A Microsoft planeia comprar a Activision Blizzard por quase 70 mil milhões de dólares, o maior negócio de sempre na área dos videojogos.
De acordo com o New York Times, a Microsoft está a apostar numa população que vai passar cada vez mais tempo no mundo digital.
A aquisição da blockbuster, anunciada na terça-feira, catapultaria a empresa para um lugar de liderança na indústria de jogos de 175 mil milhões de dólares.
Os jogos, em praticamente todos os tipos de aparelhos, desde consolas a smartphones, ganharam ainda mais popularidade durante a pandemia — e as empresas tecnológicas estão de volta à indústria, a tentar cativar cada vez mais os três mil milhões de jogadores em todo o mundo.
A Activision criou alguns dos jogos mais populares de sempre, incluindo Call of Duty e o famoso Candy Crush, ominopresente nos últimos anos nos smartphones de jogadores de todos os géneros e idades.
A Blizzard Entertainment, com quem a Activision de fundiu em 2008, lançou alguns dos títulos mais icónicos de sempre no universo dos jogos MMO-RPG, como Warcraft, Starcraft, World of Warcraft, a saga Diablo e Overwatch.
Com o mega-negócio, a Microsoft parece querer reforçar a aposta no metaverso, o mundo de realidade virtual e aumentada — e juntar-lhe a carteira de massive multiplayer online games da Activision Blizzard, com destaque para WoW, parece ser um casamento perfeito.
O metaverso tem atraído enorme quantidade de atenção, investimento e talento. No final do ano passado, o Facebook mudou o nome da sua empresa para Meta, para salientar o seu compromisso. Mas o foco no metaverso desmente o significado do acordo no presente.
A aquisição ajuda a Microsoft a ganhar à sua rival rival Sony na longa batalha pelas atenções e carteiras dos jogadores, oferecendo jogos de topo.
Ajuda também a gigante de tecnologia a manter-se à frente dos poderosos concorrentes no mais recente mundo virtual, como a Amazon e o Google.
Phil Spencer, diretor executivo do negócio de jogos da Microsoft, realçou que independentemente do metaverso, “os jogos estarão na linha da frente”.
Por agora, acrescentou o dirigente, a aquisição tem como objetivo ganhar terreno nos videojogos, área na qual a Microsoft mal compete — apesar do numeroso portfolio de jogos, e de ter lançado títulos míticos como Age of Empires e Halo. Atualmente, a empresa detém o popular Minegraft, adquirido à Majong em 2014.
Spencer considera o jogo Call of Duty “um dos jogos de entretenimento mais espetaculares do planeta”.
Os reguladores federais podem levantar preocupações sobre a aquisição, uma vez que tanto os democratas como os republicanos têm pressionado a limitação do poder das gigantes da tecnologia.
Na terça-feira, o Departamento de Justiça e a Comissão Federal de Comércio americanos anunciaram um novo esforço para alargar a forma como devem determinar se os acordos são anti-concorrência.
A Microsoft está avaliada em mais de 2,3 biliões de dólares, ficando apenas atrás da Apple. A aquisição da Activision faria da Microsoft a terceira maior empresa de jogos do mundo, atrás da Tencent e da Sony — líder no mercado de consolas, onde a Microsoft está presente com a Xbox.
Nos últimos anos, a indústria de videojogos tem vindo a consolidar-se rapidamente. A força motriz por traás destas fusões, que podem vir a captar a atenção dos reguladores, é a corrida aos conteúdos exclusivos.
A Microsoft, por vezes, torna os jogos disponíveis apenas para os seus próprios dispositivos, tais como a sua consola Xbox, e indisponíveis nos aparelhos fabricados pelos concorrentes, como a PlayStation da Sony.
Quando questionado sobre se os jogos da Activision, como Call of Duty, se tornariam exclusivos da Xbox, Phil Spencer apenas respondeu que o objetivo da empresa “é permitir que o conteúdo chegue ao maior número de jogadores possível“.
A Microsoft tem procurado formas de investir o seu capital que expandam o negócio. Já tentou, inclusive, adquirir a rede social em expansão TikTok e a popular aplicação de chat Discord.
Assédio sexual e discriminação
Mas nem tudo são rosas no mundo dos jogos — e recentemente a Activision foi alvo de atenção por motivos controversos.
A empresa enfrenta acusações de assédio sexual e a discriminação, que pesaram sobre a empresa, com as suas ações a cair 27%, desde que a Califórnia a processou em julho, por causa.
Entretanto, as ações do fabricante de jogos subiram mais de 25 por cento no comércio na terça-feira, enquanto as ações da Microsoft caíram 2 por cento.
A compra pode ser vista como uma vitória para Bobby Kotick, chefe executivo de longa data da Activision, que alguns críticos consideram uma figura controversa.
Kotick negociou um grande prémio para os investidores, com a Microsoft a pagar 95 dólares por ação, aproximadamente 45 por cento acima do preço das ações da sua empresa antes do anúncio, embora apenas ligeiramente mais do que o preço de negociação, antes de o escândalo rebentar.
O dirigente permanecerá no seu papel até que o negócio esteja concluído. Depois, a expectativa é que se demita do cargo de chefe executivo, embora possa ainda desempenhar um papel consultivo, de acordo com duas fontes, que pediram anonimato, por serem próximas a Kotick.
A controvérsia na Activision começou no verão passado, quando uma agência de emprego da Califórnia processou a empresa por promover uma cultura tóxica no local de trabalho, na qual as mulheres eram assediadas sexualmente e discriminadas.
