Um grupo investidores estrangeiros liderado por norte-americanos está a desenvolver uma cidade experimental numa ilha das Honduras, com a ambição de se tornar “Hong Kong das Caraíbas”.
A pacata vila de pescadores de Crawfish Rock, localizada na ilha de Roatán, abriga os últimos vestígios de uma comunidade negra de língua inglesa. Os locais falam com um leve sotaque britânico todos são chamados de senhorita ou senhor. As casas são construídas sobre palafitas e não há necessidade de cercas. As pessoas vivem da terra e do mar, como há gerações.
Porém, os moradores dizem que não foram informadas sobre o projeto, segundo o Vice. “Tudo o que sabemos é que a nossa casa está em perigo”, disse Daysi Webster, de 35 anos.
Uma lei polémica permite que as cidades experimentais, conhecidas como cidades “charter” ou “modelo”, usem um direito legal à terra conhecido como “domínio eminente”, que permite que um governo se aproprie de propriedade privada.
Os investidores afirmaram que não usariam a força para se apropriarem da terra para expandir a sua cidade experimental, um terreno de 23 hectares conhecido como Roatán Prospera, para toda a ilha.
Porém, críticos do projeto disseram que esta é uma nova forma de colonialismo e que a cidade pode vir a servir como um paraíso fiscal e legal, permitindo que políticos e empresários corruptos evitem impostos e justiça. Segundo os críticos, o projeto pode também aumentar a desigualdade num dos países mais desiguais do hemisfério.
A ideia destas cidades “charter” surgiu do economista Paul Romer, que foi galardoado com um Prémio Nobel e que apresentou o conceito num Ted Talk em 2009. Romer teorizou que a fundação de cidades semi-autónomas no mundo em desenvolvimento com as nações estrangeiras a atuar como fiadores faria acelerar o desenvolvimento através da criação de um ambiente livre de corrupção local, a burocracia e regulamentos e, portanto, mais propício ao crescimento económico.
Segundo Romer, a prova disto pode ser encontrada em cidades-estado como Hong Kong, que prosperou economicamente sob o domínio britânico e até recentemente, sob o acordo de um país, dois sistemas com a China continental.
A teoria ganhou tração nos círculos conservadores pela sua abordagem de mercado livre e foi adotada por políticos em países com escassez de dinheiro que queriam atrair investimento estrangeiro.
As Honduras estavam em plena crise política e num dos seus períodos mais sombrios e violentos. Os líderes estavam desesperados e, de acordo com os críticos, dispostos a vender o país pela oferta mais alto.
Em 2014, o Governo das Honduras reformou a constituição e aprovou uma lei que criava uma estrutura para as cidades “charter”, chamadas Zonas de Emprego e Desenvolvimento Económico (ZEDE), que seriam na sua maioria autónomas, governadas por um comité de supervisão internacional e com domínio eminente.
Os membros fundadores da comissão incluía norte-americanos e europeus ativistas de extrema-direita, como Grover Norquist, fundador da Americans for Tax Reform, e vários aliados próximos do presidente Juan Orlando Hernández, suspeito de tráfico de drogas, que tem sido um dos principais proponentes da cidades “charter” nas Honduras.
Durante anos, houve rumores da fundação iminente da primeira cidade “charter” em diferentes locais do país. Porém, nunca nada se materializou até à vila de Prospera ser inaugurada silenciosamente em maio, para surpresa da comunidade local, que só descobriu um mês depois, graças a uma dica de um conterrâneo.
Os investidores da Prospera, incluindo o presidente-executivo Erick Brimen, um venezuelano-americano que se autodenomina “empreendedor em série”, chegaram à comunidade pela primeira vez em 2017, alugando uma pequena casa no centro da vila, onde estabeleceram um centro comunitário sob o pretexto de uma fundação.
Segundo os locais, o projeto foi apresentado como um desenvolvimento turístico.
As representações usadas em materiais de marketing retratam casas luxuosas projetadas por arquitetos famosos e modernos edifícios de escritórios e centros comerciais.
A tensão aumentou no mês passado devido a uma assembleia que Brimen convocou em Crawfish Rock que violou as restrições da covid-19 e, segundo os moradores, colocou a comunidade em risco.
Ativistas de direitos humanos afirmam que a assembleia foi convocada para compensar a falta de consulta à comunidade local sobre o projeto, conforme determina a legislação das Honduras. Porém, essa consulta deve ocorrer antes do início do projeto.
Nobel para alguém que idealiza paraísos fiscais e para onde foge o dinheiro de todos. Interessante… Hajam milhares destes para ver como ficamos. A ânsia pelo capital e a sua acumulação desenfreada, significam a decadência e o completo absurdo do sistema.