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Novas pistas podem indicar o paradeiro de milhares de bebés desaparecidos em 1948

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Nos anos após a criação do Estado de Israel, em 1948, centenas de bebés desapareceram. Aos pais, a maioria imigrantes judeus do Iémen, foi dito apenas que os seus filhos tinham “morrido”. No entanto, existem suspeitas de que as crianças foram entregues de forma secreta a famílias sem filhos – e documentos recentemente encontrados podem revelar provas perturbadoras.

Há mais de 50 anos atrás, Leah Aharoni deu à luz gémeas prematuras num hospital perto da sua casa, em Kiryat Ekron, no centro de Israel, mas as crianças foram levadas para outro lugar para receberem cuidados especiais.

A mãe soube que as meninas tinham sido transferidas para uma clínica em Tel Aviv mas, quando seu marido foi visitá-las pouco tempo depois, só encontrou uma das bebés e disseram-lhe que a sua outra filha, Hanna, tinha morrido.

Leah ficou chocada por não ter tido a oportunidade de ver o corpo da bebé nem de enterrar a filha mas, tal como o marido, acreditou na notícia horrível que tinha recebido.

No entanto, alguns anos depois, a mulher começou questionar sobre o que realmente poderia ter acontecido. Quando a sua filha sobrevivente, Hagit, fez 18 anos e foi convocada para o serviço militar, foram colocados dois avisos na caixa de correio – um para Hagit, outro para Hanna.

“Não fazia sentido. Eu já não conseguia dormir à noite e decidi que precisava de saber o que é que tinha realmente acontecido”, disse Leah.

Quando era criança, Leah e a sua família juntaram-se a milhares de judeus que fugiram da violência no Iémen. Foram roubados e passaram fome enquanto fugiam mas, algum tempo depois, foram resgatados numa operação aérea conhecida como Tapete Mágico, em que 49 mil judeus iemenitas foram levados para Israel.

“Era a terra que eu sempre sonhei. Depois, ouvimos as bombas e granadas e vimos todo aquele fumo”, afirmou.

Os judeus tinham chegado a Israel desnutridos e sem dinheiro, durante a primeira guerra entre árabes e israelitas. Nessa altura, muitos deles passaram longos períodos em acampamentos temporários antes de irem morar para casas em Israel, e as histórias de bebés desaparecidos começaram a aumentar imediatamente.

Alguns relatos são de crianças que desapareceram após visitas de judeus americanos ricos ao acampamento. Em outros casos, os pais das crianças que estavam no hospital recebiam, de repente, a notícia de que os filhos tinham morrido.

Em muitos casos, os pais acreditam que os seus filhos tenham realmente sido raptados e vendidos a famílias de judeus europeus – eventualmente até a sobreviventes do Holocausto que tinham perdido os seus filhos – ou a americanos.

Ao longo do tempo, Leah, tal como muitos outros pais, parou de acreditar na história da morte da sua filha. “Falei com o meu pai sobre isso, mas ele disse que eu nem sequer devia suspeitar que outro judeu tinha raptado a minha bebé”, afirmou.

Assim, a mulher decidiu procurar documentos que revelássem a verdade sobre o que aconteceu com a sua filha, e ficou extremamente preocupada com o que encontrou. Um dos ficheiros dizia que os bebés se tinham mudado para Tel Aviv depois da data que constava no certificado de morte de Hanna, e outro era um segundo certificado de morte, com data de três anos depois daquela que tinham revelado a Leah.

Foram instaurados três inquéritos governamentais para apurar os casos das crianças desaparecidas desde 1960 e todos concluíram que a maior parte delas morreu devido a doenças e foi enterrada sem que os seus pais tenham sido informados.

Mas várias famílias acreditava que existia uma operação organizada para levar as crianças, que envolvia profissionais de saúde e do governo. Por isso, no ano passado, o governo israelita decidiu abrir a maioria dos arquivos dos inquéritos e publicá-los online. O primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, disse que isso “marca uma nova era de transparência e pode corrigir um erro histórico”.

Experiências médicas

Na semana passada, foram reveladas informações impressionantes sobre experiências médicos que terão sido realizadas com crianças iemenitas. O testemunho, dado sob juramento num dos inquéritos anteriores, revelou que quatro bebés subnutridos morreram após receberem uma injeção de proteína experimental e que muitas outras crianças morreram por negligência médica.

Segundo exames realizados a cadáveres de crianças, os especialistas concluíram que, em alguns casos, o coração foi removido por médicos norte-americanos.

“É um grande escândalo que os médicos não tenham dito nada aos pais, que não tenham dito que estavam a realizar experiências com os seus filhos”, afirmou o advogado israelita Nurit Koren.

“E o pior é que vários bebés saudáveis morreram em consequência dos tratamentos experimentais. Isso é crime, foi propositado e levou à morte das crianças”, adiantou.

Se houve ou não uma conspiração para tirar os bebés iemenitas aos seus pais e entregá-los para adoção, isso ainda não ficou comprovado, segundo o historiador Tom Segev, que escreveu livros sobre Israel.

“Várias pessoas vieram para Israel em condições muito complicadas, e é uma história caótica. Moravam em tendas e tiveram que enfrentar invernos gelados. Havia uma taxa de mortalidade infantil de 50% na época”, destacou.

Segev reconhece, no entanto, que algumas crianças devem realmente ter sido entregues a outras famílias. “Em alguns casos, isso pode ter acontecido uma, duas, três, quatro, dez vezes”, disse o historiador, sublinhando que, “na maioria dos casos, as crianças terão morrido”.

ZAP // BBC

 

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