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“O Grito” de Munch foi atacado por três ativistas. Só um vidro o salvou

WebMuseum at ibiblio / Wikimedia

“O Grito” (1893), de Edvard Munch

Três ativistas de um grupo ambientalista foram detidas hoje depois de atirarem cola ao quadro “O Grito”, de Edvard Munch, no Museu Nacional de Oslo, em protesto contra a atividade petrolífera da Noruega.

A polícia norueguesa, na sua página no Twitter, informa que os seguranças do museu detiveram as jovens e alertaram os agentes de autoridade depois de estas terem atirado cola sobre o quadro, que não ficou danificado já que se encontra numa caixa de vidro. A caixa foi, contudo, afetada.

Duas das ativistas agarraram-se ao quadro enquanto a terceira filmava a cena, gritando “Não haverá grito enquanto as pessoas morrerem” e “Não haverá grito quando os políticos ignorarem a ciência”, informou a agência noticiosa NTB.

As jovens mulheres pertencem ao grupo ambientalista Stopp Oljetinga (Stop Oil Activity), que, numa declaração, disse que a ação das ativistas se destinava a alertar as pessoas e a pressionar o governo norueguês para que este mude a política já que é o maior exportador de petróleo e gás da Europa Ocidental.

Uma porta-voz do grupo disse à emissora pública de televisão NRK que escolheram a obra mais famosa de Munch, uma pintura expressionista icónica, para chamar a atenção para ela-mesma, sem intenção de a danificar.

A ação decorreu no mesmo dia em que o Conselho Internacional de Museus publicou uma mensagem alertando para o perigo que estas ações impõem às obras de arte, sem esquecer as ameaças que “as mudanças climáticas” também “representam para o património cultural”, e na mesma semana em que representantes de cerca de 100 instituições museológicas de todo o mundo sublinharam a fragilidade das peças à sua guarda.

A ministra norueguesa da Cultura, Anette Trettebergstuen, reagiu ao incidente considerando que “esta é uma forma de ação inaceitável”: “Enquanto muitos de nós apoiamos a luta climática como uma das mais importantes lutas do nosso tempo, atacar a arte sem preço não ajuda em nada a causa”.

Ações semelhantes foram realizadas por grupos de ativistas contra as alterações climáticas em todo o mundo nas últimas semanas, que visaram uma pintura de Claude Monet, num museu perto de Berlim, “Girassóis” de Van Gogh em Londres, as “Majas” de Goya, em Madrid, e o “Massacre na Coreia”, de Pablo Picasso, em exposição em Melbourne, na Austrália.

Obras de Andy Wharol e Botticelli, e o icónico “Rapariga com Brinco de Pérola“, de Vermeer, foram também alvo de ações de protesto.

Numa declaração conjunta, representantes de perto de 100 instituições de todo o mundo, incluindo o Museu Guggenheim de Nova York, o Museu Britânico de Londres e o Museu do Louvre de Paris, alertaram esta semana para os riscos provocados por esses protestos climáticos a obras de arte de valor inestimável.

“Nas últimas semanas, houve vários ataques a obras de arte em coleções de museus internacionais. Os ativistas responsáveis pelas ações subestimam severamente a fragilidade desses objetos insubstituíveis, que devem ser preservados como parte de nosso património cultural mundial”, escreverem os representantes de museus e galerias de arte, citados hoje pelo jornal The Washington Post.

Também o grupo de 92 representantes ICOM, numa mensagem publicada hoje no seu ‘site’, declara que os diretores dos museus estão cada vez mais “frustrados” e “profundamente abalados” pelo perigo que estas ações impõem à arte.

Também os diretores de museus portugueses estão preocupados com a possibilidade de este tipo de ataques, que tem acontecido no norte da Europa, chegue a Portugal, tendo intensificado a vigilância do património cultural à sua guarda.

Em causa está “a própria natureza democrática” dos museus, que trouxeram a arte para o espaço público, e a tornaram “propriedade coletiva dos cidadãos”, como sublinharam, nesse trabalho divulgado pela agência Lusa.

Em resposta à declaração coordenada esta semana dos museus, sobre o risco imposto às obras, um porta-voz do grupo de ação climática do Reino Unido Just Stop Oil – que, entre outras ações, atirara sopa de tomate ao quadro “Girassóis” – disse hoje ao Washington Post que “a arte e as galerias públicas são também lugares de contestação”.

Acabar com o novo petróleo e gás é uma luta que precisa ser feita dentro e fora das galerias”, sustenta a organização.

Após as recentes ações de ativismo climático em museus, o ICOM reconheceu e partilhou “as preocupações expressas pelos museus em relação à segurança das coleções e as preocupações dos ativistas climáticos diante de uma catástrofe ambiental que ameaça a vida na Terra”.

“O ICOM vê a escolha dos museus como pano de fundo para esses protestos climáticos como um testemunho de seu poder simbólico e relevância nas discussões em torno da emergência climática”, lê-se na declaração do ICOM.

A organização relembra “o papel dos museus como atores-chave no início e apoio à ação climática com suas comunidades” e elogia o compromisso com esta missão, demonstrada através de programas educacionais, exposições dedicadas, divulgação comunitária e pesquisa.

O ICOM chama a atenção para o impacto que essas manifestações podem ter no trabalho de profissionais e voluntários de museus que se esforçam na promoção e proteção dos “valiosos bens do património para usufruto público”.

“Para alcançar todo o potencial transformador que os museus têm para o desenvolvimento sustentável”, o ICOM deseja que os museus sejam vistos como aliados na resposta à ameaça comum das mudanças climáticas, lê-se ainda na declaração.

Enquanto líderes políticos e da sociedade civil se reúnem em Sharm El-Sheik para a conferência mundial do clima COP27, o ICOM “lembra a necessidade de uma ação corajosa para reduzir as emissões de carbono e mitigar o aquecimento global.

As mudanças climáticas representam uma ameaça crescente para o património cultural, tangível e intangível, museus e suas coleções – de desastres naturais a crescentes dificuldades em manter as condições de conservação devido ao clima extremo”, conclui.

ZAP // Lusa

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