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Marisa Matias assumiu-se como “a candidatura da esquerda”. Vitorino Silva explicou “a presa do dinheiro”

Tino de Rans / Facebook

Marisa Matias e Vitorino Silva antes do debate para as Eleições Presidenciais 2021 na RTP3.

O confronto entre Marisa Matias e Vitorino Silva foi pouco debate. Os dois candidatos às eleições presidenciais 2021 divergiram pouco e até trocaram elogios com a eurodeputada a assumir-se como “a candidatura da esquerda” e o calceteiro a salientar que é a “esquerda às direitas”.

O debate na RTP3, moderado pelo jornalista Carlos Daniel, não teve grandes momentos de divergência e Marisa Matias até fez questão de sublinhar, já na parte final, que tem “muito respeito pela trajectória e pelo que tem feito o Vitorino Silva“.

Antes disso, já o candidato de Rans, pequena freguesia do concelho de Penafiel, tinha dito à candidata que estava a ir “muito bem” num momento em que ela falava.

A terceira mais votada nas eleições de 2015 também elogiou a RTP por ter permitido debates com Vitorino Silva, considerando que “é muito importante que os candidatos possam debater todos em condições de igualdade”. O sexto mais votado nas eleições passadas ripostou que são debates na “porta dos fundos”, na RTP3.

Desprezo mútuo pelas sondagens

Vitorino Silva amealhou 152 mil votos em 2015 e o objectivo para estas eleições é ter “mais um voto”.

“Há cinco anos, nesta altura, não tinha um frame de televisão“, considerou o calceteiro, frisando que por esta altura, já tem “duas agendas” para marcar compromissos e que não consegue “atender todos os jornalistas” que antes “estavam distraídos” e não queriam saber dele.

Vitorino Silva também lançou dúvidas sobre as sondagens, apontando que “a única que é verdadeira é o voto do povo”.

“Nunca apareci nas sondagens e na última em que apareci, puseram que eu não tinha votos no Porto, onde eu arranjei 7 mil assinaturas”, salientou, sublinhando que a cidade Invicta é o seu “bastião”.

Por isso, concluiu que não acredita em “nenhuma sondagem”.

Da mesma forma, a candidata apoiada pelo Bloco de Esquerda (BE) desvalorizou as sondagens e lembrou que “há cinco anos, nesta altura, tinha até resultados inferiores aos que aparecem neste momento”, sublinhando que estava atrás de Maria de Belém e que acabou por ficar à frente da candidata independente, apesar das ligações ao PS.

“A candidatura da esquerda”

Durante o debate na RTP3, Marisa Matias quis salientar que não há “um excesso de candidaturas à esquerda”, mas antes “um défice”.

“Se calhar, até temos um problema com a demissão do partido do Governo em não ter avançado para estas eleições”, destacou numa crítica ao PS.

Marisa Matias não duvida que é ela a verdadeira “candidatura da esquerda”, a única que “pode impedir os bloqueios” que se têm verificado na Presidência da República e a que apresenta “melhores condições”, “com apoios que vão muito para além do BE”.

Vitorino Silva reforçou que a sua candidatura é da “esquerda, mas às direitas”.

Marisa Matias apresentou-se no debate como uma candidata que pretende “trazer uma resposta à crise“, defendendo que na Presidência da República deve estar “alguém que impeça os bloqueios que temos tido em tantas áreas, como saúde, trabalho e as questões relacionadas com o sistema bancário” e que “não será com a dupla Marcelo Rebelo de Sousa/António Costa que esses bloqueios” serão resolvidos.

Num tom de discurso que soou muito à linha do BE, Marisa Matias acusou o Presidente da República de ter sido “um bloqueio a entendimentos de esquerda que eram importantes”, citando “questões relacionadas com o Banif e o Novo Banco” e a “questão laboral”.

Marisa Matias referiu que Marcelo Rebelo de Sousa “se aliou mais às entidades patronais do que aos trabalhadores” e que fez “um acordo para tornar ainda mais precárias as condições de já tantos precários, nomeadamente com a questão do período experimental”.

Deste modo, a eurodeputada referiu que o mandato de Marcelo foi “mais negativo do que positivo”.

Quando Marcelo não precisar do PS, “Costa tem dias contados”

Também Vitorino Silva deixou críticas a Marcelo Rebelo de Sousa, apontando que “fez coisas muito bem” e que “noutras, esteve distraído“.

