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Historiador da Grécia Antiga “previu” guerra inevitável entre EUA e China

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U.S. Pacific Fleet / Flickr

O cientista Graham Allison identificou 16 exemplos de potências emergentes que confrontaram um poder estabelecido

Não há muito tempo, a ascensão da China era vista como essencialmente benigna. Uma economia em crescimento, pensava-se, andaria de mãos dadas com um sistema político mais liberal. A China a tornar-se uma potência global responsável.

Mas hoje, a China é cada vez mais vista como uma ameaça. De facto, muitos temem que a rivalidade entre China e Estados Unidos possa até levar a um conflito com ramificações globais. Estarão os dois países num caminho inevitável para a guerra?

Um novo conceito proposto nos Estados Unidos, que remete à Grécia Antiga e ao trabalho de Tucídides, o historiador da Guerra do Peloponeso entre Atenas e Esparta, pode ajudar a responder a esta questão.

O cientista político Graham Allison, professor do Centro Belfer da Universidade de Harvard, é um dos principais estudiosos das relações internacionais americanas. O seu livro, “Destined For War: Can America and China Avoid Thucydides Trap?”, tornou-se leitura obrigatória para muitos políticos, académicos e jornalistas.

A armadilha de Tucídides, diz Allison, é a dinâmica perigosa que ocorre quando um poder em ascensão ameaça a posição de um poder já estabelecido — no passado, Atenas, e hoje, os Estados Unidos.

No antigo mundo grego, foi Atenas que ameaçou Esparta. No fim do século XIX e começo do século XX, a Alemanha desafiou a Grã-Bretanha. Hoje, uma China em ascensão está potencialmente a desafiar os Estados Unidos.

Ao analisar 500 anos de história, Allison identificou 16 exemplos de potências emergentes que confrontaram um poder estabelecido: em 12 dos casos, isso levou a guerra. A rivalidade entre Washington e Pequim é, segundo o especialista, “a característica que define as relações internacionais atuais e no futuro próximo”.

A crescente ambição da China de Xi Jinping

Um confronto nesta região poderia ser suficiente para levar estas duas grandes potências a guerra. Não menos importante é o facto de a China estar à procura de construir a maior armada naval do mundo.

“Isto não é apenas impressionante nos tempos atuais”, diz Andrew Erickson, professor de estratégia da Faculdade de Guerra Naval dos Estados Unidos e um dos principais especialistas em Marinha chinesa. “Isto é impressionante em termos históricos“.

A qualidade dos equipamentos da China também está a melhorar significativamente, com navios de guerra maiores e mais sofisticados, cujas capacidades, em muitos aspetos, estão a aproximar-se de embarcações ocidentais.

Elizabeth Economy, diretora de Estudos Asiáticos no Conselho de Relações Internacionais, um centro de investigação baseado nos Estados Unidos, diz que Xi Jinping tem sido um líder transformador com “uma visão muito mais expansiva e ambiciosa sobre o lugar da China no cenário global”.

A especialista argumenta que o elemento mais subestimado da ambição do presidente chinês é “o seu esforço para reformular as normas e instituições do cenário global de um modo que reflita mais de perto os valores e prioridades chinesas”.

Os Estados Unidos também estão a rever sua posição. Washington classificou a China, juntamente com a Rússia, como uma “potência revisionista“, ao dizer que ambos querem “redefinir o mundo de acordo com o seu modelo autoritário”.

Uma segunda Guerra Fria?

Ainda que haja um ânimo diferente em Washington, ainda estão a ser dados os primeiros passos no estabelecimento de uma nova estratégia para lidar com Pequim.

Alguns falam da possibilidade de uma segunda Guerra Fria, desta vez entre os Estados Unidos e a China. No entanto, ao contrário da Guerra Fria do século XX, entre americanos e soviéticos, as economias americana e chinesa estão profundamente interligadas. Isso dá à rivalidade uma nova dimensão: uma batalha pelo domínio tecnológico.

A gigante de telecomunicações chinesa Huawei está no centro desta turbulência. Os Estados Unidos não estão a permitir que a tecnologia da empresa seja usada em futuras redes de comunicação e estão a pressionar aliados para impor uma proibição semelhante.

Além de restringir a compra de produtos da Huawei, os Estados Unidos também estão a processar criminalmente a empresa e a sua diretora financeira, Meng Wanzhou, filha do fundador da Huawei, Ren Zhengfei, que foi presa no Canadá em dezembro, a pedido das autoridades americanas.

A rivalidade entre a China e os Estados Unidos é real e não vai a lado nenhum. Os dois países estão numa encruzilhada estratégica. Ou encontram forma de acomodar os interesses um do outro ou vão ter um relacionamento muito mais conflituoso.

Isso traz de volta a questão da armadilha de Tucídides. No entanto, Allison enfatiza que nada está gravado em pedra. A guerra entre Estados Unidos e China não é inevitável. No seu livro diz que se trata de diplomacia e não de destino.

ZAP // BBC

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8 Comments

    • Se a China, que nos últimos anos é o maior comprador de Ferrari’s (etc) do mundo, é um Estado comunista, eu vou ali e venho já!…

      • Um Estado ser de esquerda ou direita, define-se pelo controlo Estatal sobre a economia e o individuo existir ou não. Não existe liberdade economica na China. Se depois algumas elites beneficiam de serem amigas do Estado, isso acontece em todos os regimes comunistas / socialista fascistas.

  1. Ler esta notícia é uma lástima. Primeiramente andar a atribuir a Tucidides previsões que ele nunca fez (aliás ele nunca fez qualquer previsão), quando o que ele fez foi uma análise da beligerância pela preponderância no acesso aos recursos e sua dominação. É óbvio que perante situações idênticas a resposta é identica e isto nada tem a ver com ideologias. Fosse a China um estado vassalo ou avassalado pela potência preponderante e podia ser o socialista que quisesse, ou poderia ser o epítome do capitalismo, desde que a sua burguesia estivesse determinada a disputar a predominância à da potência momentanea e seria o pior dos demónios para o status quo e os estados vassalos. Daí que a China aplique uma fórmula que é algo bizzarra e ter passado de benigna a ameaça sem alterar nadinha, e a Russia ter voltado a ser o “papão” sem ter tornado ao sistema socialista.
    Aquilo a que assistimos neste momento é uma guerra de apropriação de recursos dos estados mais fracos juntamente com a destruição em larga escala da capacidade produtiva destes estados, aumentando a sua dependência em relação à produção e tecnologia das potências. A diferênça é que de produtor de manufacturas de baixo valor acrescentado a RPC passou a produtor de produtos de elevada componente tecnológica e de altíssimo valor acrescentado, só que isso implica a apropriação das matérias primas e energia dos países menos desenvolvidos disputando-a aCarlosos EUA. A partir daí a guerra está instalada, não forçosamente pelos métodos tradicionais. E isso não foi apenas Tucidides que analisou ao longo da história.

  2. Quando estive na China em 2010 só vi arranha céus e os carros mais velhos na rua já eram deste milénio. Muitos Audi, BMW e Mercedes. Só os pesados eram a gasóleo. Quando expliquei ao chinês a economia de um ligeiro a diesel ficou espantado. Alguém acredita que eles vão embarcar pelo mundo e desatar aos tiros? Já não são selvagens, estão muito ocidentalizados, agarrados aos seus tarecos. A guerra é e será comercial.

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