O Estado-Providência da Dinamarca tornou-se um “pesadelo de vigilância”

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O combate à fraude no pagamento de benefícios sociais levou à expansão dos poderes de vigilância das autoridades e tem levantando preocupações sobre possíveis violações da privacidade dos cidadãos.

A Dinamarca é conhecida mundialmente e até considerada um exemplo devido à sua vasta rede social que lhe permite ser um dos países com menos desigualdades e estar constantemente nos lugares cimeiros dos rankings das nações mais felizes.

No entanto, a generosidade do Estado-Providência dinamarquês esconde muitos riscos, nomeadamente, pessoas que recorrem à fraude para receber apoios indevidos. Na última década, este problema tem dominado a agenda política e dado azo a uma nova era de vigilância defendida pelos partidos mais conservadores.

Em 2011, a KMD, uma das maiores empresas tecnológicas da Dinamarca, estimou que até 5% dos pagamentos de benefícios feitos no país eram fraudulentos. Estes valores tornariam o país nórdico o líder isolado neste problema, já que estimativas semelhantes em França e nos Países Baixos apontam para fraudes na ordem dos 0,39% e dos 0,2%, respectivamente.

A percepção de que a fraude é um problema desenfreado no país levou à criação de uma agência de mineração de dados dentro da Administração de Benefícios Públicos. Nos últimos oito anos, Annika Jacobsen tem liderado a agência com uma única missão em mente: “Estou aqui para apanhar batoteiros“.

Uma lei de 2015 triplicou o número de bases de dados a que a sua agência pode aceder, tendo agora acesso a dados sobre os impostos dos cidadãos, as suas casas, carros, relações, empregadores, viagens e nacionalidade, relata a Wired. A agência passou até a poder pedir dados a governos estrangeiros. Jacobsen assumiu o seu leme no mesmo mês que a nova legislação entrou em vigor.

Algoritmos sofisticados analisam estes dados em busca de pistas de que alguém possa estar a defraudar o sistema. Jacobsen explica que, se o sistema detectar algo suspeito, os investigadores são alertados, pelo que o algoritmo não cancela os benefícios a ninguém.

Não são culpados só porque são sinalizados. Há sempre uma pessoa que analisa os dados”, afirma, frisando que os cidadãos têm o direito de recorrer contra qualquer corte ou cancelamento dos apoios.

Violação do direito à privacidade

A política dinamarquesa têm sido alvo de várias críticas e acusações de que viola o direito à privacidade dos cidadãos. O Justitia, um grupos de activistas pelos direitos humanos, descreve a expansão dos poderes da agência como “vigilância sistemática” e desproporcional à escala da fraude, apontando que a vasta maioria das pessoas sinalizadas acaba por ser considerada inocente.

O Instituto dos Direitos Humanos da Dinamarca, um órgão independente de vigilância dos direitos humanos, e a Autoridade Dinamarquesa de Proteção de Dados, um órgão público que aplica os regulamentos de privacidade, também já teceram duras críticas às politicas da Administração de Benefícios Públicos.

Jacobsen, por sua vez, argumenta que o uso dos dados por parte da sua agência está protegida pela lei europeia e frisa que prevenir a fraude é importante para manter a confiança no Estado-Providência.

“A maioria dos cidadãos é honesta; porém, sempre haverá alguns cidadãos que tentarão obter benefícios aos quais não têm direito”, realça.

A responsável afirma ainda que os algoritmos são mais justos do que os outros métodos de detecção de fraude, como as denúncias anóminas.

“Os críticos dizem que quando a máquina está a olhar para os dados, está a violar o cidadão, mas eu posso pensar que é muito mais violador escrutinar cidadãos aleatórios”, remata.

Adriana Peixoto, ZAP //

2 Comments

  1. Se há termos portugueses, porque se insiste em usar os ingleses? “…nos lugares cimeiros dos rankings das nações…”. Porque não “…nos lugares cimeiros da classificação das nações…”.?

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