A ketamina está a ser utilizada em pelo menos dois hospitais portugueses para tratar a depressão. A substância é vista como altamente promissora.
O Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, e o Hospital Júlio de Matos, ou Centro Hospital Psiquiátrico de Lisboa, já estão a aplicá-la em tratamentos. No Porto, o São João planeia usá-la, estando na fase de aprovação interna, escreve o Público.
Aliás, o Hospital Beatriz Ângelo foi o primeiro na Europa a usar ketamina para tratar doentes depressivos com resistência a medicamentos.
Utilizado como anestesiante em cavalos, a ketamina é um medicamento até usado como droga em festas, tendo efeitos muito semelhantes ao LSD. A ketamina gera, no momento da utilização, tanto anestesia como alucinação.
A substância induz um estado de transe, proporcionando alívio da dor, sedação e perda de memória. Outros usos incluem alívio de dor crónica, sedação nos cuidados intensivos e foi aprovada nos Estados Unidos pela Food and Drug Administration (FDA), em 2019, para uso em pacientes com depressão refratária.
A depressão refratária significa que o paciente é resistente a tratamento. No século XXI, a depressão pode afetar uma em cada 10 pessoas. Contudo, para mais de 30% dos que são afetados, os medicamentos antidepressivos não funcionam.
A ketamina induz um efeito psicadélico que, em conjunto com a psicoterapia, se mostrou eficaz no tratamento de casos de depressão resistente. O seu efeito antidepressivo de redução dos sintomas verifica-se cerca de quatro horas depois da sua administração — bem mais rápido que outros antidepressivos, que podem demorar cerca de quatro semanas a fazer efeito.
Em Portugal, a ketamina é mais associada à sua utilização recreativa do que aos seus efeitos terapêuticos, e costuma provocar em quem a consome não só a quase impossibilidade de movimentos como alguns episódios de alucinação. Tornou-se popular enquanto ‘droga de festa’, com a alcunha de “special K”.
Atualmente, a ketamina está a avançar para se tornar uma terapia convencional de saúde mental. Uma série de novos estudos sugerem que tem um enorme potencial para tratar as formas mais graves de depressão.
Um estudo publicado em setembro no Journal of Clinical Psychiatry sugere que o anestésico reduziu significativamente os sintomas de depressão, ansiedade e ideação suicida em 424 pacientes tratados com ketamina, na Virgínia, nos Estados Unidos.
Para já, apesar do seu potencial, dificilmente este tipo de tratamentos se vão generalizar no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Em resposta ao jornal Público, o SNS sublinhou que o tratamento com ketamina ainda “não tem ainda evidência suficiente para ser uma recomendação terapêutica no âmbito das políticas nacionais de saúde mental”.
O entusiasmo com que a ketamina foi vista como potencial tratamento para a depressão pode ser ofuscado pelos resultados de alguns estudos.
A investigação científica sugere que os seus efeitos secundários, que incluem distúrbios psiquiátricos, possam piorar com o seu uso contínuo.
Os dados limitados sobre como o uso repetido de ketamina pode influenciar a função do cérebro humano levam a crescentes preocupações acerca do seu uso repetido e não regulamentado em indivíduos vulneráveis.