Ana Isabel Lopes admitiu: “Em 40 anos de serviço nunca tinha tido uma solicitação desta natureza, considerei-a atípica”.
A diretora do Departamento de Pediatria do Hospital de Santa Maria afirmou nesta terça-feira que o pedido de marcação de consulta para as gémeas luso-brasileiras, em 2019, foi feito em nome do ex-secretário de Estado Lacerda Sales.
“O início do meu envolvimento neste processo foi na sequência de um contacto com a secretária pessoal [Carla Silva] do secretário de Estado [Adjunto e da Saúde], que me contactou primeiro por telefone e depois por email, solicitando uma consulta de neuropediatria e de uma avaliação clínica para duas crianças”, disse Ana Isabel Lopes, após ser interpelada pelo deputado do Livre Paulo Muacho.
À comissão parlamentar de inquérito ao caso das gémeas, a diretora clínica referiu que “a informação veiculada por Carla Silva foi que o fazia em nome do secretário de Estado” António Lacerda Sales, não tendo dúvidas da solicitação do ex-membro do Governo PS: “absolutamente, foi essa a minha interpretação”.
Todavia, Ana Isabel Lopes admitiu que “não foi feita qualquer menção” a Lacerda Sales e que não indagou se foi o ex-governante socialista que pediu a marcação da consulta.
“Foi absolutamente excecional. Em 40 anos de serviço nunca tinha tido uma solicitação desta natureza, considerei-a atípica”, esclareceu, dizendo que teve de contactar o seu superior hierárquico, Luís Pinheiro (ex-diretor clínico do Hospital de Santa Maria), devido à “grande vulnerabilidade” da situação das crianças e à “importância de dar resposta”.
Ana Isabel Lopes disse ter enviado uma mensagem a Luís Pinheiro, mencionando uma solicitação de consultas para duas crianças, tendo de seguida reencaminhado a comunicação de Carla Silva.
“A orientação do diretor clínico foi no sentido de uma resposta positiva à solicitação, no sentido de autorização para agendamento da consulta”, sublinhou.
Apesar da situação excecional e atípica, não houve qualquer “injustiça” neste processo, assegurou Ana Isabel Lopes.
A médica disse ainda que não havia listas de espera “pela natureza da patologia, extremamente rara”.
“Não existe lista de espera. O tempo contava para dar resposta assistencial”, precisou.
Contradição
A contradição surgiu nos minutos finais da audição, quando a diretora foi confrontada com as declarações da neuropediatra que acompanhou as duas gémeas, Teresa Moreno.
A médica contou, também no Parlamento, que a “ordem” do pedido de consulta veio de “alguém superior” ao secretário de Estado, e que por isso era preciso marcar a consulta rapidamente; e revelou que soube essa informação através de Ana Isabel Lopes.
Mas a diretora de pediatria desmente a médica: “Não disse. Nem vejo nenhum determinante para o fazer. Nem tinha qualquer conhecimento para tal afirmação“.
Ao ser confrontada com o facto de alguém estar a mentir, Ana Isabel Lopes respondeu: “Cada uma de nós terá a sua verdade”.
// Lusa