Bastam 4 formigas para fazer iogurte. Receita esquecida ressuscita na Dinamarca

ZAP // DALL-E-2

Técnica foi testada pela primeira vez. O sabor saiu diferente, mas já tem o papel principal em três pratos do aclamado Alchemist. Serão as formigas o principal ingrediente dos iogurtes do futuro, como já foram no passado?

Uma prática há muito esquecida de fazer iogurte com formigas foi recentemente recriada por cientistas da Universidade de Copenhaga — e até já foi integrada num restaurante Michelin.

A técnica, que se crê ter sido utilizada pelos povos nómadas da Turquia e da Bulgária, recorre a formigas de madeira vermelha (Formica rufa), para iniciar o processo de fermentação do iogurte. Segundo o ZME Science, foi transmitida oralmente ao longo de gerações na Bulgária e na Turquia e baseava-se nas formigas e nos micróbios que lhes estavam associados para fermentar o leite quando não havia fermentos para iogurte disponíveis.

Agora, pela primeira vez, a técnica foi documentada e testada cientificamente.

Fazer iogurte com formigas

Para recriar a antiga técnica, os investigadores recolheram formigas de madeira vermelha de colónias na Bulgária. Depois de aquecerem o leite cru até à temperatura ideal para a fermentação, adicionaram quatro formigas vivas ao frasco com leite, cobriram-no com gaze e enterraram o frasco dentro de uma colónia de formigas.

O material do monte da colónia de formigas cobriu completamente o frasco, permitindo a fermentação natural.

Após 26 horas, o leite mostrou sinais de acidificação. O pH baixou e formou-se coalhada no fundo do frasco, o que indica que a fermentação estava a decorrer.

O iogurte resultante da receita tinha um ligeiro sabor picante com notas herbáceas e de erva, que os investigadores atribuíram aos micróbios e às contribuições químicas das formigas.

A equipa também realizou experiências controladas em laboratório para garantir que o processo podia ser reproduzido.

Experimentaram três variações: formigas vivas, formigas congeladas e formigas desidratadas, cada uma adicionada ao leite aquecido, e concluíram que o microbioma natural das formigas podia, de facto, produzir leite fermentado — embora o produto resultante fosse diferente do iogurte convencional, tanto no sabor como na textura.

O “holobionte de formiga”

Os investigadores aprofundaram a ciência por detrás deste processo de fermentação invulgar, centrando-se no conceito de “holobionte de formiga”.

Um holobionte é um organismo e a comunidade de micróbios que vivem nele e dentro dele. Neste caso, as formigas da madeira vermelha transportam bactérias, ácidos e enzimas fundamentais para a fermentação do leite.

O estudo descobriu que as formigas transportam bactérias de ácido lático e acético, semelhantes aos micróbios utilizados na fermentação tradicional do iogurte, o que sugere que os seus microbiomas são válidos para produzir o alimento.

O resultado final do iogurte de formigas continha bactérias do ácido lático e do ácido acético, que contribuíram não só para o azedume, como para a preservação do iogurte.

Produção atual sem diversidade microbiana

Os produtos lácteos fermentados, incluindo o iogurte, o queijo e o kefir, têm sido um alimento básico na dieta humana há milhares de anos, por preservarem o leite por mais tempo e por oferecerem uma fonte fiável de nutrição. No centro deste processo estão os micróbios, essenciais para transformar o leite nestes produtos fermentados.

As bactérias interagem com os açúcares do leite, produzindo o tal ácido lático e dando origem à textura espessa e ao sabor picante do iogurte.

A produção moderna de iogurte é altamente padronizada, e dá uso a estirpes bacterianas específicas utilizadas para garantir resultados consistentes. Mas a industrialização resultou numa perda de diversidade microbiana em comparação com os métodos de fermentação tradicionais, como este, esquecido no tempo.

A produção industrial de iogurte contemporânea depende de um número limitado de estirpes bacterianas, o que acaba por restringir a gama de sabores e texturas do produto final — fazer iogurte de formigas pode trazer mais sabores e mais benefícios para a saúde ao mercado.

Restaurantes de luxo aderem ao iogurte de formiga

A redescoberta do iogurte de formiga já despertou interesse no mundo da culinária de luxo.

O ousado restaurante Alchemist, que tem estrela Michelin na Dinamarca e é considerado um dos melhores restaurantes do mundo, já incorporou o iogurte de formiga na sua ementa, com três novos pratos inspirados na técnica ancestral: uma sanduíche de gelado “ant-wich”, um queijo tipo mascarpone e um cocktail de leite clarificado — todos com iogurte de formiga como ingrediente principal.

 

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Tomás Guimarães, ZAP //

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