No bairro da Mouraria, em Lisboa, há um cabeleireiro criado a pensar naqueles que passam mais dificuldades, para aumentar autoestimas e dar dois dedos de conversa, onde cada um paga o que pode, e quem não pode não paga.
Num espaço da Associação Renovar a Mouraria, onde semanalmente crianças daquele bairro recebem apoio ao estudo, foi improvisado um cabeleireiro, que funciona às quartas-feiras das 10:00 às 13:00.
Tudo começou com uma banca na feira do Banco do Tempo, a que nessa edição “teve mais pessoas”, a cargo de Sandra Possolo, que durante 25 anos foi cabeleireira num salão para senhoras na Baixa lisboeta.
Sandra recorda a idosa que vivia no Largo da Severa, onde a feira decorreu, “que era muito raro sair de casa”.
“Mas nós conseguimos que ela fosse à banca cortar o cabelo. Ela chegou, conversei com ela – porque nós nisto também queremos saber histórias – e a senhora quando saiu ia completamente diferente”, contou.
A autoestima “aumentou” e era notória a “necessidade de conversar”. Foi depois dessa experiência, com pessoas “sem possibilidades de ir a um cabeleireiro ‘normal'”, que Sandra Possolo propôs à associação avançar com o projeto do cabeleireiro solidário.
Em setembro, Natércia Bernardino, desempregada com dois filhos, foi a primeira cliente. Este mês regressou, algo que seria impossível caso o projeto de Sandra Possolo não tivesse aparecido. “Ia na mesma, mas de ano a ano”, disse à Lusa.
Natércia é, “dentro das pessoas que não podem”, das que deixam um donativo. E considera que o dinheiro fica “bem entregue”. “Para aquilo que eles têm feito até é pouco. Têm feito muita coisa pelo bairro”, referiu.
O filho mais novo desta moradora da Mouraria é uma das crianças que diariamente, das 16h às 20h, usufruem do apoio ao estudo na sala onde a mãe corta o cabelo.
Sandra Possolo explica que ali, além do apoio ao estudo, “por vezes há aulas de alfabetização e jantares de grupo, quando o grupo é grande e não cabe a cafetaria”.
“É uma sala multiusos”, e, por ser “a mais acolhedora”, é também ali que está instalado o cabeleireiro.
Para já, os cortes de cabelo são o único serviço prestado. Se houvesse mais condições, Sandra garante que também “pintava, fazia madeixas e permanentes”.
Os donativos irão servir “para melhorar o projeto e poder proporcionar outro tipo de trabalhos”. Mas antes de tudo para poderem comprar uma calha de lavagem. “Água temos, mas não temos a calha para o cliente pôr a cabeça para lavar. Pedimos sempre à pessoa para vir de cabeça lavada, borrifo o cabelo e corto”, explicou Sandra.
Quem quiser usufruir deste serviço deve ser morador no bairro e ligar para a associação para marcar o corte de cabelo. “Isto é para pessoas do bairro, porque somos uma associação local. Não quer dizer que se alguém do bairro ao lado vier cá eu diga que não”, disse.
Além de atender no espaço da Associação Renovar a Mouraria, Sandra Possolo também faz cortes ao domicílio, a pensar em quem não pode sair de casa. E deixa o aviso: “se houver em casa alguém que não possa às quartas e se eu tiver oportunidade noutro dia da semana também o faço”.
Às quartas-feiras, entre as 10h e as 13h, Sandra Possolo está no Beco do Rosendo como cabeleireira, “ouvinte, conversadora, e também um bocado psicóloga”.
/Lusa
Há sempre alguem a pensar no proximo.
Em Roterdão havia um pop-up restaurante com a mesma filosofia…boas ideias, boas pessoas!