As sondagens falharam (outra vez). Podemos continuar a confiar nelas?

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André Kosters / Lusa

Nenhuma sondagem previa um resultado tão baixo para o PS e a possibilidade de o Chega se tornar a segunda força política. Estará na hora de repensar estes inquéritos?

Mais umas eleições legislativas, mais um tiro ao lado das sondagens. Desta feita, a grande surpresa não foi no partido vencedor — como foi o caso em 2022, com a maioria absoluta do PS ou em 2024, com o resultado da AD a ficar aquém do esperado — mas sim com os outros dois partidos que compõem o pódio.

Depois de várias semanas em que muitas sondagens apontavam para um empate técnico entre PS e a AD, o verdadeiro empate foi entre o PS e o Chega, que conquistaram ambos 58 deputados, havendo ainda a possibilidade real de o partido de André Ventura se afirmar isoladamente como segunda força política após a contagem dos votos da emigração.

Segundo a Sondagem das Sondagens da Renascença, que faz uma média dos resultados de vários inquéritos, “não só nenhuma sondagem em 2025 colocou o PS no patamar dos 23,4%”, como também nenhuma previu os 22,6% obtidos pelo Chega, já que o “valor mais alto que obteve com a distribuição de indecisos foi 20%”. “A chave, como sempre, pode estar na decisão que os eleitores indecisos tomaram este domingo”, aponta a rádio.

Esta subestimação do resultado do Chega não passou despercebida a André Ventura, que começou o seu discurso com críticas às empresas de sondagens. “A partir de hoje ninguém mais acreditará em sondagem nenhuma. Alertei a tempo sobre uma injustiça que estava a ser cometida com mais de um milhão de eleitores. É hora de exigir a estas empresas responsabilidade em Portugal”, defende.

Como são feitas as sondagens?

Segundo a rádio Renascença, estas medições da intenção de voto movimentam anualmente centenas de milhares de euros.

As sondagens internas, encomendadas pelos partidos, raramente são divulgadas publicamente, mas têm marcado o discurso político e foram elas próprias um instrumento de campanha. Montenegro afirmou recentemente dispor de “números melhores” que sustentariam o crescimento da AD, enquanto Pedro Nuno Santos sugeriu que os socialistas estavam a ser “subestimados” nas sondagens. Tanto o PS como a AD recusaram divulgar quantas sondagens internas fizeram.

Além das sondagens internas dos partidos, seis empresas realizaram inquéritos para diferentes meios de comunicação, utilizando metodologias variadas em termos de seleção de participantes, formato de entrevistas e tratamento dos indecisos.

A lei portuguesa, em vigor desde 2000, não obriga os partidos a divulgar as suas sondagens internas, exceto quando estas são publicadas por um órgão de comunicação social. Nesse caso, é obrigatório o depósito prévio da sondagem na Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC). A não observância desta regra pode levar a coimas de até 250 mil euros às empresas responsáveis.

Nos orçamentos entregues à Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (ECFP), a AD declarou gastos de um milhão de euros em estudos de mercado e o PS de 600 mil euros. Entre os restantes partidos, apenas a Iniciativa Liberal revelou ter realizado uma sondagem para definir a sua estratégia. Livre, Bloco de Esquerda e CDU garantiram não ter feito qualquer sondagem interna.

Os custos das sondagens variam conforme o tipo e a dimensão: uma sondagem telefónica com 600 inquiridos ronda os 4000 euros, enquanto uma sondagem com 1200 inquiridos por telefone chega aos 15 mil euros. Já um inquérito com 1200 pessoas em simulação de urna custa cerca de 20 mil euros. Por fim, as sondagens à boca das urnas com mais de 10 mil inquiridos custam entre 50 mil e 60 mil euros, aponta a Executive Digest.

As sondagens são confiáveis?

Os falhanços nas previsões nos últimos anos têm levado a que muitos questionem a utilidade das sondagens e até se a divulgação destas deve ser proibida, já que há quem considere que são mais um meio de influenciar o voto do que meramente um espelho dele.

Apesar de haver estudos pós-eleitorais que apontam que dois terços dos eleitores portugueses não prestam atenção às sondagens, há resultados que parecem contradizer isto. Em 2022, PS e PSD apareciam taco a taco nos inquéritos e o PSD até chegou a surgir à frente na reta final das eleições — só para, no final de contas, o PS ganhar com maioria absoluta.

Chegou-se a especular que a proximidade entre PS e PSD nas sondagens pode ter sido um fator influenciador no resultado final, já que, perante a relutância de Rui Rio em recusar categoricamente uma aliança com o Chega, os eleitores que não queriam a extrema-direita do Governo podem ter ficado assustados com as sondagens e ter decidido votar em massa no PS para travar este cenário.

De acordo com o economista e especialista em sondagens Luís Aguiar-Conraria, os inquéritos são confiáveis, mas não como se espera. “Regra geral, sim, no sentido de não serem propositadamente manipuladas. Confiar no sentido de que são uma previsão do resultado eleitoral é bem mais difícil”, defende, ouvido pela Sábado.

Os especialistas apontam que a desvalorização dos indecisos é a explicação para os sucessivos erros nas previsões das sondagens nos últimos anos. Apesar de não se saber de que forma influenciam diretamente o eleitorado, as sondagens podem na mesma ter impacto nas eleições ao moldarem o discurso dos partidos. “Estes indicadores servem para mudar e afinar estratégias dos partidos políticos“, refere o professor de ciência política José Filipe Pinto.

Luís Aguiar-Conraria relembra ainda que “há cada vez mais pessoas que não respondem aos inquéritos e não há forma de garantir que quem não responde tem um comportamento eleitoral semelhante ao de quem responde. E assim as extrapolações são cada vez mais complicadas”.

Adriana Peixoto, ZAP //

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