Gustavo Petro, o primeiro Presidente de esquerda da Colômbia, promete “paz”

Mauricio Duenas Castaneda / EPA

Gustavo Petro e Francia Márquez, presidente e vice-presidente da Colômbia

Gustavo Petro tomou no domingo posse em Bogotá, capital da Colômbia, perante centenas de milhares de pessoas, como o primeiro Presidente da República de esquerda na história do país.

Petro sucede ao muito impopular Iván Duque (2018-2022) para um mandato de quatro anos que inicia com o apoio de uma maioria de esquerda no Congresso, noticiou a agência Lusa.

A vitória de Petro nas presidenciais de junho infletiu o percurso da Colômbia, há muito dirigida por uma elite conservadora, para uma trajetória comum à de outros países da América Latina que efetuaram uma viragem à esquerda.

“Juro perante Deus e o povo respeitar fielmente a Constituição e as leis da Colômbia”, declarou o antigo senador e ex-guerrilheiro de 62 anos, na cerimónia de investidura, prometendo mudanças radicais no país, nomeadamente em termos ambientais e de luta contra as grandes desigualdades e a violência ligada ao tráfico de droga.

Petro, que abandonou a revolta armada há três décadas, prestou juramento na praça Bolívar de Bogotá, perante uma grande delegação de convidados internacionais e uma imensa multidão.

“O primeiro Governo que, esperamos, será um Governo de paz, está prestes a começar. Esperamos que possa trazer à Colômbia o que ela não tem há séculos, ou seja, tranquilidade e paz”, declarou Petro no sábado, numa primeira cerimónia de entronização junto de povos indígenas, afro-colombianos e camponeses.

O antigo líder da oposição das últimas duas décadas na Colômbia assume o cargo com uma série de reformas em mente que criaram fortes expectativas junto dos seus apoiantes desde a sua vitória, em 19 de junho.

Ao seu lado, a ecologista Francia Márquez, de 40 anos, tomou posse como primeira vice-presidente afro-colombiana de um país que tem sido historicamente governado por elites masculinas brancas.

Petro parte de uma “posição invejável, com uma ampla maioria no parlamento, e beneficia, ao nível da rua, de um apoio que nenhum Governo teve nos últimos anos”, considerou o especialista Jorge Restrepo, do Centro de Recursos para a Análise de Conflitos (CERAC).

Formou um Governo plural, com mulheres à frente de várias pastas, com a missão de fazer avançar as reformas que iniciarão hoje o seu percurso legislativo. Em busca de recursos para financiar os planos de reformas sociais, tem projetos de lei destinados a aumentar os impostos aos mais ricos, aumentar a coleta e taxar os refrigerantes.

Mas “o nível de endividamento e de défice fiscal com que deparámos é crítico”, declarou Daniel Rojas, um dos coordenadores da comissão de transição com o Governo do seu antecessor.

Petro pretende, apesar de tudo, cumprir a sua promessa de reduzir o fosso entre os mais ricos e os mais pobres desenvolvendo o acesso ao crédito, multiplicando as ajudas e colocando ênfase na educação. “Lutarei pela justiça social numa das sociedades mais aberrantemente desiguais à face da Terra”, disse no sábado.

Apesar de a economia colombiana ter recuperado da pandemia de covid-19 e ter retomado o crescimento, os 10,2% de inflação em julho e os 29% de pobreza tornam os desafios do Presidente Petro ainda maiores.

“As pessoas esperam que algumas mudanças prometidas durante a campanha sejam rapidamente postas em prática, o que, somado à situação económica (…) gera uma atmosfera de tensão”, prevê Patricia Muñoz, politóloga da Universidade Javeriana.

No plano internacional, Petro vai reativar as relações diplomáticas e comerciais cortadas desde 2019 com a vizinha Venezuela de Nicolás Maduro e procurar apoio para reatar as negociações de paz com o Exército de Libertação Nacional (ELN), a última guerrilha ainda existente no país.

Apesar de o acordo de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC, guerrilha marxista), em 2016, ter permitido reduzir a violência, a Colômbia ainda não pôs fim ao último conflito armado interno do continente.

Além do ELN, poderosos gangues de traficantes de droga, como o Clã do Golfo, dirigido pelo barão ‘Otoniel’, este ano extraditado para os Estados Unidos, impõem a sua lei em diversas regiões do país.

E os dissidentes das FARC também desafiam o Estado, graças aos recursos procedentes da exploração mineira ilegal e, sobretudo, ao tráfico de droga, uma vez que a Colômbia continua a ser o maior produtor de cocaína do mundo.

Nesta matéria, Petro propõe que se repense o fracasso da política de erradicação do cultivo, em colaboração com os Estados Unidos, principal consumidor daquele derivado da folha de coca.

O novo Presidente proporá a paz a estes grupos armados em troca de programas de redução de penas, nos termos do modelo de acordo aplicado às FARC.

Petro tenciona ainda reformar a polícia antimotim, acusada de múltiplas violações dos direitos humanos durante a violenta repressão de manifestações que abalaram o mandato do seu antecessor.

Lusa //

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