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“Exército virtual” foi usado para influenciar as eleições brasileiras de 2014

Poderia muito bem ser mais uma notícia sobre a manipulação da opinião pública e as fake news que ajudaram Donald Trump a chegar à presidência dos Estados Unidos, mas estamos a falar do Brasil.

Numa reportagem publicada na passada sexta-feira, a BBC revelou que um verdadeiro “exército virtual” de perfis falsos foi usado para manipular a opinião pública nas redes sociais durante as eleições presidenciais de 2014.

O esquema já estaria em funcionamento desde 2012 e teria beneficiado pelo menos 13 políticos, entre candidatos ao governo, senado e câmara dos deputados.

A actuação online era semelhante, mas a utilização dos fakes variava de um candidato para o outro. Em todos os casos, fotos de pessoas reais, URLs verdadeiros e comentários do quotidiano serviam para dar a aparência de legitimidade aos perfis, evitando também a detecção pelos serviços automatizados das redes sociais.

No meio das publicações surgiam, entretanto, mensagens de apoio a candidatos, declarações de intenção de voto e até ataques a inimigos políticos.

O senador Aécio Neves, por exemplo, foi citado como o melhor preparado durante os debates presidenciais de 2014. Já o antigo presidente do senado, Renan Calheiros, foi assunto de posts defensivos, principalmente em resposta aos protestos de 2013, com direito a hashtag própria, #MexeuComRenanMexeuComigo.

Toda a operação seria comandada por uma empresa chamada Facemedia, que contratou dezenas de pessoas para controlar os perfis falsos.

Os “activadores”, como eram chamados pela Facemedia, recebiam contas já montadas, com direito a fotos e descrição de cada uma das “personas”, como eram apelidados os perfis falsos, que contavam até com chips de telemóveis usados para a autenticação.

Os activadores eram controlados através do Skype e trabalhavam em regime de home office, recebendo valores que poderiam ir de 200 a 500 euros. No dia-a-dia, produziam posts normais, dando bom dia aos seus seguidores, comentando algum filme que tivessem visto ou reclamando da vida.

As mensagens eram publicadas com o uso de sistemas de gestão de redes sociais como o Hootsuite. Alguns dos activadores, de nível mais baixo, eram responsáveis apenas pelas mensagens quotidianas, programando posts para a semana inteira e realizando interacções entre os perfis.

Já outros cuidavam da parte política do esquema, além de publicarem comentários em sites de notícias ou votar em sondagebns – muitas vezes, fazendo isso de forma repetitiva, oito horas por dia.

Além disso, pessoas reais eram adicionadas de forma aleatória, também como forma de dar aparência de legitimidade às contas. Quando uma era desmascarada por militantes políticos ou bloqueada pelos sistemas de segurança das redes sociais, outras surgiam em sua substituição. A Facemedia tinha uma base de dados de milhares de perfis falsos prontos a serem utilizados.

Depois das eleições, muitos dos perfis acabaram por ser abandonados, com uma análise a mostrar que 20% das contas utilizadas durante as eleições foram deixadas de lado a 27 de outubro de 2014, precisamente no dia seguinte à votação da segunda volta das eleições desse ano.

A BBC analisou apenas uma amostra de contas que pertenceriam à Facemedia, mas fontes ouvidas pela reportagem afirmam que o âmbito da operação seria muito maior, envolvendo também outras empresas que realizam o mesmo tipo de serviço.

A maioria dos políticos citados diz não ter utilizado os serviços. Outros admitem terem feito negócio com a Facemedia, mas apenas para monitorização das redes sociais e divulgação legítima das suas campanhas.

Aécio Neves, por exemplo, diz não reconhecer a empresa, enquanto outros políticos dizem não ter autorizado o uso de perfis falsos. Já Renan Calheiros afirmou nunca ter contratado tais serviços, e que inclusivamente nem era utilizador frequente das redes sociais durante as eleições.

a Facemedia, em reacção, diz que não revela as informações de contratos firmados com clientes, mas garante que os seus serviços são transparentes, estando registados junto ao Tribunal Superior Eleitoral brasileiro.

A companhia admite que, entre suas atribuições, está a “criação e manutenção de sites e perfis”, mas não confirma nem nega a criação de contas falsas para fins políticos.

ZAP // CanalTech / BBC

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