Medicamento revolucionário cura a doença do sono com uma única dose

omeuceu / Flickr

A mosca tsé-tsé, que provoca a doença do sono

Um novo medicamento de dose única para a doença do sono mostrou ser 95% eficaz na eliminação do parasita, num novo estudo clínico liderado pela iniciativa suíça Drugs for Neglected Diseases (DNDi), com parceiros na República Democrática do Congo e na Guiné.

Segundo o estudo, publicado recentemente na The Lancet Infectious Diseases, o medicamento, designado acoziborole, representa uma melhoria em relação às terapias atuais e anteriores, que podem ser longas e requerem procedimentos dolorosos e invasivos.

A doença do sono “afeta doentes em alguns dos cenários mais remotos da África Ocidental e Central, onde a distância do hospital pode ser medida em dias”, disse Victor Kande, do Ministério da Saúde da República Democrática do Congo, em comunicado, citado pelo Freethink.

“Estamos agora no pico de um potencial tratamento que pode ser dado num dia, numa única dose de três comprimidos – isto representa uma revolução para médicos e comunidades”, indicou igualmente.

A doença do sono – ou “tripanossomíase humana africana” – é causada por um parasita disseminado através da picada da mosca tsé-tsé. Pode surgir em duas formas diferentes, dependendo da subespécie do parasita.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma dessas subespécies, a Trypanosoma brucei gambiense, é responsável por mais de 95% dos casos.

Este parasita pode ficar à espera durante meses ou mesmo anos, não apresentando sintomas externos antes de se apresentar com febre, dores de cabeça, dores nas articulações e inchaço nos gânglios linfáticos.

À medida que a infeção progride, acaba por entrar no sistema nervoso central, causando perturbações no sono, alucinações, confusão, mania, convulsões, tremores e problemas sensoriais. Caso não seja tratada, a doença do sono é letal. E não há muito tempo, também o tratamento podia ser letal.

“O tratamento amplamente disponível na altura era um medicamento à base de arsénico e era tóxico”, disse à NPR Wilfried Mutombo Kalonji, líder do projeto clínico da DNDi. “O medicamento podia matar até 5% dos pacientes. Eu perdi dois dos meus pacientes. Eles eram jovens e essa foi uma experiência muito má”, contou.

O melhor medicamento não tóxico, a eflornitina, requer mais de 50 tratamentos intravenosos, com dolorosas punções lombares para avaliar a eficácia.

Outro tratamento, designado NECT, não é tóxico e requer menos doses. O fexinidazol, completamente oral, é tomado durante dez dias. Isto significa menos punções lombares e nenhuma necessidade de hospitalização, mas ainda é relativamente complicado de administrar e, para muitos, uma punção lombar é muito.

Neste recente ensaio, os autores, incluindo Mutombo e Kande, administraram acoziborole a mais de 200 pacientes com a forma mais comum de doença do sono, tanto na fase inicial como na fase final, em dez hospitais da República Democrática do Congo e da Guiné.

Após 18 meses, o medicamento foi capaz de eliminar o parasita em 198 dos 201 pacientes que terminaram o ensaio. Quanto aos três que não foram curados, “não temos a certeza se isso é realmente uma recaída ou uma reinfeção”, disse à NPR Antoine Tarral, que ajudou a desenvolver o fármaco.

Os efeitos adversos foram leves ou moderados, escreveram os investigadores, sendo a febre e o cansaço os mais comuns. Quatro mortes ocorreram durante o período do estudo, mas não foram consideradas relacionadas com o tratamento.

Os investigadores e peritos esperam que uma terapia de dose única seja muito mais acessível nas comunidades rurais, onde predomina a doença do sono.

“O que é extraordinário com este medicamento é que pode ser administrado não só nos hospitais mas também diretamente nas aldeias”, disse à NPR Jacques Pépin, um investigador já reformado da Universidade de Sherbrooke, que estudava sobre a doença do sono.

Mas Pépin ele tem algumas dúvidas sobre o ensaio, citando a falta de aleatorização e um controlo placebo, bem como o tamanho relativamente pequeno da amostra.

A verdade é que, apesar do ensaio bem sucedido, que seja necessário um par de anos, pelo menos, até que o acoziborole esteja amplamente disponível, disse Mutombo à NPR.

ZAP //

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