Há mais de 100 padres abusadores no ativo. São “perigo real” mas Igreja rejeita “caça às bruxas”

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Miguel A. Lopes / Lusa

D. José Ornelas, presidente da Conferência Episcopal Portuguesa.

Haverá mais de 100 padres abusadores no ativo, que são um “perigo real” de reincidência. No entanto, D. José Ornelas rejeita uma “caça às bruxas” e o seu afastamento imediato.

Pedro Strecht, presidente da Comissão Independente que estuda os abusos sexuais de menores na Igreja, revelou esta segunda-feira que o perfil da maior parte dos abusadores “é de continuidade da persecução do mesmo tipo de crime”, pelo que “constituem um perigo real”. Haverá mais de 100 padres abusadores no ativo, avança.

O coordenador da comissão disse que a Igreja Católica tem “o dever moral e ético de colaborar com as entidades judiciais” e que “pode perfeitamente investigar” assim que receber a lista com os nomes dos abusadores.

A comissão validou 512 testemunhos dos 564 que recebeu, com um número mínimo de 4.815 vítimas. Foram remetidos 25 casos para o Ministério Público.

Segundo o Observador, Strecht falou ainda da proposta que será discutida e apresentada na Assembleia da República para que os crimes só prescrevam depois de as vítimas fazerem 30 anos. Atualmente, a lei dita que os crimes prescrevem após as vítimas completarem 23 anos.

A Comissão Episcopal Portuguesa (CEP) quer adotar uma política de “tolerância zero”. A garantia foi deixada pelo bispo D. José Ornelas, na conferência de imprensa de ontem: “Não toleraremos abusos nem abusadores”.

No entanto, os padres suspeitos de abusos e os bispos suspeitos de encobrimento não serão liminarmente afastados. Estes serão sujeitos aos processos previstos no Direito Canónico e “às regras da Santa Sé”.

“Quem comete estes crimes tem de assumir as responsabilidades, criminais e civis, dos seus atos”, afirmou o presidente da CEP, sugerindo-lhes que “procurem uma mudança radical de vida”.

D. José Ornelas reforçou que os padres só poderão ser afastados depois de tal “ser provado”, sendo necessário averiguar a “plausibilidade” de cada caso. “Cada caso é um caso”, sublinho o bispo, realçando que é preciso investigar “para não andarmos à caça de bruxas”.

Perigo de reincidência

Ainda segundo o Observador, há padres católicos e outros funcionários da Igreja suspeitos de abusar sexualmente de menores que continuam no ativo, com funções atribuídas pela Igreja em Portugal.

Para já, a comissão não revela quantos são, nem onde estão. Até ao final do mês será apresentada uma lista completa com essas informações à CEP e ao Ministério Público.

Pedro Strecht justifica a não revelação das identidades dos abusadores no ativo com a necessidade de proteger as vítimas, que se mantiveram anónimas.

O conhecimento científico sobre o fenómeno do abuso de menores aponta para um alto risco de reincidência deste tipo de atos.

“Não chega retiros espirituais, não chega retiradas transitórias de situações. Desculpem-me a linguagem, mas não há milagres”, avisou o pedopsiquiatra. “Não querendo ser Humberto Delgado… Obviamente, afastava-os”.

“Houve inequivocamente abusos sexuais por parte de membros da Igreja Católica portuguesa e houve evidentemente ocultação desses abusos por parte da hierarquia”, disse Álvaro Laborinho Lúcio, ex-ministro da Justiça, que pertence à comissão independente.

Imprensa internacional destaca “relatório explosivo”

Os casos de abusos sexuais na Igreja Católica em Portugal, são esta segunda-feira destaque em vários meios de comunicação social um pouco por todo o mundo, alguns dos quais falam mesmo num “relatório explosivo”.

O jornal norte-americano Boston Globe — que criou um departamento cujos jornalistas se envolveram numa prolongada investigação sobre abusos sexuais na Igreja e que deu mesmo origem ao filme galardoado “Spotlight” — dá hoje destaque ao relatório que foi hoje divulgado em Portugal.

O jornal começa por lembrar que alguns altos representantes da Igreja Católica em Portugal “tinham previamente defendido que apenas uma mão cheia de casos (de abuso sexual) teria ocorrido”, para contrastar com o facto de o relatório falar em vários milhares.

O jornal Crux — que foi lançado pelo Boston Globe, para tratar de matérias ligadas à igreja católica — ilustra uma peça sobre o relatório com a imagem do interior de uma igreja em Lisboa e dá destaque à posição de arrependimento e de sentido de culpa da hierarquia religiosa em Portugal.

Na Índia, o jornal India Today fala em “relatório explosivo” e destaca o facto de 25 dos testemunhos recolhidos pelos especialistas terem sido enviados para o Ministério Público, para eventuais investigações judiciais.

O jornal francês Le Monde fala em “pedocriminalidade” na igreja católica em Portugal e salienta o facto de o relatório revelar que as vítimas são oriundas “de todas as regiões e de todas as categorias sociais”, recordando que muitos dos casos já prescreveram judicialmente.

O Le Monde faz eco dos relatos de várias das vítimas, citadas pelo relatório, e menciona ainda a reação da igreja portuguesa, através do presidente da Conferência Episcopal, José Ornelas, que se mostrou agradado com a eficácia da equipa composta por seis especialistas.

Desde Espanha, onde a Igreja Católica local também está a braços com investigações de casos de abuso sexual, o jornal El Mundo destaca a incapacidade da equipa de investigação de “quantificar o total de crimes”, referindo-se a uma declaração de um dos especialistas, Pedro Strecht, que mencionou o facto de alguns casos se reportarem a vários abusos.

O El Mundo sublinha ainda o facto de os abusadores serem sobretudo padres (cerca de 70%) e homens (96%), lembrando que os abusos se produziam maioritariamente em locais de culto, seminários e instituições desportivas.

O jornal norte-americano The Washington Post aborda o tema pela reação da Conferência Episcopal, citando Ornelas quando este disse que a cúpula da igreja em Portugal “viu e ouviu coisas que não podem ser ignoradas”.

O Washigton Post cita ainda os especialistas responsáveis pelo relatório que lamentaram a demora do Vaticano a dar acesso aos arquivos da igreja, para as investigações aos casos de abuso.

No Brasil, o jornal Folha de São Paulo informa que as conclusões do relatório serão discutidas numa “reunião especial da cúpula católica no país”, onde será discutida a possibilidade de virem a ser pagas indemnizações às vítimas.

O jornal turco pró-governamental Daily Sabah salienta o volumoso número de vítimas de casos de abusos sexuais, lembrando que a maioria era composta por crianças, sendo a mais jovem de apenas dois anos de idade.

Daniel Costa, ZAP // Lusa

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1 Comment

  1. O Ornelas cometeu un lapso ; trata-se mais de uma caça aos bruxos ! . Tentam custe que custe amenizar, abafar e silenciar estes casos en vez de deixar os Tribunais Civis sentenciarem os culpados ! …. e Eu pergunto , mais uma nova comissão exigida por o P.R para quê ? ……. para atrasar ainda mais qualquer condenação e sentença ? . Vem ai Agosto ! …..claro !

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