Nos meses seguintes, os empregados realizaram protestos, lançaram campanhas nos meios de comunicação social e apelaram à demissão de executivos.
Alguns dos principais líderes da Activision demitiram-se, incluindo J. Allen Brack, chefe da filial da Blizzard Entertainment. A empresa prometeu 250 milhões de dólares para aumentar a diversidade de empregados e afirmou que iria reforçar as políticas anti-assédio.
Mas quando o The Wall Street Journal noticiou em novembro que Kotick tinha conhecimento há anos das acusações contra as funcionárias e, em alguns casos, não tinha tomado medidas, os apelos à sua demissão apenas aumentaram.
Fazer um acordo com a Activision é algo de muito importante para a Microsoft, que ainda em novembro estava a questionar a cultura da empresa.
Num e-mail enviado aos funcionários da Xbox, anteriormente relatado pela Bloomberg e confirmado pela empresa, Spencer escreveu que estava “profundamente perturbado com os horríveis acontecimentos e queda das ações” da Activision.
Na terça-feira, o dirigente apareceu ao lado Kotick para elogiar o acordo, sublinhando que sentia que as duas empresas tinham “valores semelhantes e ideologias sobre a cultura de trabalho também semelhantes”.
Spencer disse que a Microsoft se “sentou com Bobby e a equipa e olhou para o plano no qual têm trabalhado”, acrescentando que a cultura da empresa era sempre um trabalho em progresso. “Apoiamos muito o progresso que ele e a equipa estão a fazer”, notou o responsável.
Os atuais e antigos funcionários da Activision, que têm liderado as tentativas de reforma da cultura de trabalho da empresa não pensaram que a compra fosse provocar mudanças a curto prazo, especialmente porque a venda podia enfrentar uma longa revisão por parte dos reguladores.
Phil Spencer admitiu mesmo que o negócio poderia demorar entre 12 a 18 meses a ser concluído.
“Continuaremos a lutar pela melhoria e a salientar a representação adequada dos trabalhadores”, notou Jessica Gonzalez, antiga funcionária da Activisio,n e uma das organizadoras do movimento ativista ABetterABK, acrescentando também que “isto não muda nada”.
Bobby is now secure in his position for at least 2 years. The biggest “wait and see” union bust effort ever. We press on as if nothing happened. The course isn’t altered over this news.
— Jessica Gonzalez 🤍💙 #ABetterABK #ABetterUbisoft (@_TechJess) January 18, 2022
Videojogos lucraram com a pandemia
As empresas de videojogos aumentaram os lucros desde o início da pandemia. O recorde anterior para a maior fusão da indústria de jogos foi estabelecido na semana passada, quando a Take-Two Interactive, criadora de jogos como a Grand Theft Auto, anunciou planos para comprar a editora de jogos móveis Zynga, por mais de 11 mil milhões de dólares.
No ano passado, a Electronic Arts e a Take-Two envolveram-se numa guerra de licitações sobre a Codemasters, uma empresa de jogos de corrida que acabou por ir para a EA por 1,2 mil milhões de dólares.
A Microsoft fez outra compra em 2020 quando adquiriu a ZeniMax Media e os seus estúdios de jogos por 7,5 mil milhões.
A Ativision comprou mais tarde a King, empresa de jogos europeia por detrás da Candy Crush, para se expandir para jogos móveis. A King conseguiu um lucro de mil milhões de dólares, durante o último período de 12 meses.
Os jogadores esperam agora que a Activision lance a mais recente versão de Call of Duty, com jogos como Diablo e Overwatch adiados. Ainda assim, a Activision continua a ser bastante rentável, reportando um lucro de 639 milhões de dólares no seu último trimestre.
Kotick considera que a aquisição da Microsoft vai fornecer à Activision as ferramentas necessárias para acompanhar as grandes empresas tecnológicas como Google, Apple, Amazon e Tencent, no panorama do jogo em rápida evolução.
“Percebemos que ia ser um mundo cada vez mais competitivo, com recursos que simplesmente não tínhamos”, concluiu o dirigente.
Meta beneficia com a compra
Segundo a Forbes, o acordo entre a Microsoft e a Activision Blizzard, como um jogo no metaverso, é do interesse da Meta.
A empresa de Mark Zuckerberg esteve de mãos atadas por um impasse recente dos reguladores anti-trust, que dizem que a corporação ganhou um domínio monopolista sobre os meios de comunicação social.
Esta situação torna efetivamente impossível o Facebook comprar qualquer coisa nova, dentro do espaço tradicional dos meios de comunicação social.
No mês passado, os reguladores britânicos disseram à Meta que tinha de vender a GIPHY, fechando um negócio de 315 milhões de dólares, porque iria asfixiar ainda mais a concorrência da publicidade digital.
A Meta poderá ser capaz de reorientar os milhares de milhões de dólares, se conseguir provar que também há concorrentes ao mesmo nível da empresa.
Para se sentir segura de que os reguladores não irão anular futuros acordos do mundo virtual, a Meta quer mostrar que é possível existir uma competição por esses acordos, entre outras empresas.
Por outras palavras, a Meta quer acordos como a Microsoft-Activision para justificar os seus próprios acordos. Para justificar o seu próprio aumento de capital.
E, enquanto a classe média se aliena da realidade massacrando os seus pares no mundo virtual online, alimentando-o com a sua própria carne, o mundo verdadeiro sucumbe esfomeado de empatia e de bondade, implodindo contra a sua vontade dentro no evento global de extinção já há muito anunciado mas por poucos comprado.