Um medicamento cardíaco tomado por milhões de pessoas pode ser inútil – ou até perigoso

Uma nova pesquisa desafia a ideia de que os betabloqueadores devem ser tomados por pacientes que estão a recuperar de um ataque cardíaco, especialmente para as mulheres.

Durante décadas, os betabloqueadores foram a base do tratamento cardíaco, rotineiramente prescritos a doentes em recuperação de um ataque cardíaco para diminuir a frequência cardíaca, reduzir a pressão arterial e aliviar a carga de trabalho do coração.

Mas um novo estudo publicado na revista The New England Journal of Medicine e no European Heart Journal sugere que, para muitos doentes, estes medicamentos podem já não oferecer benefícios e, em alguns casos, podem até ser prejudiciais.

Dois grandes estudos realizados em Espanha e Itália, envolvendo 8438 doentes em 109 centros de saúde, examinaram se os betabloqueadores se mantêm eficazes na era moderna do tratamento cardíaco. Avanços como os stents e as estatinas melhoraram significativamente as taxas de recuperação após o enfarte do miocárdio, o que levantou dúvidas sobre se as terapêuticas mais antigas ainda fazem sentido.

Os investigadores focaram-se nos doentes cuja fração de ejeção (FE) do ventrículo esquerdo estava acima dos 40%. Uma FE normal varia entre 55% a 70%, enquanto valores inferiores a 40% indicam uma disfunção significativa. Metade dos doentes estudados foram receitados betabloqueadores para além das terapêuticas padrão, enquanto a outra metade não, refere o Science Alert.

Após uma média de 3,7 anos de seguimento, os resultados não mostraram diferenças significativas entre os dois grupos nas taxas de um segundo enfarte, hospitalização por insuficiência cardíaca ou morte. Esta descoberta desafia décadas de prática médica enraizada em ensaios clínicos conduzidos há mais de 40 anos.

Os resultados mais impressionantes surgiram em análises de subgrupos. Entre as 1627 mulheres incluídas no estudo, que geralmente eram mais velhas e a ter mais complicações de saúde, as que usavam betabloqueadores apresentaram piores resultados. Os riscos mais elevados de complicações e morte foram particularmente notórios nas mulheres com recuperação cardíaca mais forte e naquelas que tomavam doses mais elevadas do medicamento. Este padrão não foi observado entre os doentes do sexo masculino.

Os cardiologistas alertam que os betabloqueantes ainda desempenham um papel importante no tratamento de outras condições, incluindo arritmias e hipertensão. No entanto, as novas descobertas apontam para a necessidade de abordagens mais personalizadas no tratamento pós-enfarte, particularmente quando o coração recuperou a função normal.

“Estes resultados vão ajudar a agilizar o tratamento, a reduzir os efeitos secundários e a melhorar a qualidade de vida de milhares de doentes todos os anos”, afirmou Borja Ibáñez, cardiologista do Centro Nacional de Investigação Cardiovascular de Espanha.

ZAP //

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