Trabalhadoras poderão usufruir de uma licença de oito horas mensalmente, tempo que terá de ser reposto num espaço de três meses.
Em Espanha, um conjunto de organismos locais do setor público a disponibilizarem às funcionárias mulheres e aos trabalhadores transsexuais e não binários a oportunidade de usufruírem de uma licença quando entenderem que as dores decorrentes da menstruação os impedem de exercer as suas obrigações profissionais na plenitude. A medida começou a ser considerada este ano pelo município de Girona, o qual pôs em cima da mesa a possibilidade de flexibilizar os horários em função do desconforto dos funcionários.
Em junho, o mesmo município fez saber que chegou a acordo com mais dos seus 1300 trabalhadores para que o referido grupo pudesse usufruir de oito horas de licença mensalmente, com a ressalva de que qualquer período de tempo utilizado teria que ser reposto no espaço de três meses.
“Girona é conhecida por muitas coisas e acho que hoje estamos a adicionar um novo item à lista, já que, de forma pioneira aprovamos a licença menstrual“, destacou, na altura, a vice-presidente da autarquia, Maria Àngels Planas. “Estamos a eliminar o tabu que existe à volta da menstruação e das dores que algumas mulheres sofrem – que nós sofremos – durante a menstruação.”
Pouco depois de a medida ser aprovada, outros municípios catalães, como Ripoll e Les Borges, anunciaram políticas semelhantes. Em setembro, também a autarquia de Castellón de la Plana anunciou acordos com os seus trabalhadores para a implementação de um regime semelhante ao de Girona, após receber múltiplos pedidos por parte dos funcionários.
Este é, de facto, um avanço no que respeita a legislação relacionada com a menstruação, mas apenas tem apenas um cariz pioneiro se se tiver em consideração só o território europeu. Na Ásia, por exemplo, há muito que existem medidas tendo em vista este período da dinâmica reprodutora das mulheres, no entanto, são poucas as profissionais que usufruem do benefício por medo de que ao fazê-lo estejam a dificultar ou prejudicar as hipóteses de progredirem na carreira ou até de antagonizarem os seus colegas homens.
Em termos sociais, o tópico também não consensual, algo que é percetível através dos ataques que algumas empresas empresas recebem quando decidem adotar medidas deste âmbito e as dão a conhecer — mesmo quando o seu objetivo é unicamente impedir que as mulheres, transexuais e pessoas não-binarias tenham que recorrer a baixas ou dias de férias para conseguirem tolerar melhor as dores e usufruir de algum descanso. De acordo com uma pesquisa internacional, cerca de 14% das mulheres já tiveram de, em algum momento da sua vida, abandonar a escola ou o local de trabalho devido a dores provocadas pela menstruação.
Sílvia Rubio, membro da central intersindical CSC recordou ao The Guardian o momento em que a medida foi inicialmente proposta — a qual previa uma licença de dois dias por mês. “Existiu muita controvérsia” resume. A ideia foi inicialmente afastada, por receios de que, face ao benefício, as empresas se sentissem relutantes a contratar mulheres ou entregar-lhes tarefas de maior responsabilidade. “Para evitar qualquer discriminação baseada no género, transformamos a medida para que o tempo gasto pudesse ser compensado mais tarde“, esclareceu Rubio.
Ao longo das negociações, os sindicatos também também enfrentaram dificuldades com as autarquias, o que os obrigou a diminuir o tempo da medida de 16 horas mensais para oito. Houve também oposição por parte de funcionária que reclamavam licenças semelhantes para os maridos que sofriam de enxaquecas ou que receavam que a medida estigmatizasse as mulheres ou rotulasse a menstruação a algo sempre associado a dor.
Perante estas críticas, a representante sindical prefere não responder, destacando o plano geral da questão. “Acho fantástico termos conseguido atingir isto. Este é um assunto das mulheres em todo o mundo, há muita vergonha em relação a ele e ninguém o está a resolver. Nós conseguimos fazê-lo“, destacou.
Ainda assim, ressalva, o avanço não termina aqui, já que o percurso em direção a um ambiente de trabalho que considere e flexibilize as questões relacionadas com a dor crónica é uma obrigação, considera. “Tudo isto acaba por ser uma uma viagem para melhorar os espaços de trabalho para os homens e para as mulheres, tanto no setor privado como no público.”