Durante décadas, o mistério do exército de Terracota intrigou os cientistas, devido ao seu incrível estado de conservação. Mas, ao contrário do que os especialistas pensavam, as armas foram preservadas por acidente devido às condições naturais do solo em que o monumento foi edificado.
Desde a sua descoberta, na década de 1970, os cientistas acreditavam que as armas de bronze dos guerreiros de Terracota estavam em bom estado de conservação porque eram cromadas, o que sugeria que poderiam ter sido propositadamente assim projetadas para prevenir e resistir ao avanço da ferrugem.
O trabalho científico pioneiro realizado por especialistas chineses no final dos anos 1970 e início dos anos 80 foi rigoroso e convincente, e apontava nesse sentido.
Os resultados foram surpreendentes, mas a arqueologia é cheia de surpresas fascinantes — e a possibilidade de uma antiga tecnologia anti-ferrugem baseada em cromo parecia plausível.
Mas, em 2019, um estudo realizado por uma equipa internacional de invetigadores deitou esta teoria por terra.
“Sempre ficámos fascinados com a possibilidade de os artesãos de Qin terem usado alguma forma de tecnologia super avançada para preservar as suas armas na vida após a morte”, explicou o arqueólogo Marcos Martinon-Torres, investigador da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, à Newsweek.
O estudo, cujos resultados foram publicados na Scientific Reports, analisou quase 500 armas encontradas no sítio arqueológico — e, inesperadamente, concluiu que a sua preservação é resultado do acaso.
A equipa de investigadores descobriu que o crómio — que sustentava a teoria que defendia que os artesãos tinham criado uma tecnologia anti-corrosão — estava presente em apenas 37 das 500 (8%) das armas analisadas.
Contudo, esta não é a maior incongruência: além de serem poucas as armas com este elemento, a distribuição do material não é uniforme, tal como seria de esperar num revestimento protetor para armas.
As maiores concentrações de crómio foram encontradas nas alças de lanças e espadas e no cabo das bestas. Em sentido oposto, não há quase nenhum crómio nos parafusos dos gatilhos e nas pontas das flechas e nenhum vestígio nas lâminas de espadas, lanças e alabardas, que são das armas mais bem preservadas.
“O crómio presente no bronze não foi lá colocado deliberadamente“, explicou Martinón ao El País. “O que resta saber é se o crómio ajudou a evitar a corrosão, ainda que acidentalmente. A questão fica no ar”.
O segredo está na terra
Descartada a opção da tecnologia anti-ferrugem, os cientistas apontam, em linha com algumas outras teorias já existentes, que a conservação do exército se deveu às condições ambientais do local onde o monumento foi construído, aliadas à composição do bronze. O fator ambiente incluiu a composição do solo.
Este é um “terreno particular, mas não específico do poço de Terracota”, explicou Martinón, primeiro autor do estudo científico.
Apesar de não ser específico deste monumento, o solo – que tem um pH relativamente alto e um grão fino – dificulta a infiltração de água e de ar, podendo dificultar os processos de oxidação.
“É o que acontece no túmulo do guerreiro, mas também noutros locais da região onde o bronze restaurado está num estado de conservação muito bom”, concluiu.
“Mais do que determiná-las, as condições do solo influenciam as possibilidades de conservação”, adiantou o especialista de solos Mark Kibblewhite, que não participou no estudo, em declarações ao diário espanhol.
Apesar da descoberta, Martinon-Torres considera que o facto de o chineses não terem desenvolvido uma tecnologia avançada anti-ferrugem não é uma desilusão.
“Há muitos outros elementos do Exército de Terracota que ilustram a extraordinária habilidade e engenhosidade dos artesãos de Qin, e a conclusão um tanto prosaica desta vertente de investigação em particular não deve ser vista como uma deceção“, defendeu.
Composto por 8.000 soldados, 130 carros, 520 cavalos e 150 cavaleiros, o exército de Terracota, datado entre 210 e 209 a.C., foi construído para Qin Shi Huang, o fundador da dinastia Qin e primeiro imperador de uma China unificada.
A procura incessante pelo “elixir da vida” levou à morte do imperador chinês — que levou consigo para o além o seu exército de Terracota.