Os morcegos têm uma curiosa estratégia para viajar: surfam nas frentes quentes das tempestades para voar mais longe com menos energia.
Os pássaros não são os únicos voadores de longa distância. Há morcegos que viajam milhares de quilómetros, num comportamento bastante raro e difícil de observar.
No entanto, recentemente, cientistas do Instituto Max Planck analisaram 71 morcegos noctule durante a sua migração de primavera pelo continente europeu e conseguiram desmistificar este comportamento misterioso.
Os sensores inteligentes e ultraleves acoplados nos seus corpos permitiram descobrir a estratégia usada pelos pequenos mamíferos para viajar: estes animais surfam nas frentes quentes de tempestades para voar mais longe e com menos energia.
O dispositivo de rastreamento usado neste estudo foi desenvolvido pelos engenheiros e pesa apenas 5% da massa corporal total do morcego. Segundo o EurekAlert, a pequena etiqueta inclui vários sensores que registam os níveis de atividade dos animais e a temperatura do ar à sua volta.
A tecnologia avançada permitiu ainda comprimir os dados, num total de 1440 medições diárias, numa única mensagem de 12 bytes que foi transmitida por uma nova rede de longo alcance.
“As etiquetas comunicam connosco de onde quer que os morcegos estejam porque têm cobertura em toda a Europa”, explicou o investigador Timm Wild, que liderou o desenvolvimento da etiqueta ICARUS-TinyFoxBatt.
A equipa implantou as etiquetas em noctules comuns, um morcego muito avistado na Europa e uma das quatro espécies conhecidas por migrar pelo continente. Durante toda a primavera, ao longo de três anos, os cientistas fixaram etiquetas maioritariamente em fêmeas por serem mais migratórias do que os machos.
A tecnologia revelou trajetórias muito mais variáveis do que o que os cientistas pensavam. “Não há um corredor de migração. Nós tínhamos assumido que os morcegos estavam a seguir um caminho unificado, mas agora vemos que estão a mover-se por toda a paisagem numa direção geral nordeste”, salientou a investigadora Dina Dechmann.
Após separarem os dados para distinguir voos de alimentação de uma hora dos voos migratórios muito mais longos, a equipa descobriu que os morcegos podem migrar quase 400 quilómetros numa única noite. Os seus voos migratórios eram frequentemente intercalados com paragens, provavelmente porque os animais precisavam de se alimentar.
“Ao contrário das aves migratórias, os morcegos não ganham peso durante a sua preparação para a migração. Eles precisam de reabastecer todas as noites, pelo que a sua migração tem um padrão de saltos em vez de um tiro direto”, acrescentou a especialista.
Em algumas noites, “observamos uma explosão de partidas que pareciam fogos de artifício de morcegos”, ondas de migração que podem ser explicadas por mudanças no clima.
Os animais tendiam a partir em noites em que a pressão do ar caía e a temperatura aumentava, isto é, antes das tempestades que se aproximavam. “Eles surfam em frentes de tempestade, usando o suporte de ventos quentes de cauda”, explicou Edward Hurme.
Os sensores que mediam os níveis de atividade mostraram ainda que os morcegos usavam menos energia a voar nessas noites de vento quente, o que confirma a estratégias destes pequenos mamíferos de colher energia invisível do ambiente para alimentar os seus voos continentais.
O artigo científico foi recentemente publicado na Science.