2024 deverá terminar com uma diminuição do número de vítimas de tráfico de seres humanos (TSH). Mas não é bem assim: “A extinção do SEF provocou uma mudança de processos, ainda em curso, e isso tem influência”.
No ano passado, o Observatório de Tráfico de Seres Humanos apontou para 650 presumíveis vítimas de tráfico de seres humanos (e 84 vítimas confirmadas), um aumento de 72% face a 2022.
Mas, este ano, a técnica do Observatório Beatriz Tomé conta ao JN que, “este ano, o número de vítimas está a descer“, contrariamente à tendência dos últimos anos: contam-se 38 sinalizações.
De acordo com a coordenadora da Equipa Multidisciplinar do Centro, Vera Carnapete, a “extinção do SEF provocou uma mudança de processos, ainda em curso, e isso tem influência”. Explica que “ainda estamos todos num processo de reflexão. Havia uma ligação e confiança muito grande entre nós e os inspetores do SEF, e isso ainda não acontece com a GNR e a PSP. É preciso construir uma relação”.
Não é a única a defender que o número de vítimas de TSH pode estar mal apontado devido às dificuldades agora acrescidas em detetar este tipo de crime. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras foi extinto em outubro de 2023, e a PSP e a GNR são agora responsáveis pela deteção de crimes deste tipo.
Acácio Pereira, ex-presidente do Sindicato da Carreira e Fiscalização do SEF, acredita que a extinção do Serviço “tem necessariamente impacto nas investigações e sinalizações das vítimas de TSH, mais não seja por ter existido uma alteração substancial na estrutura que investiga. É sempre necessário um período de adaptação”.
Também fontes policiais contaram ao JN que “o fluxo de informação”, que se iniciava através da recolha de dados de imigrantes nos aeroportos nacionais e se prolongava até às operações no terreno, “perdeu-se”. “A PSP e a GNR ainda estão a ganhar o conhecimento que o SEF acumulou durante anos“, garantem.
Para além disso, essas fontes acreditam que, “com o fim das manifestações de interesse, vários imigrantes ficaram mais vulneráveis e muitos deles cairão na teia das redes criminosas, para conseguirem sobreviver“.
Ainda assim, o relator nacional para o TSH, Manuel Albano, diz que “os dados finais não estão apurados e falar em tendências é extemporâneo. É perigoso dizer que as sinalizações de vítimas baixaram”.
Albano admite que “o SEF tinha uma maior proximidade” com os casos de TSH, mas diz que “isso não significa que não continuam a ser feitas sinalizações de vítimas”.