Andres Martinez Casares / EPA

Bombardeiro furtivo da Força Aérea da China desfila na parada de 3 de setembro de 2025 na
Pela primeira vez, a China exibiu a totalidade da sua tríade nuclear no grande desfile militar realizado esta quarta-feira em Pequim, mostrando ser capaz de projeção de poder por terra, mar e ar. Apenas os Estados Unidos, a Rússia e a Índia possuem atualmente esta capacidade.
O evento apresentou um arsenal de mísseis nucleares lançados por terra, mar e ar, uma demonstração que surge pouco depois de os Estados Unidos terem alertado para a “rápida expansão nuclear” chinesa.
O desfile, que atravessou a Praça Tiananmen e assinalou o 80.º aniversário da derrota do Japão na Segunda Guerra Mundial, contou com a presença do DF-61 — considerado o mais recente míssil balístico intercontinental terrestre do país — e do DF-31BJ, uma versão modernizada de modelos anteriores de ICBM.
Pouco se sabe ainda sobre estes sistemas, incluindo o seu estado operacional. Mesmo que estejam ainda em desenvolvimento, a China já possui um considerável arsenal de ICBM terrestres.
Na parada militar desfilaram também o JL-3, um míssil balístico intercontinental lançado a partir de submarinos, e o JL-1, um novo míssil aéreo de longo alcance, para além de outras armas nucleares, como o gigantesco DF-5C, lançado a partir de silos.
A imprensa estatal chinesa destacou que foi a primeira vez que Pequim apresentou de forma pública a sua tríade nuclear completa — designação que abrange os vetores de ataque nucleares lançados de terra, mar e ar.
Apenas os Estados Unidos, a Rússia e a Índia possuem atualmente esta capacidade.
Para Ankit Panda, investigador sénior do programa de política nuclear do Carnegie Endowment for International Peace, a introdução do míssil JL-1 significa que a Força Aérea do Exército de Libertação Popular (PLAAF) passou oficialmente a deter capacidade nuclear.
“Até agora, a PLAAF não tinha um papel nuclear reconhecido, apesar de já existirem sinais de que viria a assumir essa função”, afirmou Panda ao Business Insider.
Em 2020, a PLAAF começou a operar o H-6N, o seu primeiro bombardeiro nuclear capaz de reabastecimento em voo, que serve de plataforma para o braço aéreo da tríade nuclear chinesa. Pequim está ainda a desenvolver o bombardeiro furtivo H-20.
Um relatório do Departamento de Defesa dos EUA publicado em 2024 refere que o desenvolvimento do H-20 demonstra a intenção chinesa de “ampliar a sua capacidade de projeção de poder”.
Ainda assim, para Panda, a importância simbólica de mostrar a tríade completa é “discutível”. “Não existe uma razão sagrada para que sistemas de lançamento nucleares distribuídos por terra, mar e ar sejam essenciais para a dissuasão”, sublinhou, “mas este tem sido um sinal de prestígio desde que os EUA e a União Soviética adotaram posturas semelhantes durante a Guerra Fria”.
Um arsenal em crescimento
De acordo com o relatório anual do Pentágono, a China possuía em 2024 mais de 600 ogivas nucleares operacionais — um número muito inferior às 4.300 da Rússia e às 3.700 dos EUA, segundo a Federation of American Scientists. Ainda assim, o relatório alerta para uma “rápida expansão nuclear” chinesa.
Até 2030, a China deverá ultrapassar as 1.000 ogivas operacionais, muitas delas em níveis de prontidão mais elevados. A modernização deverá prosseguir até 2035, ano em que Pequim quer ter as suas forças armadas “basicamente modernizadas”.
Trata-se, segundo Washington, de um marco importante para o presidente Xi Jinping, que ambiciona alcançar até 2049 um exército “de classe mundial”, em paridade com as principais potências.
A China dispõe de centenas de ICBM, todos com capacidade para atingir o território continental dos EUA. O DF-41, antecessor do DF-61, tem um alcance estimado superior a 12 mil quilómetros e pode transportar várias ogivas. Pequim possui também numerosos mísseis balísticos de teatro e mísseis de cruzeiro.
O JL-3, apresentado no desfile desta quarta-feira, é a terceira geração de mísseis balísticos lançados de submarinos chineses. Tal como o seu antecessor, o JL-2, pode ser transportado pelos submarinos da classe Jin, estando já em desenvolvimento uma nova geração de submarinos nucleares lançadores de mísseis balísticos.
Quanto ao H-6N, distingue-se de outros bombardeiros chineses por ter a fuselagem modificada, permitindo-lhe transportar externamente um míssil balístico nuclear lançado do ar. Segundo o Pentágono, poderá ser utilizado em “ataques nucleares de precisão contra alvos no teatro Indo-Pacífico”.
A comunicação social chinesa descreveu as armas apresentadas no desfile como o “trunfo estratégico” de Pequim para salvaguardar a soberania e a dignidade nacional.
O principal rival da China, os Estados Unidos, dispõem de uma robusta tríade nuclear composta pelos ICBM Minuteman III — que serão substituídos pelo programa Sentinel —, pelos bombardeiros B-52 Stratofortress e B-2 Spirit, aos quais se juntará em breve o B-21 Raider, e pelos submarinos da classe Ohio equipados com mísseis Trident II D5, que darão lugar à nova classe Columbia.
Esta tríade garante a Washington um arsenal diversificado, flexível e resistente, que sustenta o seu estatuto de potência nuclear de referência — pelo menos, para já.