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Na Índia, a covid-19 mantém as escolas fechadas desde março. Meninas são as mais prejudicadas

A Índia é um dos países mais afetados pelo novo coronavírus, e é também um dos locais do planeta com os níveis de pobreza mais altos. Numa altura em que a situação é cada vez mais precária, as portas das escolas continuam fechadas e isso está a colocar as crianças em situações de pobreza extrema.

Embora a educação se tenha tornado online em todo o mundo, as crianças indianas estão a perder as aulas porque não têm acesso a tecnologia. Na Índia as escolas estão fechadas desde março e esta situação tem empurrado os mais novos para trabalhos pesados, avança o The Washington Post.

Nas grandes metrópoles, como Mumbai e Nova Deli, as escolas permanecem fechadas pelo nono mês consecutivo. Embora alguns estados tenham reaberto as escolas de ensino médio, a maioria dos 320 milhões de estudantes da Índia permanecem em casa.

Uma das muitas jovens nestas condições é Mamta Jaysinge, uma menina de 12 anos que se tem dedicado à apanha da cana de açúcar. Em qualquer outro ano Jaysinge estaria a estudar na modesta escola perto de sua aldeia no oeste da Índia, mas como esta fechou em março, agora passa os dias a trabalhar, a procurar água potável e a cozinhar refeições para a sua família.

Os alunos de comunidades mais pobres e marginalizadas enfrentam enormes obstáculos para continuar os estudos, mesmo em tempos normais. Agora, muitas das suas famílias estão a passar por uma grande crise financeira à medida que a economia da Índia se contrai. A ausência de escolaridade, em conjunto com a queda de salários, provavelmente irá resultar em taxas mais altas de trabalho infantil e sobretudo de casamentos forçados.

Na Índia, as escolas também atuam como um pilar para melhorar a nutrição infantil, fornecendo aos alunos refeições preparadas, atualmente esses esforços também estão suspensos. Os estados têm feito tentativas de substituir essas refeições enviando rações ou dinheiro para as famílias, mas estes apoios não chegam a todos, nem de igual forma.

Apesar da Índia ter o segundo maior número de casos de coronavírus do mundo, as infeções diárias caíram drasticamente nos últimos meses, por isso Vikram Patel, professor na Harvard Medical School, defende que “se deve priorizar a reabertura das escolas”.

Casamentos infantis vão aumentar

Para as meninas, esta situação pode ser especialmente precária. O governo indiano, algumas multinacionais e organizações sem fins lucrativos passaram anos a tentar reduzir a lacuna no número de matrículas escolares entre meninos e meninas, e esse foi um processo com um resultado notável. Agora, essas conquistas estão “definitivamente em risco”, revelou Yasmin Ali Haque, representante da UNICEF na Índia.

As escolas dão às meninas a possibilidade de se demarcarem de uma sociedade conservadora, de saírem de casa, encontrarem amigos, passarem tempo longe das tarefas domésticas e definirem o seu próprio futuro.

Num país onde cerca de um quarto das jovens se casa antes dos 18 anos, frequentar a escola “é uma solução fundamental para manter as meninas fora do casamento”, disse Haque. A ativista considera que quando as escolas forem reabertas, serão necessários esforços especiais para garantir o retorno das crianças.

Com as escolas fechadas , são muitas as meninas que enfrentam uma grande pressão para se casar. Sudha Varghese é uma ativista que trabalhou com meninas da comunidade Dalit no estado de Bihar, e garante que, só nos últimos 2 meses, evitou cerca de 12  casamentos infantis.

Difícil de retomar

Por todo o país, os professores têm tentado ajudar os alunos de várias formas. Usam métodos criativos para tentar passar algum conhecimento enquanto as escolas estão fechadas, e isso inclui programas de rádio e tutoriais para ensinar as crianças que não têm acesso à internet.

Neste sentido, um professor construiu uma plataforma numa árvore de modo a obter melhor sinal para transmitir as suas aulas. Apesar dos esforços, muitas crianças – especialmente as que vivem em áreas rurais de estados mais pobres – quase não têm acesso ao material didático.

Rukmini Banerji, presidente-executiva da Pratham Education Foundation, mostra-se especialmente preocupada com o futuro das crianças, pois não estão a conseguir assimilar conhecimentos, e os que já tinham vão-se perdendo.

Deepak Nagargoje, um ativista que trabalha com filhos de migrantes, sublinha que o facto das crianças não terem acesso à internet ainda piora a situação, e quando as escolas finalmente reabrirem os jovens podem acabar por desistir de regressar.

“Corremos o risco de lidar com um aumento do trabalho infantil e das taxas de abandono escolar”, refere Nagargoje.

De acordo com um relatório recente da UNICEF, pelo menos um terço das crianças em idade escolar não consegue ter acesso ao ensino à distância enquanto as escolas estão fechadas.

Ana Moura, ZAP //

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