Zelenskyy citou Shakespeare, Churchill e contou os 13 dias de “terror” na Ucrânia, no parlamento britânico

(h) Ukrainian Presidential Press Service

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskyy

Foi a primeira vez que um líder estrangeiro falou na Câmara dos Comuns: “Não vamos desistir e não vamos perder. Vamos continuar a lutar até ao fim”, afirmou o Presidente ucraniano.

O Presidente da Ucrânia discursou esta terça-feira na Câmara dos Comuns do Reino Unido. Volodymyr Zelenskyy pediu o endurecimento das sanções contra a Rússia e repetiu o apelo para a criação de uma zona de exclusão aérea nos céus da Ucrânia.

“Não vamos desistir e não vamos perder. Vamos continuar a lutar até ao fim no mar, no ar. Vamos continuar a lutar pelo nosso país qualquer que seja o custo. Vamos lutar nas florestas, nos campos, na costa, nas ruas”, afirmou Zelensky, repetindo as palavras proferidas pelo ex-primeiro ministro britânico Winston Churchill, num dos discurso mais emblemáticos que fez durante a Segunda Guerra Mundial.

“Ser ou não ser? Durante 15 dias esta pergunta podia ter sido colocada, mas agora posso dar-vos uma resposta definitiva. Definitivamente sim, ser”, continuou usando uma das citações mais famosas de Hamlet, obra de William Shakespeare.

O líder da Ucrânia reiterou ainda o pedido de ajuda aos “países civilizados”. “Estou muito agradecido a si, Boris [Johnson]. Por favor aumente a pressão das sanções contra este país [Rússia] e por favor reconheça-os como um Estado terrorista. Por favor garanta que os céus ucranianos são seguros. Por favor garanta que faz o que precisa de ser feito e que a sua consciência lhe disser”.

Zelenskyy discursou por videochamada e em ucraniano (que foi traduzido em tempo real para os membros do parlamento). Esta foi a primeira vez que um líder estrangeiro interveio na Câmara dos Comuns. Este tipo de discursos ocorrem normalmente em Westminster Hall, segundo o Expresso.

A Ucrânia não queria esta guerra. Somos o país que está a salvar pessoas apesar de ter de lutar um dos maiores exércitos do mundo”, sublinhou o líder ucraniano.

A intervenção foi antecedida e seguida por longas ovações de pé, numa Câmara dos Comuns cheia para a sessão que durou cerca de 15 minutos.

Nas intervenções que se seguiram, os líderes parlamentares de todos os partidos saudaram a coragem de Volodymyr Zelenskyy e do povo da Ucrânia.

Os 13 dias de guerra segundo Zelensky

Zelenskyy abriu o seu discurso a descrever os 13 dias do conflito. “Uma guerra que não começamos, que não queríamos, mas em que temos de travar porque não queremos perder o que temos, o que é nosso, tal como vocês não quiseram perder o vosso país quando os nazis vos atacaram durante a Segunda Guerra Mundial”.

“No dia um, às quatro da manhã, fomos atacados por mísseis cruzeiro. Toda a gente acordou e desde então não temos dormido“, começou.

“No segundo dia, as forças russas exigiram que nós baixássemos as nossas armas, mas nós continuamos a lutar e sentimos a força do nosso povo que se vai opor à ocupação até ao fim”.

“No dia seguinte, a artilharia começou a lutar contra nós”.

“No dia quatro, começamos a manter prisioneiros. Não temos estado a torturá-los. Permanecemos humanos mesmo no quarto dia desta guerra terrível”.

“No dia cinco, o terror contra nós continuou contra crianças e cidades. Os bombardeamentos tinham sido permanentes, incluindo contra hospitais, mas isso não nos vergou”.

“No dia seis, os mísseis russos caíram em Babi Yar, onde os nazis mataram milhares de pessoas durante a Segunda Guerra Mundial. Oitenta anos depois, os russos atacaram-nos pela segunda vez. Até as igrejas estão a ser destruídas pelos bombardeamentos”.

“No dia oito, vimos tanques russos a disparar contra as plantas nucleares. Todos puderam perceber que este ataque é contra toda a gente”.

“No dia nove, foi a conferência da NATO que não teve o resultado que queríamos. Sim, foi isso que sentimos. Sentimos que infelizmente nem sempre as alianças funcionam devidamente e que a zona de exclusão aérea não podia ser instituída”.

“No dia dez, os ucranianos começaram a protestar em massa e a parar as investidas armadas com as próprias mãos”.

“No dia onze, as crianças, percebemos que os ucranianos se tornaram heróis. Cidades inteiras, crianças, adultos”.

“No dia doze, as perdas do exército russo excederam os 10 mil mortos, incluindo um general. Isso deu-nos esperança que haverá algum tipo de responsabilização por essas pessoas em frente a um tribunal”.

“No dia treze, uma criança foi morta na cidade de Mariupol que estava sob ataque. [As forças russas] não permitiam a entrada de comida e água. As pessoas começaram a entrar em pânico. Mais de 50 crianças foram mortas. Estas são as crianças que podiam ter saído, mas estas pessoas tiraram-nas”.

