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O nosso intestino produz eletricidade

Amy Cao graphic / UC Berkeley

Esqueça as borboletas no estômago. Neste momento, nas profundezas do seu intestino, há milhares de bactérias a produzir eletricidade.

Uma equipa de investigadores da Universidade da Califórnia, em Berkeley, nos Estados Unidos, publicarou recentemente um estudo na revista Nature no qual revelam a existência de bactérias eletrogéneas que vivem na nossa flora intestinal.

Este tipo de bactérias produzem eletricidade e estão normalmente associadas a ambientes de extrema falta de oxigénio, como o fundo de lagos por exemplo.

No entanto, a grande novidade desta investigação foi encontrar estas bactérias no corpo humano. Dan Portnoy, professor de biologia celular, ficou muito surpreendido pelo facto de nunca termos percebido que tantas bactérias, próximas de nós, produzem eletricidade.

Em laboratório, Portnoy e a sua equipa criaram uma cultura Listeria monocytogenes, uma espécie de bactéria que ingerimos frequentemente e, por vezes, causa uma infeção chamada listeriose. Este tipo de intoxicação alimentar é tipicamente mais perigosa para aqueles com sistemas imunológicos enfraquecidos, grávidas, crianças e idosos.

Durante a investigação, a equipa colocou as bactérias numa câmara eletroquímica e capturou os eletrões com um elétrodo. Neste processo, os cientistas perceberam que as bactérias criavam uma corrente elétrica.

Existem várias razões pelas quais algumas bactérias geram eletricidade, como a remoção de eletrões produzidos pelo metabolismo. Mas o objetivo principal é criar energia, explicou Portnoy.

Ainda assim, a Listeria monocytogenes tem outras formas de produzir energia, como através do uso de oxigénio. Este processo é “provavelmente um sistema de backup que usam sob certas condições”, como, por exemplo, em condições de baixo oxigénio do intestino, esclareceu Sam Light, autor principal do artigo.

Para identificar quais os genes necessários para que as bactérias produzam eletricidade, os cientistas examinaram as bactérias mutantes, ou seja, aquelas com genes ausentes ou alterados, e descobriram que o sistema que essas bactérias usavam era muito mais simples do que os sistemas que outras bactérias eletrogéneas usam.

As bactérias recentemente estudadas são gram-positivas, o que significa que as suas paredes celulares possuem apenas uma camada. Isto significa que “há menos um obstáculo” para os eletrões alcançarem o exterior da bactéria, explica o cientista ao Live Science.

Mas o mistério permanece no ar, uma vez que os cientistas não sabem o que acontece quando os eletrões chegam ao exterior. Tipicamente, as bactérias eletrogéneas transferem os eletrões para minerais. Nas experiências realizadas pela equipa, os eletrões fluíram para o elétrodo. Os cientistas desconfiam que, no intestino, várias moléculas diferentes (como o ferro, por exemplo) poderiam ligar-se e aceitar esses eletrões.

Além disso, os cientistas descobriram também que as bactérias precisavam de proteínas flavinas para sobreviver. A flavina, uma variante da vitamina B2, preenche densamente o intestino. Além disso, a flavina extra flutuante do ambiente circundante poderia aumentar a atividade elétrica das bactérias.

Este estudo vem abrir portas e criar oportunidades para projetos com base em tecnologias geradoras de energia. Já existem esforços para criar células de combustível microbianas, ou baterias que usem bactérias para gerar eletricidade, como em usinas de tratamento de resíduos. Ainda assim, serão precisos estudos mais aprofundados, disse Light.

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