Uma “cola” cerebral permite ficar acordado sem cansaço

GerryShaw / Wikimedia

Antes ignorados, os astrócitos podem ser a chave para ficar acordado até “às tantas”

As maiores células do sistema nervoso central podem ser a chave para um despertar prolongado sem os efeitos menos desejados da perda de sono.

Os astrócitos, células mais abundantes do sistema nervoso central, podem abrir caminho para os seres humanos permanecerem acordados por mais tempo sem experienciar as habituais repercussões negativas, como fadiga mental e deterioração da saúde geral, segundo estudo recente publicado no Journal of Neuroscience.

Investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade de Washington conseguiram manter ratos acordados além das suas horas típicas de repouso sem fazê-los sentir mais sonolentos ao ativar astrócitos nos roedores.

Com foco nos astrócitos do fórum basal — uma área fundamental para regular o sono e a vigília — a equipa fez uso da quimogenética para ativar estas células.

Surpreendentemente, os ratos permaneceram acordados por seis ou mais horas durante o seu período normal de sono. Mas essa não é a melhor parte: não houve mudanças aparentes nos padrões ou intensidade do sono subsequente devido ao despertar prolongado.

“Apesar das horas de vigília [ausência de sono a horas em que é considerado normal estar a dormir] extras, estes ratos não apresentaram qualquer diferença em termos de tempo e intensidade de descanso comparativamente aos ratos descansados”, afirmou Marcos Frank, neurocientista e autor principal do estudo.

Os astrócitos, anteriormente vistos apenas como a “cola” estrutural do cérebro — por preencherem o espaço entre os neurónios —foram recentemente identificados como atores-chave em diversos processos comportamentais. Esta “cola” não comunica por sinais elétricos como os neurónios, mas sim através de um método chamado sinalização de cálcio.

A pesquisa reforça que a necessidade de sono não é determinada unicamente pela duração da vigília.

“Os nossos resultados sugerem que a nossa necessidade de sono (…) também é impulsionada por estas células não neuronais há muito ignoradas”, afirma a primeira autora, Ashley Ingiosi, da Universidade de Ohio.

A próxima fase desta pesquisa passa por tentar compreender como a ativação dos astrócitos pode pode influenciar outros processos vitais, como atenção, aprendizagem e metabolismo.

Dados preliminares, provenientes de marcadores que examinam a atenção e capacidade cognitiva no estudo, já indicaram semelhanças entre os ratos “manipulados” e os bem descansados.

Potenciais intervenções médicas direcionadas aos astrócitos ficam, assim, nos planos futuros da Ciência.

O objetivo de tais fármacos seria, claro está, contrariar os efeitos adversos do despertar prolongado, beneficiando significativamente os trabalhadores por turnos, socorristas, militares e outras profissões que operam frequentemente em horários irregulares. A sua produtividade, segurança e saúde geral poderia melhorar exponencialmente.

Tomás Guimarães, ZAP //

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