo de Greta Thunberg”, apontou.

A jovem sueca de 16 anos tem sido notícia desde dezembro de 2018, quando começou um movimento de greve às aulas pelo clima. O ponto alto será uma greve global, marcada para 15 de março — e os estudantes portugueses também estão envolvidos.

@GretaThunberg / Twitter

Greta Thunberg, a ativista sueca de 16 anos que deu origem ao movimento “School Strike 4 Climate” (“Greve à escola pelo clima”)

Durante a sua apresentação no Climate Change Leadership, Afroz Shah lançou uma provocação: “A escola diz-nos para sermos bem-sucedidos. Mas o que é ser bem-sucedido? É só termos dinheiro?” Faz falta uma “consciência ambiental” — que vai além do dinheiro, indicou na altura.

Para o próprio, é uma questão de escolhas, não de alternativas. “Querem fazer algo? Cortem no consumo de carne, recusem produtos com plástico descartável, digam não às palhinhas”, enumerou, admitindo esforçar-se por “não soar paternalista”.

Na Índia, lê-se no P3, a jornada pessoal do advogado chegou a 70 mil estudantes voluntários. De uma praia passou para o Rio Mithi, também em Bombaim, onde vivem dois milhões de pessoas. Numa extensão de 17 quilómetros ao longo do curso de água, os resíduos sólidos de plástico que acabam no mar e nas praias “são o mais preocupante”.

“Incentivar uma economia circular e criar um “sentimento de pertença” pode ser o caminho para limpar aquele curso de água — e para tentar impedir que os valores de plástico nos oceanos continuem a aumentar”, refere a reportagem.

Anualmente, estima-se que 13 milhões de toneladas cheguem aos oceanos, onde 80% do lixo é plástico, com os últimos dados a apontarem para a existência de 150 milhões de toneladas de plástico acumulado. Se as taxas de poluição atuais se mantiverem inalteradas, em 2050 haverá mais plástico do que peixes no mar.

Afroz Shah tem vindo a contar a sua história e mostrar imagens do antes e depois de semanas de limpeza. Admite, contudo, que o resultado deste tipo de ações é limitado.

“Posso falar para [uma audiência de] duas mil pessoas bem intencionadas e com conhecimento suficiente para perceberem o mal que o plástico faz aos oceanos. Mas é preciso agir no terreno, na prática”, reforçou.

Devido a isso, continua o P3, sempre que é convidado para eventos de cariz ambiental, organiza ações voluntárias em praias ou zonas poluídas. A última foi nas praias de Vila Nova de Gaia, na véspera da Cimeira Climática na Alfândega do Porto, onde a presença de microplásticos no areal e na água “afigura-se como um problema mais preocupante do que noutros locais, como na Índia, onde os resíduos são de maior dimensão”.

Nos últimos quatro anos, enquanto ativista, garante que nunca abordou um político ou membro do governo indiano para se queixar: foram os executivos municipais que decidiram apoiá-lo depois de terem tido conhecimento das limpezas de praias.

Questionado pelo P3 sobre onde termina a responsabilidade dos cidadãos e começa a dos governos, respondeu que são “coexistentes”. “Quem são os mais poluentes? Todos, sem exceção, lidam mal com os resíduos”, afirmou.

TP, ZAP //

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