Não, a desigualdade nunca foi inevitável

Linda Nicholas e Gary Feinman

Os investigadores dirigem as escavações na residência Plataforma 11 em El Palmillo, México

Em todas as civilizações da história da humanidade houve desigualdade? Sim. As desigualdades sempre foram inevitáveis? Não, sempre estiveram sob o controlo das sociedades.

Este podia ser um artigo de filosofia, sociologia ou até mesmo psicologia. Mas a prova de que a desigualdade nunca foi inevitável está na arqueologia.

Um novo estudo, que incidiu em 1000 civilizações de todo o mundo durante 10.000 anos (desde o Pleistoceno tardio até ao início do colonialismo europeu), revelou que a desigualdade social não é inevitável, mas sim uma consequência de escolhas políticas.

Na análise a 50.000 casas, cujos resultados foram publicados na semana passada na PNAS, os arqueólogos descobriram que, embora a desigualdade social tenda a aumentar com a população, essa tendência nunca é garantida.

Como enumera a Live Science, desde os luxuosos túmulos dos faraós egípcios a tesouros esquecidos e até sacrifícios de crianças, os vestígios da desigualdade social podem ser encontrados em todo o lado ao longo da história.

A narrativa convencional sustenta que a desigualdade foi incorporada nas nossas sociedades assim que os humanos começaram a praticar a agricultura, permitindo às elites ricas acumular excedentes produzidos pelos trabalhadores agrícolas. No entanto, outros estudos sugerem que esta versão é demasiado simplista.

Para traçar o aumento das diferenças de riqueza entre as classes sociais, os arqueólogos começaram a desenvolver medidas quantitativas das estruturas sociais em diferentes sítios, para que os dados possam ser comparados entre geografias e épocas.

Uma medida comum nas sociedades modernas é o coeficiente de Gini – um número entre 0 e 1, em que 0 representa a igualdade perfeita (todos têm a mesma riqueza) e 1 a desigualdade perfeita (um indivíduo tem tudo). Por exemplo, segundo o Banco Mundial, os Estados Unidos têm um coeficiente de Gini de cerca de 0,41 e a Noruega de 0,27.

No novo estudo, foram analisadas 50.000 casas em 1.000 povoações da Mesoamérica, América do Norte, Europa e Ásia que foram construídas entre o final da época do Pleistoceno (há cerca de 12.000 anos) e o século XV.

Utilizando a variabilidade das dimensões das casas nestas povoações como um indicador aproximado da riqueza, os arqueólogos calcularam um coeficiente de Gini para cada local.

Em seguida, fizeram uma análise estatística que comparou os valores de Gini com a complexidade política de cada sociedade.

Ao comparar as tendências dos valores de Gini com as estruturas governamentais, os investigadores chegaram a uma conclusão simples: a desigualdade histórica não aumenta naturalmente à medida que as populações crescem e os governos se tornam mais complexos.

Em vez disso, as escolhas que as sociedades humanas fizeram sobre a forma de distribuir a riqueza foram fundamentais para manter as disparidades sociais sob controlo.

“Se a desigualdade era [previamente] considerada natural ou inevitável, quaisquer esforços para mitigá-la ou controlá-la provavelmente eram desencorajados“, explicou à Live Science o autor principal do estudo, Gary Feinman, professor de arqueologia e Curador MacArthur de Antropologia Mesoamericana, da América Central e do Leste Asiático no Field Museum em Chicago.

“Nunca aderi às afirmações ideológicas de que a desigualdade é inevitável ou natural – ideias que esperamos que não voltem a surgir depois deste estudo coletivo”, expressou o líder da investigação.

Miguel Esteves, ZAP //

Deixe o seu comentário

Your email address will not be published.