A República Centro-Africana pode tornar-se “ uma nova Bósnia”, em que comunidades inteiras são massacradas por outras confissões diferentes, face ao olhar impotente da comunidade internacional, advertiu esta sexta-feira o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR).
“O caso da República Centro Africana faz-me lembrar o livro ‘Crónica de uma Morte Anunciada’, em que nós sabemos o que vai acontecer antes de acontecer”, disse aos jornalistas o diretor de proteção internacional do ACNUR, Volker Turk, que regressou recentemente de Bangui, capital do país africano.
“Há 23 anos que trabalho no ACNUR e vi poucas situações tão complicadas e urgentes como as da República Centro-Africana. Infelizmente, lembra-me o que aconteceu na Bósnia”, afirmou Volker Turk.
O responsável apontou como exemplo de eventual indiferença da comunidade internacional a fraca resposta ao apelo humanitário lançado pela ONU, que até ao momento recebeu somente 22% dos cerca de 500 milhões de euros que solicitou para assistência à população daquele Estado.
Anteriormente, o diretor da organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch para África, Daniel Bekele, alertou para o “grave perigo” que a população da República Centro-Africana vive e que a comunidade internacional “tem sido incapaz de a proteger”.
Cristãos contra muçulmanos
Em março de 2013, a República Centro-Africana mergulhou no caos desde que a coligação Séléka, de maioria muçulmana, derrubou o Governo do país maioritariamente cristão e presidido por François Bozizé, desencadeando uma espiral de violência sectária, com um balanço de milhares de mortos.
O funcionário da agência das Nações Unidas explicou que as comunidades islâmicas centro-africanas, por exemplo, são constantemente ameaçadas e, por isso, vivem numa espécie de reclusão para evitar ataques das milícias anti-balaka (“anti-machete”, na língua local), maioritariamente cristãos.
Desde o último sábado, grupos de milícias anti-balaka e outros militantes vestidos com o uniforme do exército nacional mataram pelo menos oito muçulmanos em Bangui.
“Os muçulmanos temem ser massacrados e prevalece o medo”, disse Volker Turk, que descreveu a situação como sendo “absolutamente desesperante”, pelo que a comunidade internacional deve “agir antes que a tragédia aconteça”.
No início do mês, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, recomendou o envio de 11.820 capacetes azuis para restaurar a ordem e segurança na República Centro-Africana, onde também estão presentes forças de manutenção de paz da França e do exército da União Africana.
/Lusa