O general angolano Bento dos Santos “Kangamba” anunciou, esta sexta-feira, pretender processar Portugal e Brasil, após as recentes decisões favoráveis dos tribunais nos processos em que é visado, dizendo-se vítima de vários anos de “humilhação pública”.
Em entrevista à agência Lusa, o general angolano Bento dos Santos “Kangamba” diz ter sido humilhado. “Afetou a minha imagem, afetou a imagem da minha família, enfim, a do próprio povo angolano”, afirmou.
O general foi absolvido este mês por um tribunal brasileiro no processo que corria desde 2012, sobre o alegado envolvimento no tráfico internacional de mulheres para prostituição, com o juiz a criticar a atuação do Ministério Público Federal pela falta de provas.
Na entrevista, garantiu já ter dado instruções aos advogados, em Portugal e no Brasil, para avançarem com processos e “indemnizações sérias e com justa causa”. Além disso, criticou a má administração da Justiça de que diz ter sido alvo nos últimos anos, ao ver o seu nome associado a estes processos mediáticos.
O processo no Brasil, em que genericamente estava acusado de crimes de formação de quadrilha, tráfico internacional de seres humanos e crimes contra o património, chegou a causar mal-estar nas relações entre os dois países, ao envolver aquele general, influente dirigente do MPLA e sobrinho do ex-presidente angolano, José Eduardo dos Santos.
Bento dos Santos “Kangamba” chegou a ter um mandado internacional de captura pendente, a pedido da Justiça brasileira, que pedia a sua prisão preventiva, que não chegou a acontecer.
O processo no Brasil foi posteriormente citado numa investigação pela Justiça portuguesa por alegado branqueamento de capitais, iniciada em 2013 pelo DCIAP (Departamento Central de Investigação e Ação Penal).
“Foram seis anos difíceis, continuam a ser difíceis. O processo do Brasil é que deu origem à caça ao homem, ao Bento ‘Kangamba'”, afirma o general angolano, que acusa a investigação em Portugal de recorrer a “notícias na Internet” sobre o processo brasileiro, para tentar promover a acusação.
No entanto, também neste processo, sucedem-se várias decisões favoráveis ao general angolano. A última das quais, em novembro, com o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) a dar provimento ao recurso apresentado pela defesa empresário angolano, pedindo o arquivamento do inquérito ainda pendente.
O TRL reconheceu ainda a “violação” das competências dos tribunais portugueses neste processo. “A verdade veio ao de cima. Sempre disse confiar na Justiça, no Brasil e em Portugal. Mas foi uma falta de respeito, uma humilhação e um insulto”, enfatizou.
Garante que nos processos nos dois países, através dos seus advogados de defesa, provou “aos tribunais” que a sua “fortuna”, parte da qual continua “presa” em Portugal, resulta da sua atividade como empresário na área dos diamantes.
“Nunca trabalhei no Governo, nunca dependi do Orçamento do Estado, nunca fui ministro. Se há uma pessoa que não se aproveitou do presidente José Eduardo dos Santos fui eu”, disse.
No caso do processo em Portugal, admite que “tem sido feita Justiça”, com as sucessivas decisões favoráveis, mas critica o juiz Carlos Alexandre, por “fazer Justiça à sua maneira”, por nunca ter sido ouvido pelo Ministério Público.
“A única vitima no caso, é o contribuinte brasileiro”
Em causa, está uma investigação iniciada em Portugal por suspeitas de corrupção passiva na forma agravada, corrupção ativa na forma agravada, branqueamento e falsidade informática, segundo informou em 2014 a PGR, levando à “apreensão preventiva” das contas bancárias e propriedades em Portugal do general.
As sucessivas decisões tornadas públicas pela defesa de “Kangamba” assumiram que o Ministério Público não tinha competência para abrir inquérito “por factos praticados por um cidadão nacional de outro país, nesse mesmo país“, pelas dúvidas na origem da fortuna do general angolano.
No processo do Brasil entre os acusados, o Ministério Público Federal brasileiro apontava o general angolano “Kangamba” como principal financiador da alegada rede criminosa.
A acusação defendia que a alegada rede operava entre o Brasil, Angola, África do Sul e Portugal no tráfico internacional de mulheres, que levavam as vítimas a prostituírem-se em troca de pagamentos entre 10.000 dólares e 100.000 dólares (8.200 a 82.000 euros).
Contudo, na decisão de 12 de janeiro de 2018, o juiz Marcio Assad Guardia refere que o Ministério Público Federal apresentou poucos testemunhos sobre alegadas vítimas, que negaram os factos da acusação, assumindo ainda que as mulheres brasileiras, escolheram livremente manter relações sexuais em troca de pagamentos por viagem.
“A única vitima no caso, é o contribuinte brasileiro, que arcou com os custos de uma persecução penal vazia e inútil, despendendo recursos financeiros e provocando desperdício de tempo e trabalho do poder Judiciário”, apontou ainda o juiz do processo, na sua sentença, de primeira estância, passível de recurso para o Tribunal Regional Federal.
// Lusa