O Governo dos Estados Unidos criou uma universidade falsa para atrair estudantes estrangeiros ilegais no país e, posteriormente, deportá-los.
A Universidade de Farmington apresentou-se como uma instituição nova, rigorosa e seletivas na escolha dos estudantes, mas aceitava candidatos de qualquer parte do mundo. Tinha uma presença ativa nas redes sociais e, como afirmava no seu site, o objetivo era “proporcionar a estudantes de todo o mundo uma experiência educativa única”.
Tinha um emblema e até um slogan — Scientia et Labor (Ciência e Trabalho). Também oferecia programas académicos com todas as certificações e autorizações relevantes.
A entidade exibia o seu aval do Departamento de Assuntos Regulatórios e de Licenciamento de Michigan e da Comissão de Acreditação de Escolas e Faculdades Profissionais. O Programa de Intercâmbio de Estudantes também a avalizou para receber estudantes estrangeiros.
A instituição cobrava por ano quase 12 mil dólares, um custo significativamente inferior ao que muitas outras instituições académicas nos Estados Unidos pedem. Mas nada parece ter levantado suspeitas, nem mesmo a ausência de salas de aula, professores contratados ou aulas ministradas.
Na realidade, a Universidade de Farmington foi criada por agentes secretos numa operação do Serviço de Controlo e Imigração Aduaneira dos Estados Unidos (ICE) para prender e deportar estrangeiros que já tinham entrado no país com vistos de estudante e permaneciam ilegalmente.
Em janeiro, quando o esquema foi revelado, oito pessoas que supostamente trabalhavam como “recrutadoras” da escola — e atraíram pelo menos 600 estudantes — foram acusadas de conspiração para cometer crimes.
Nos últimos meses, mais de 250 estudantes universitários, principalmente indianos, foram deportados para os seus países de origem; e outros enfrentam pedidos de deportação, confirmou a ICE ao Detroit Free Press.
De acordo com os investigadores, a instituição era “usada por cidadãos estrangeiros” como parte de um esquema de milhares de dólares que apenas oferecia os papéis que permitiam a imigrantes ilegais continuarem a viver e a trabalhar nos Estados Unidos com visto de estudante.
Os documentos apresentados à Justiça indicam que muitos dos estudantes se tinham matriculado na instituição através de um programa chamado Formação Prática Curricular (CPT) que permite trabalhar nos Estados Unidos. Como a instituição atendia a todos os requisitos exigidos por lei, os alunos matriculados nela podiam continuar a viver legalmente nos Estados Unidos.
“Todos sabemos que os estudantes internacionais podem ser um ativo valioso para o nosso país, mas, como este caso demonstra, o bem-intencionado programa de visto de estudante internacional também pode ser explorado de uma forma abusiva“, disse o procurador federal Matthew Schneider, em comunicado à imprensa.
Segundo o site Vox, alguns estudantes dizem, entretanto, que não sabiam que estavam a violar as regras dos seus vistos e chegaram a confirmar que a universidade tinha legitimidade, tanto que a instituição contava com todas as credenciais oficiais relevantes.
Ravi Mannam, advogado especializado em imigração, disse ao jornal americano The New York Times que, embora alguns estudantes soubessem que a universidade servia apenas para manter o status de imigrante, outros acreditavam que estavam a matricular-se num programa académico legítimo com um preço mais acessível.
“O Governo usou métodos muito questionáveis e problemáticos para fazer com que estudantes estrangeiros entrassem na instituição”, disse.
As autoridades, por sua vez, dizem que os alunos sabiam que a escola era uma fraude e que optaram por se inscrever para permanecer legalmente no país.
O que aconteceu ao dinheiro pago?
Um dos pontos mais controversos da operação, além do facto de que os alunos acusados ou deportados chegaram ao país com vistos legítimos, é o destino das centenas de milhares de dólares pagos à instituição forjada pelos agentes secretos.
Estima-se que os custos de um programa de pós-graduação eram de 2.500 dólares por trimestre e os custos médios de licenciatura eram de mil dólares por mês.
Para os advogados de alguns dos acusados, o Governo americano aproveitou-se de “pessoas vulneráveis que só queriam manter o status migratório” nos Estados Unidos, além de ter ficado com milhares de dólares destas pessoas.
Segundo a Procuradoria federal, nenhum acusado ou organização civil apresentou uma reclamação contra o Governo dos Estados Unidos por cobrar aos estudantes pela operação fictícia.
ZAP // BBC