Mas não se preocupe: a ideia não é alimentar diretamente as pessoas com plástico. Passa, sim, por utilizar micróbios comedores de plástico como fonte de alimento.
O que muitos consideram impossível pode, na verdade, ser viável. Um grupo de cientistas está a explorar o potencial de transformação de resíduos de plástico em alimentos para os seres humanos, tirando partido do poder dos micróbios.
Com o objetivo de desenvolver um sistema capaz de converter resíduos plásticos, como embalagens de alimentos e garrafas de água, em produtos utilizáveis, como combustível ou mesmo rações, a Defense Advanced Research Projects Agency (DARPA) financiou três grupos de investigação.
Perante a crise global da poluição, o projeto da DARPA procura uma solução radicalmente diferente de todas as outras: utilizar os resíduos de plástico como recurso para criar alimentos.
Mas não se preocupe: a ideia central por detrás da investigação não é alimentar diretamente as pessoas com plástico. Passa, sim, por utilizar micróbios comedores de plástico como fonte de alimento.
O processo envolve a decomposição dos materiais plásticos nos seus componentes básicos, que são depois consumidos por bactérias especialmente selecionadas. Estas bactérias, depois de digerirem o plástico, são transformadas num pó comestível rico em gorduras, hidratos de carbono e proteínas.
O sistema da Michigan Tech começa por triturar mecanicamente o plástico em pequenos pedaços, que são depois sujeitos a uma série de reações químicas.
Diferentes tipos de plásticos requerem tratamentos diferentes; por exemplo, o polietileno e o polipropileno, habitualmente utilizados em embalagens de alimentos, são decompostos em condições de calor elevado e pouco oxigénio. Os compostos resultantes podem ser reciclados em combustíveis e lubrificantes.
Uma das etapas críticas do processo consiste em alimentar uma colónia de micróbios com o plástico decomposto.
Curiosamente, a equipa do microbiologista Stephen Techtmann, que lidera uma das três investigações financiadas pela DARPA, descobriu que as bactérias das pilhas de composto, que decompõem naturalmente os materiais vegetais, eram eficazes na decomposição do plástico desconstruído devido às semelhanças moleculares entre os dois.
Depois de consumirem o plástico, os micróbios são secos e transformados num pó com uma textura e um cheiro que lembram a levedura nutricional.
Um conceito com mais de 60 anos
O conceito de utilização de micróbios como fonte de alimento não é propriamente novo: algumas investigações remontam há pelo menos 60 anos.
No entanto, a ideia de alimentar os seres humanos com micróbios que se alimentam de plástico é uma abordagem inovadora que pode ajudar a resolver o problema dos resíduos de plástico e da escassez de alimentos.
Os micróbios oferecem várias vantagens como fonte de alimento, incluindo um elevado teor de proteínas e a capacidade de serem produzidos com menos terra e água em comparação com a agricultura tradicional, o que os torna uma opção potencialmente sustentável para alimentar uma população global em crescimento.
Os desafios que persistem
Apesar dos progressos, continuam a existir desafios. Um deles é garantir que os micróbios são seguros para consumo humano.
Atualmente, a equipa de Techtmann está, segundo o Undark, a realizar testes de toxicidade e planeia apresentar os seus resultados à Food and Drug Administration (FDA) dos EUA para análise.
Os primeiros testes em lombrigas e ratos não revelaram efeitos adversos, mas são necessários mais testes antes de o produto poder ser considerado seguro para os seres humanos.
Outro desafio de longa data é a perceção pública de comer alimentos derivados de resíduos de plástico. O “fator enjoo” continua ser uma barreira, especialmente em cenários quotidianos. No entanto, Techtmann acredita que em situações extremas, como em bases militares ou em zonas de catástrofe, a necessidade de sobrevivência pode ultrapassar estas preocupações.