Parlamento britânico reitera sanções contra Rússia

O final do discurso de Zelensky foi recebido com segunda ovação de pé por parte dos deputados britânicos.

Seguiram-se as intervenções dos líderes dos partidos com assento parlamentar. Todos reiteraram o compromisso do Reino Unido com o povo ucraniano, prometendo endurecer sanções, continuar a fornecer armas e a prestar assistência humanitária.

“Numa grande capital europeia, agora no alcance das armas russas, o presidente Volodymyr Zelenskyy permanece firme pela democracia e liberdade“, afirmou Boris Johnson.

“Neste momento, ucranianos normais estão a defender as suas casas e famílias contra um ataque brutal. E pelas suas ações estão a inspirar milhões com a sua coragem e dedicação”, continuou.

“Este é um momento para pormos as nossas diferenças de lado. A Grã-Bretanha e os nossos aliados estão determinados em continuar a pressionar [o regime russo]. E vamos aplicar todos os métodos que conseguirmos – diplomáticos, humanitários e económicos – até que o Vladimir Putin tenha falhado nesta desastrosa investida e a Ucrânia seja novamente livre”, concluiu o primeiro-ministro britânico.

“Ninguém o teria culpado [Zelensky] por fugir. Em vez disso ficou em Kiev, para liderar os ucranianos e lutar. Recordou-nos que a nossa democracia e liberdade são inestimáveis e levou o mundo a agir, quando demasiadas vezes deixamos Putin levar a sua avante”, considerou o líder do Partido Trabalhista Kier Starmer.

“Devemos fazer tudo o que conseguirmos para enviar apoio à Ucrânia e enviar a mensagem mais clara a Putin: que isto vai acabar em derrota para ele, que vai enfrentar a justiça no Tribunal Internacional”, disse Ian Blackford, líder Partido Nacional Escocês.

Já Ed Davey (Liberal Democratas) sublinhou que situação na Ucrânia deve servir de lembrete de que os valores de liberdade, democracia e segurança não devem ser tomados como garantidos. “Embora nesta Câmara discordemos de muitas coisas, aqui defendemos juntos esses valores”.

“A nossa resposta não vai ser julgada pelo volume ou força do nosso aplauso ao Presidente Zelenskyy”, defendeu por fim Jeffrey Donaldson, do Partido Unionista Democrático. “Vai ser julgada pelo volume ou força da nossa resposta ao seu pedido de ajuda”.

O Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse, durante uma entrevista televisiva na segunda-feira, que não vai insistir na adesão da Ucrânia à NATO, uma das questões que motivaram oficialmente a invasão russa.

Num outro sinal de abertura a negociações com Moscovo, durante uma entrevista ao canal televisivo norte-americano ABC, Zelensky disse estar disponível para um “compromisso” sobre o estatuto dos territórios separatistas no leste da Ucrânia, cuja independência o Presidente russo, Vladimir Putin, reconheceu unilateralmente, pouco antes de lançar o ataque militar.

NATO? “Percebi que não estava pronta para aceitar”

“Quanto à NATO, moderei a minha posição sobre esta questão há algum tempo, quando percebi que a NATO não estava pronta para aceitar a Ucrânia“, disse o líder ucraniano numa entrevista transmitida na noite de segunda-feira.

“A Aliança tem medo de tudo o que seja controverso e de um confronto com a Rússia”, explicou Zelenskyy, acrescentando que não quer ser o Presidente de um “país que implora de joelhos” por uma adesão à NATO.

Num outro sinal de abertura a negociações com Moscovo, durante uma entrevista ao canal televisivo norte-americano ABC, Zelenskyy disse estar disponível para um “compromisso” sobre o estatuto dos territórios separatistas no leste da Ucrânia, cuja independência o Presidente russo, Vladimir Putin, reconheceu unilateralmente, pouco antes de lançar o ataque militar.

Por várias vezes, Putin disse que a adesão da Ucrânia à NATO constituía uma ameaça para os interesses de Moscovo, tendo exigido ao Ocidente que não expandisse a sua zona de influência militar junto das suas fronteiras.

O Presidente russo também reconheceu as duas autoproclamadas repúblicas separatistas pró-Rússia no leste da Ucrânia, exigindo agora que Kiev também as reconheça, de acordo com a TSF.

Questionado sobre esta exigência russa, durante a mesma entrevista televisiva, Zelenskyy disse estar aberto ao diálogo.

“Estou a falar de garantias de segurança. Penso que quando se trata destes territórios ocupados temporariamente (…), que só foram reconhecidos pela Rússia, (…) podemos discutir e chegar a um compromisso sobre o futuro destes territórios“, explicou o líder ucraniano.

“O importante para mim é como vão viver as pessoas que estão nestes territórios e que querem fazer parte da Ucrânia”, acrescentou Zelenskyy, considerando que a questão é “complexa”.

“Esse é outro ultimato e nós rejeitamos ultimatos. O que é necessário é que o Presidente Putin comece a falar, inicie um diálogo, em vez de viver numa bolha”.

Alice Carqueja, ZAP //

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