O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) não detetou qualquer migrante em situação irregular em Odemira na inspeção realizada esta quarta-feira no concelho.
As autoridades de saúde, bem como o SEF, a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), GNR e Proteção Civil estiveram no terreno a avaliar as condições de trabalho, habitação e de saúde dos trabalhadores das estufas onde se produzem os frutos vermelhos.
A operação acontece no momento em que duas freguesias do concelho, São Teotónio e Longueira-Almograve se encontram sob cerca sanitária devido ao elevado número de casos de covid-19, sobretudo entre a população migrante, oriunda sobretudo da Índia, Nepal ou Bangladeche.
Esta quarta-feira deverão ser colocados 50 migrantes que tiveram testes negativos à covid-19 no Zmar e que não têm condições de habitação.
A Polícia Judiciária investiga atualmente vários casos de alegados crimes ligados ao auxílio à imigração ilegal, tráfico de pessoas e escravatura neste concelho, que tem a maior taxa de incidência da covid-19 no país.
Junto do SEF, o Público conseguiu apurar que não foram detetados imigrantes em situação irregular nesta operação.
A comunidade migrante foi a principal justificação para os números elevados de incidência no concelho, sendo que o presidente da Câmara de Odemira disse ao Público que que cerca de metade dos casos no concelho estavam na comunidade migrante.
Esta quarta-feira, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, pediu que fosse apurada a existência “de qualquer coisa de criminoso” em Odemira, reiterando que a mão-de-obra imigrante deve ser tratada em termos humanos e com “dignidade, como vem na Constituição”.
Proprietários de casas do Zmar não se conformam
Várias dezenas de proprietários de casas no Zmar Eco Experience, em Odemira (Beja), mantêm-se esta quarta-feira concentrados e em protesto, agora com “reforço” de funcionários, à entrada do complexo, contra a transferência de trabalhadores agrícolas para o local.
Junto às estruturas de madeira que assinalam a entrada do Zmar, um grupo de pessoas do complexo colocou vedações ligadas a um atrelado agrícola que já estava no local para impedir o acesso a partir do exterior.
Contudo, ao final da tarde, por breves minutos, foi desbloqueado o acesso e o comandante Territorial de Beja da GNR, coronel Altide Cruz, entrou e esteve reunido com a representante dos donos de casas em protesto, constatou a agência Lusa no local.
Esta iniciativa dos proprietários dura há quase uma semana, já que arrancou na sexta-feira, quando entrou em vigor a cerca sanitária decretada pelo Governo a duas freguesias do concelho de Odemira.
Na altura, o executivo determinou também a requisição temporária do empreendimento para a colocação de trabalhadores agrícolas que necessitem de isolamento profilático.
“Desde o primeiro momento que estamos disponíveis para conversar e a única pessoa que se dignou a vir conversar connosco e reunir, para fazer um ponto de situação foi agora o coronel Cruz”, explicou aos jornalistas Alexandra Beato, porta-voz dos proprietários.
A representante dos proprietários, que não quis divulgar o teor da conversa, insistiu que o grupo está “a tentar garantir que não há invasão das casas e que a justiça acontece” e que não tenciona “desmobilizar enquanto o assunto não se resolver”.
“Estamos a todo o momento a aguardar o que é que vai acontecer a seguir, mas tudo indica que” o Zmar poderá ser “a alternativa que a Câmara de Odemira encontra”, disse.
Para Alexandra Beato, “o que quer que aconteça” tem de ser “feito com base numa conversação, numa negociação, no entendimento das partes e sem mentiras”, porque, nos últimos dias, tem-se assistido a “uma palhaçada”.
As pessoas que estão hoje na entrada do Zmar mostraram, entretanto, aos jornalistas que estão no local 200 edredons e almofadas para disponibilizar aos trabalhadores agrícolas para se instalarem no parque de feiras e exposições de São Teotónio, em vez de terem de irem para o empreendimento.
A trabalhar no Zmar desde o início do projeto, tal como o marido, Teresa Gonçalves foi uma das funcionárias que hoje se juntou ao protesto, após conseguir uma autorização para passar a cerca sanitária, tal como os colegas.
“Ninguém fala nos trabalhadores [do empreendimento], ninguém fala do que é vai acontecer com os nossos postos de trabalho e isso é preocupante”, lamentou, explicando à Lusa que, desde 4 de janeiro, devido ao processo de insolvência do complexo turístico, está em casa.
O que é certo é que são dois ordenados que têm levado um “corte”, o seu e o do marido: “Estávamos em lay-off, depois passámos para um programa de retoma e ganhávamos o ordenado mínimo” e, “agora, estávamos a ver uma luz lá no fundo do túnel e essa luz desapareceu”.
A trabalhadora aludia ao plano de reestruturação do Zmar aprovado na semana passada no Tribunal de Odemira, com a reabertura do complexo agendada para 28 de maio, a manutenção de 100 postos de trabalhos e a injeção de capital por parte de um investidor.
No final da semana passada, o Governo decidiu decretar uma cerca sanitária às freguesias de São Teotónio e de Almograve, no concelho de Odemira, devido à elevada incidência de casos de covid-19, sobretudo entre trabalhadores do setor agrícola.
António Costa sublinhou que “alguma população vive em situações de insalubridade habitacional inadmissível, com hipersobrelotação das habitações”, relatando situações de “risco enorme para a saúde pública, para além de uma violação gritante dos direitos humanos”.
Providência cautelar contra requisição
O advogado que representa um grupo de proprietários de casas no Zmar, em Odemira, revelou hoje que interpôs em tribunal uma providência cautelar contra a fundamentação da requisição temporária do complexo turístico decretada pelo Governo.
“Interpusemos hoje em tribunal uma providência cautelar contra a fundamentação da requisição civil”, disse à agência Lusa o advogado Nuno Silva Vieira, que representa 114 dos 160 proprietários de casas privadas do empreendimento.
Segundo o causídico, entre os argumentos a contestar a fundamentação da requisição temporária do Zmar Eco Experience decidida pelo Governo está o facto de, “no documento” do executivo, este “dizer que dialogou com os proprietários”.
“Disseram que conversaram connosco antes e que nunca chegaram a acordo. Isso é mentir, nunca falaram connosco”, argumentou.
Além disso, “o Zmar enquanto empresa não existe, portanto, a requisição civil é apontada ao Zmar mas, neste momento, não existe, o que existe é a massa insolvente do Zmar”, alegou.
“Por isso, a requisição civil vai dirigida a uma entidade que não existe e não se pode aplicar a nós”, salientou, dando conta de mais um argumento a que recorreu na providência cautelar.
O empreendimento, que ocupa 80 hectares, integra serviços comuns, como piscina ou spa, e cerca de 260 casas individuais, das quais perto de 100 pertencem ao próprio complexo e as outras 160 são de privados.
ZAP // Lusa