A comissão adianta que já recebeu mais de 300 testemunhos de vítimas de abusos sexuais por parte de membros ou pessoas próximas à Igreja Católica.
Em entrevista ao Público, o psiquiatra Daniel Sampaio, que é também membro da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos de Menores na Igreja (CIEAMI) fez um balanço do trabalho que tem sido feito desde o início do ano, tendo já sido recolhidos mais de 300 testemunhos.
“Temos encontrado uma boa receptividade por parte das instituições que trabalham com crianças e jovens e, de uma forma geral, temos tido também um bom apoio da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP)”, afirma.
O especialista, que está presente nas entrevistas presenciais com as vítimas e com os bispos, reforça que “ninguém inventa as histórias” que detalham. “São histórias de grande sofrimento e o nosso inquérito está construído com uma consistência interna que qualquer pessoa que tente preencher o inquérito a brincar, nós percebemos. Além disso, a situação é de tal modo difícil para as pessoas falarem que ninguém inventa os pormenores com que o inquérito é feito”, revela.
Foram também já enviadas 16 denúncias de casos que ainda não prescreveram para o Ministério Público, mas Sampaio não adianta detalhes por as investigações estão “em segredo de justiça”.
Apesar de partilhar as informações com o Ministério Público, a comissão não partilha os alvos das denúncias que recebe com a Conferência Episcopal. “Nós não queremos lançar suspeitas sobre ninguém, não é esse o nosso propósito. O nosso propósito é colaborar com a Igreja, até porque foi a Igreja que mandatou o doutor Pedro Strecht para constituir essa comissão e aceitou a constituição da comissão”, adianta.
“A nossa posição é de colaboração. Mas evidentemente que houve pessoas ligadas à Igreja que ocultaram, como acontece sempre, porque a ocultação é absolutamente uma característica deste problema. As pessoas escondem esse problema. Quando nós dizemos que houve pessoas da Igreja que não validaram as queixas, isso era algo inevitável”, reforça.
O psiquiatra também comentou as declarações de D. José Ornelas, que considerou ser descabido falar em encobrimento. “Isto tem a ver com a palavra encobrimento porque encobrimento é um crime, é esconder uma determinada situação. Nós não falamos de encobrimento. Foram os senhores jornalistas que têm levantado essa questão”, atira.
Para além da Igreja, há ainda casos de abusos a acontecer nas instituições da sociedade civil, com colégios e até escolas da rede pública. “São pessoas ligadas à Igreja em que, por exemplo, no contexto de um padre professor de religião e moral e nos escuteiros – é de conhecimento público – que houve casos por parte de determinada pessoa que está muito bem inserida na sociedade”, lembra.
Daniel Sampaio acredita ainda que é “fundamental” que a Igreja “se empenhe” através de avisos do final da missa ou divulgação dos contactos da comissão. “Acho que não vai haver entrave no próprio interesse da Igreja porque pode criar-se uma ideia, que não é boa para a Igreja e sobretudo para as vítimas, de que há coisas que estão a ser escondidas”, remata.