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De pecado de freira aos tribunais. Ovos-moles de Aveiro perdem batalha contra peixes doces

Confeitaria Peixinho / Facebook

Ovos-moles da Confeitaria Peixinho

Ovos-moles da Confeitaria Peixinho, a casa mais antiga de Aveiro a vender este doce típico.

A Associação de Produtores de Ovos Moles de Aveiro queria proibir a venda das sardinhas-doces de Peniche e dos carapaus-doces da Nazaré, mas perdeu a batalha em tribunal.

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) negou o pedido da Associação de Produtores de Ovos Moles de Aveiro (APOMA) que pretendia que a venda das sardinhas-doces de Peniche e dos carapaus-doces da Nazaré fosse proibida. A APOMA contesta as parecenças visuais e de fabrico destes dois doces.

Contudo, segundo o STJ, “não se verifica risco de erro, associação ou confusão“, conforme o acórdão consultado pelo Jornal de Notícias (JN).

A APOMA queria também evitar que fosse feita qualquer publicidade aos produtos de Peniche e da Nazaré. Mas também este pedido foi negado pelo STJ depois de o caso ter passado por um tribunal de primeira instância e pela Relação de Lisboa.

Para a associação, há “elevadas coincidências visuais” e em “todo o modo de produção, utilizando as folhas de hóstia, os ferros, as prensas, a maneira como depois são enchidos, prensados e recortados”, como se refere no processo divulgado pelo JN.

O STJ contesta o argumento da APOMA que pressupõe que “todo e qualquer doce de ovos cuja apresentação esteja ligada a motivos marítimos – ou, dentro dos motivos marítimos, a peixes – evocaria os ovos-moles de Aveiro”. “Ora não é e não deve ser assim“, concluem os juízes do Supremo.

Quanto à disputa específica com os peixes doces de Peniche e Nazaré, o STJ salienta que “em lugar de uma evocação dos ovos-moles de Aveiro”, são, simplesmente, uma representação da “relação das populações de duas localidades com o mar“.

Assim, conclui que “não há risco de associação entre as marcas” e que não foram lesados os direitos protegidos dos ovos-moles de Aveiro.

Note-se que os ovos-moles de Aveiro foram o primeiro produto de pastelaria portuguesa a receber a denominação IGP – Indicação Geográfica Protegida da União Europeia em 2009.

A APOMA tem um Caderno de Especificações que impõem regras para a produção e venda deste doce.

O Grupo Calé que comercializa os peixes doces de Nazaré e Peniche argumenta que “não existe qualquer confundibilidade, imitação ou evocação” dos ovos-moles de Aveiro nestes seus produtos.

“Em nada colidem com o valor económico e cultural dos ovos-moles de Aveiro, sendo distintos em tamanho, cor e sabor” e reproduzindo “produtos afamados nas regiões de Peniche e da Nazaré, como marca distintiva destas, não sendo as mesmas associadas à região de Aveiro”, aponta ainda o Grupo Calé citado pelo JN.

O carapau-doce, segundo o grupo, nasceu na Escola Profissional da Nazaré e foi registado em Janeiro de 2018.

Ovos-moles nasceram do “pecado” de uma freira

Os ovos-moles são mais antigos do que a própria cidade de Aveiro. A sua origem não é clara, mas acredita-se que data do século XVI.

A receita terá nascido das mãos de uma freira do antigo Mosteiro de Jesus, actual Museu de Aveiro, como se relata no site da Confeitaria Peixinho.

Esta confeitaria é considerada a casa de ovos-moles mais antiga de Aveiro, depois de ter sido fundada em 1856, e é um dos locais privilegiados para comprar o doce típico.

A lenda diz que, por causa da sua invenção gulosa, a freira foi castigada pela Madre Superiora. É que a receita terá nascido por estar farta de jejuar.

Para esconder o “pecado” feito de gemas de ovos e de açúcar, a freira envolveu os doces em hóstias.

E assim terá nascido este doce conventual que, actualmente, se vende em formas que fazem referência ao mar, como pequenos peixes, búzios e conchas, ou pequenas barricas pintadas à mão.

O doce típico movimenta milhões de euros todos os anos e é um dos ex-libris de Aveiro. Em 2022, resultou em quase 10 milhões de euros de facturação para os 37 produtores certificados, segundo dados divulgados pela SIC.

Nesse ano, venderam-se mais de 400 toneladas de ovos-moles, o que constitui um recorde de fabrico e de vendas.

Susana Valente, ZAP //

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