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Tirar férias do casamento? Há cada vez mais casais adeptos das licenças sabáticas conjugais

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A convivência diária dos casais nos confinamentos fez com que muitos desejassem fazer uma pausa na relação. As licenças sabáticas conjugais têm ganho adeptos que garantem que não são uma carta branca para a traição.

A quarentena obrigou muitos casais a conviver 24 horas sobre 24 horas dentro das mesmas quatro paredes. Se já há muitas relações com problemas em circunstâncias normais, esta convivência constante aumentou a monotonia e gerou ainda mais conflitos do que o esperado.

Pode a solução para reacender a chama é fazer uma pausa — não para comer um Kit-Kat — mas no próprio casamento? Para a jornalista britânica Celia Walden, que é casada com o também jornalista e apresentador Piers Morgan, a resposta é sim.

Walden escreveu recentemente uma coluna no The Telegraph onde relata a sua experiência após ter decidido juntamente com o marido tirar uma “licença sabática” de seis semanas do casamento.

A jornalista escreve que este período foi o mais longo que passou longe de Piers Morgan desde a pandemia e que o casal nunca ficou mais do que duas noites separado nos últimos dois anos. O balanço de Walden é claro: “Todos os casais casados (que viveram durante três confinamentos) devem experimentar isto”.

“Sabem quando o computador começa a ficar muito lento sem nenhuma causa óbvia e a resposta é sempre “desliga e liga outra vez“? É isso que uma licença sabática faz ao casamento”, descreve.

A autora diz mesmo que é um “milagre” que qualquer casal aguente o tédio considerando quão “anti-natural é passar todas as horas” na companhia do parceiro ao longo de vários meses. Walden justifica a sua posição com exemplos de cinco casais seus amigos que se separaram ou estão a atravessar uma fase complicada depois dos sucessivos confinamentos que passaram juntos.

Mas a escritora deixa um alerta — as licenças sabáticas só devem ser tiradas em relações sólidas e não podem ser uma desculpa para se ter uma “escapadinha” com um amante, como é comum com muitos casais nova-iorquinos.

“Há uma quantidade surpreendente de detalhes online sobre como tirar a licença com “segurança”. Os psiquiatras acautelam a importância de ter uma ‘relação forte e com apoio’ antes de se avançar. Certamente, não pode haver o risco da relação desmoronar e da sabática se tornar permanente“, escreve.

Numa entrevista sobre a sua experiência pessoal, Walden revela que não telefonou muitas vezes ao marido e que os dois foram só trocando algumas mensagens: “Achei tão emocionante quando nos vimos novamente. Foi como nos primeiros dias do nosso casamento ou até os primeiros dias de namoro e eu adorei isso”.

Fazer uma pausa no casamento

Apesar de o exemplo de Walden e Morgan ter trazido novamente o tema a debate, o conceito já não é novo, tendo surgido pela primeira vez no livro The Marriage Sabbatical: the Journey that Brings You Home de Cheryl Jarvis, de 1999. Segundo a autora, o objectivo é semelhante a uma sabática profissional — fazer uma pausa para nos focarmos em nós e concretizarmos as nossas ambições individuais.

Jarvis acredita que a resistência à ideia não nasce da oposição à separação em si, mas antes aos às razões que a motivam, especialmente no caso das mulheres. “Uma mulheres pode dizer ‘vou cuidar da minha mãe doente’ e ninguém diria nada, ela era uma mulher incrível. Mas se ela quisesse fazer algo para si própria, era vista de forma muito diferente, como se fosse egoísta“, explica ao The Guardian.

Foi por esta mesma razão que o livro foi polémico quando foi lançado, com os opositores a considerarem que a ideia é um ataque aos valores tradicionais da família e uma oportunidade para a infidelidade.

“Isto foi surpreendente para mim porque tenho vivido uma vida muito tradicional. A ironia para mim é que nenhuma mulher que entrevistei tinha isso na sua consciência. A ideia para todas elas era não ter ninguém na sua vida durante esse período”, descreve Jarvis, que lembra que a distância não é o factor decisivo para haver traição.

Mas nem todas estas “férias” do casamento têm motivos tão simples. O que fazer quando o casal simplesmente está farto um do outro? O nosso conceito social do casamento implica que este seja sempre harmonioso, mas esta noção foi testada até ao limite durante a pandemia.

“Os confinamentos mostraram muito a importância do espaço nas relações. Os casais estavam a passar muito mais tempo juntos do que o normal e uma licença sabática do casamento num cenário pós-covid é mais fácil de digerir“, explica Jarvis.

No final de contas, é tudo uma questão de comunicação. Tal como escreve Zoe Williams no The Guardian: “Se pudéssemos deixar entrar o pequeno raio de luz que é o período sabático, implicitamente admitindo o facto indizível de que às vezes preferimos estar separado, é possível que tivéssemos de lutar menos para tentar corresponder o mito do casamento à sua realidade“.

Adriana Peixoto, ZAP //

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