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Uma língua perdida foi redescoberta na capital do Império Hitita

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Os portões do Leão em Hatusa

30 mil tabletes de argila depois, foi desenterrada uma língua nunca antes vista em Hatusa, no centro-norte da atual Turquia. Mais de três mil anos depois, os organizados Hititas continuam a dar-nos presentes.

É uma descoberta surpreendente. Registada em tabletes de argila cuneiformes entre as antigas ruínas de Boğazköy-Hattusha — a antiga capital do Império Hitita, mais conhecida como Hatusa, localizada no centro-norte da Turquia — a língua há muito perdida foi desenterrada nas ruínas Hititas por arqueólogos da Universidade de Würzburgo, na Alemanha.

Os Hititas, um grupo Indo-Europeu, estabeleceram-se na Anatólia — a península da Turquia moderna — e formaram um dominante e temido império durante a Idade do Bronze Tardia, entre 1650 e 1200 a.C.

Desde a década de 1980 já foram descobertas quase 30 mil tabletes de argila no local que guarda um meticuloso registo de informações valiosas para compreender a civilização Hitita, famosa pela sua proeza militar.

Até muito recentemente, acreditava-se que as tabletes eram exclusivamente escritos na língua hitita, mas novas pesquisas identificara uma língua nunca antes vista.

Embora ainda não tenha sido totalmente decifrada, a língua parece ser nativa da região de Kalašma, situada nos limites noroeste do coração hitita e apresenta notáveis semelhanças com o luwiano, outra língua historicamente falada dentro do império.

As tabletes que contêm a misteriosa língua descrevem um antigo ritual cultural praticado em Kalašma, acreditam os investigadores.

“Os Hititas estavam interessados em registar rituais em línguas estrangeiras”, afirma, em comunicado, o perito do antigo Oriente Próximo, Daniel Schwemer.

Posteriormente, análises mais profundas indicaram que a língua misteriosa pertence à família Indo-Europeia — um grupo de línguas amplamente faladas na Europa, no planalto iraniano e no norte da Índia que abrange várias outras línguas, desde o hindi e persa até ao russo e inglês. Uma das poucas exceções na Europa, como lembra o IFL Science, é o basco, uma língua não Indo-Europeia falada no País Basco, entre França e Espanha.

Um local cheio de história

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Hatusa, capital do império Hitita

A língua hitita é uma das mais antigas línguas indo-europeias conhecidas e o seu sistema de escrita era baseado em caracteres cuneiformes.

O império chegou ao seu auge sob o governo de reis como Suppiluliuma I e Muwatalli II, estendendo-se até partes do Oriente Médio e batendo-se com potências como a Mesopotâmia e Egito, com quem assinaram um dos mais antigos tratados de paz de que se tem registo, o Tratado de Kadesh.

A sociedade hitita era complexa e organizada, com uma administração centralizada e um sistema legal bem estruturado. Era politeísta e conhecida pela sua contribuição à metalurgia, particularmente no trabalho com ferro e bronze mas, claro está, também se destacaram na arte da guerra, sendo um dos primeiros povos a usar carros de combate de forma eficaz.

O império entraria em declínio após uma série de invasões e crises internas que culminaram na sua desintegração, por volta de 1180 a.C, mas o legado hitita perdura em várias facetas da história e da cultura do Médio Oriente, e a nova descoberta comprova-o.

Reconhecido como Património Mundial da UNESCO desde 1986, o local é há muito apreciado pela sua arquitetura urbana e arte bem preservadas.

A nova descoberta veio fomentar o fascínio de académicos e entusiastas da linguística e da região, uma vez que abre novas vias para compreender a diversidade e complexidade histórica do antigo Oriente Próximo, que compreende a região da Ásia próxima ao mar Mediterrâneo, países como a Síria, Líbano, Israel, Palestina e Iraque.

Tomás Guimarães, ZAP //

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