Onde reside o significado de uma frase? A matemática pode dizer-nos. Perceber o fenómeno da linguagem, através desta ciência exata, pode ajudar-nos a compreender melhor o mundo que nos rodeia.
Na escola, perguntam-nos: “gostas mais de matemática ou línguas?” Tai-Danae Bradley respondia “línguas”. Não gostava de matemática.
Em 2008, entrou para o City College de Nova Iorque, onde esperava iniciar uma carreira na área da nutrição desportiva. Via as disciplinas de matemática como um obstáculo curricular em que só os génios podiam realmente destacar-se.
“Preferia que me arrancassem todos os dentes a ter de fazer isto como profissão”, contou à Quanta Magazine. Mas, no segundo ano, o seu professor de cálculo fê-la mudar de ideias.
Bradley havia descoberto que a matemática era a linguagem em que se escrevia o resto das ciências. Afinal, “havia algo mais profundo do que aquilo que estava nos manuais escolares”, disse.
Depois desse “choque” decidiu fazer uma dupla licenciatura em matemática e física. Hoje, é professora na Master’s University na Califórnia.
Linguagem: uma categoria da matemática
Bradley tem agora como missão servir-se da linguagem da matemática para tentar compreender melhor a nossa linguagem – e até já criou um modelo.
Em entrevista à Quanta Magazine, a matemática conta que enveredou por este caminho porque “estava interessado em perceber: Qual é a estrutura matemática da linguagem? Quais são as suas unidades básicas? Como é que as relações matemáticas entre palavras e frases conduzem a um conteúdo significativo?”
Ao pensar na linguagem como uma categoria matemática, a investigadora tem sido capaz de aplicar ferramentas estabelecidas para a estudar e obter novos conhecimentos.
Os linguistas esperam que o seu modelo os possa ajudar a provar certas teorias sobre a forma como a gramática e o significado emergem de cadeias de palavras e a identificar de que forma o texto gerado por IA difere da linguagem humana.
A própria está profundamente interessada na forma como o estudo da linguagem pode permitir-lhe desenvolver novas ferramentas matemáticas.
Bradley explicou, na entrevista, de que forma é que a linguagem e a matemática andam de mãos dadas; e exemplificou: “o número de vezes que a palavra ‘gato’ aparece ao lado de outras palavras. Se eu disser ‘A curiosidade matou o ____’, posso calcular a probabilidade de a palavra seguinte ser “gato” e não ‘helicóptero'”.
“Podemos então pensar em todas as palavras ou frases possíveis (ou combinações de letras, na verdade) como objetos de um tipo de categoria mais geral chamado categoria enriquecida. E cada objeto está relacionado com todos os outros objetos pela probabilidade de se seguir a ele – estas são as versões enriquecidas dos seus morfismos. Pode pensar neles como setas entre palavras, cada uma identificada com um número”, explicou.
Se olharmos para as palavras que tendem a vir a seguir a “azul” – como “oceano azul” ou “céu azul”, mas não “abacate azul” – podemos ter uma ideia do que significa a palavra “azul”?
Na comunidade linguística, a resposta a esta pergunta não é consensual.
Como ser humano, podemos extrair significado de uma frase na página, mas as palavras no papel não são tudo a que tenho acesso. Tenho acesso ao mundo.
Os linguistas têm debatido se é necessário um “manual mundial” para extrair significado da linguagem escrita.
“A ideia de que o significado reside na disposição das palavras é uma ideia antiga na linguística, mas que tem vindo a cair de moda nas últimas décadas”, considerou a matemática.
O trabalho de Bradley apoia a ideia de que existe significado nas estatísticas da forma como as palavras são utilizadas em conjunto. Por isso, pode contribuir para alargar a conversa que os linguistas estão a ter.
Bradley espera que a sua investigação nos possa levar a uma compreensão mais profunda da própria matemática. Perceber o fenómeno da linguagem, pode ajudar-nos a compreender melhor o mundo que nos rodeia.
“Talvez estudar a linguagem desta forma nos ajude a descobrir uma estrutura matemática que ainda não conhecemos. Isto está sempre a acontecer na matemática. Os matemáticos deparam-se com coisas que ainda não têm nome, estruturas que estão à mão de semear”, disse a investigadora.
“Penso que, dentro de cinco anos, poderemos ter novas ideias matemáticas inspiradas na linguagem”, apontou.