O candidato de Rans realçou que Marcelo se caracteriza pela “inteligência e a esperteza”, mas que “às vezes, pôs a esperteza à frente da inteligência” e “a inteligência tem de ser o tempero”, concluiu.

Vitorino Silva disse ainda que o Presidente da República, “às vezes, apalhaçou as funções de Estado”, uma ideia que diz ter-lhe sido transmitida por outras pessoas “do povo”.

O calceteiro também destacou o caso Tancos, considerando que tem “a certeza” de que Marcelo Rebelo de Sousa “sabia tudo o que se passava” enquanto “comandante supremo das Forças Armadas”.

Sobre o facto de o PS não ter apresentado um candidato próprio às presidenciais, Vitorino Silva constatou que “António Costa sabe que precisava do Marcelo e o Marcelo precisava do António Costa para apanhar o filão” socialista.

“Marcelo e o Governo embalaram-se um ao outro” para manterem o poder, apontou.

Mas “se o PS votar em massa no Marcelo e o Marcelo tiver 70%, a primeira pessoa a ser posta de lado vai ser o António Costa, porque [o Presidente da República] nunca mais vai precisar” do primeiro-ministro, vaticinou também Vitorino Silva.

“A partir do momento em que Marcelo não precise do PS, Costa tem os dias contados“, acrescentou.

Marisa não se livra dos dilemas do Bloco

Depois de ter sido confrontada por Ana Gomes com o chumbo do BE ao Orçamento de Estado para 2021 durante o debate anterior, Marisa Matias foi novamente encostada à parede com um dos dilemas que, actualmente, perturbam a vida do Bloco.

Desta feita, o jornalista Carlos Daniel questionou Marisa Matias sobre a sua posição quanto ao Fundo de Resiliência aprovado pela União Europeia (UE) e a mega-campanha de vacinação que está em marcha, depois de Catarina Martins ter revelado muito cepticismo quanto à resposta europeia à crise pandémica.

No caso do Plano de Vacinação, “houve um esforço de cooperação notável” que permitiu “desbloquear recursos e definir uma política importante em tempo recorde”, disse a eurodeputada, frisando que trabalhou numa das comissões do Parlamento Europeu nessa área.

Este “é um dos bons exemplos da cooperação europeia nesta crise pandémica”, considerou, mas realçou que é preciso saber se “a propriedade dessa vacina vai ser nossa ou não”.

Quanto à bazuca europeia, Marisa Matias notou que os “montantes não são suficientes” e que esta começou por ser composta “praticamente toda por subvenções” para depois passar a ser “praticamente toda instrumento de dívida”. Além disso, “esteve sujeita a um aumento das transferências para os países que já recebem mais, como a Alemanha”, considerou, notando que “foi a condição” para a bazuca ser aprovada.

Assim, Marisa Matias concluiu que “ainda está por provar” se as medidas serão as adequadas.

“Imaginem a presa do dinheiro…”

Do outro lado, Vitorino Silva lembrou que “vieram sempre carradas e carradas de dinheiro” da UE e que, apesar disso, continuam os problemas como o facto de “haver 700 mil pessoas sem médico de família“.

O candidato de Rans citou o exemplo do Hospital de Penafiel que serve 500 mil pessoas, incluindo “pessoas da terra da avó do Marcelo”, de Celorico de Basto, e que “não tem uma ressonância magnética”.

Assim, Vitorino Silva disse que “o importante é saber onde [é que o dinheiro] vai chegar”.

Imaginem a presa do dinheiro, depois há muitos campos à volta; quem abre a presa, para onde é que o dinheiro vai logo? Vai para os campos mais perto da presa. Os campos que apanham a água são ao pé da porta e nós temos que pôr os campos longe da porta, perto da presa e é isso que nestes 40 anos não se fez”, apontou.

Na fase final do debate, Vitorino Silva constatou que “os políticos aprofundam muito o que não tem sentido” e que, “às vezes, é conversa demais e de menos acção“. “Debate-se muito e faz-se pouco”, atirou ainda.

Em jeito de mote para o que o move, o calceteiro que se assume como “a voz do povo” referiu que “em 900 anos de história, o povo sempre foi figurante, nunca foi papel principal. “Porque não termos o povo a presidente? Se foi possível ter um Papa e um Secretário-geral da ONU [portugueses], é possível o povo subir à varanda”, concluiu.

Marisa Matias aproveitou a dica para perguntar “e porque não uma mulher do povo?

Susana Valente, ZAP //

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