E se o número zero não existisse?

E se o sistema numérico que usamos atualmente não tivesse o número zero (0)?

Pode parecer uma ideia completamente louca, mas o matemático James Foster propôs exatamente isso em 1947. No seu sistema reimaginado, os números funcionam como os nossos, com uma ligeira diferença: não há zero.

Imaginemos o nosso sistema decimal, onde os dígitos representam caixas para objetos. No nosso sistema atual, quando chegamos a 10 objetos, usamos um zero para denotar a ausência de objetos na “caixa” das unidades, e passamos para a caixa seguinte, as dezenas.

O sistema de Foster pede-nos para não o fazer, ou pelo menos, para adiar a colocação de objetos nas caixas.

No modelo de Foster, o 10 torna-se “T”, com números como 20 escritos como 1T, o que significa uma dezena encaixotada, mais uma dezena solta. Ou seja, nunca é necessário o zero. Por exemplo, 30 torna-se 2T e 106 neste sistema tornar-se-ia T6, enquanto, imaginemos, o número 3.090, é escrito como 2T8T.

Embora este sistema não tenha zero, é logicamente correto — os números com zeros simplesmente assumem novas formas.

Um mundo sem o zero

Já sabemos então que é possível um mundo sem zeros.

Na verdade, o zero não existiu durante séculos, bem como não existiu a ideia do “nada”, em várias sociedades humanas. A primeira aparição conhecida do zero remonta ao século III ou IV no subcontinente indiano — muito depois de comerciantes babilónicos da Mesopotâmia terem gravado em placas de argila uma versão elementar do conceito de zero, com um algarismo de reserva, espremido entre outros, para distinguir números como 50, 505 e 5.005.

Na Índia, o conceito de “shunya“, que significa nada, foi adotado não só como uma ideia abstrata mas também como um símbolo numérico funcional. Atribui-se ao astrónomo indiano Brahmagupta a formalização da utilização do zero para cálculos matemáticos, permitindo-lhe ser adicionado, subtraído e multiplicado como qualquer outro número. Embora a divisão por zero continuasse a ser um desafio, estes primeiros avanços lançaram as bases para futuras descobertas na matemática, explica a matemática Hannah Fry À BBC Radio 4.

“O zero é, para muitos matemáticos, definitivamente considerado um dos maiores – ou talvez o maior – feito da humanidade”, disse o neurocientista Andreas Nieder citado pela Quanta.

Mas “a dificuldade não foi descobrir o zero”, como explica o autor Richard Urwin. Importante foi, sim, “a notação do valor posicional: “foi o zero envolvido quando se escreve ’10’ que constituiu o salto quântico”, explica.

“O que é que o zero significa? Absolutamente nada; é apenas um espaço reservado e, no entanto, transforma o um de uma única coisa em dez coisas. Parece-nos estranho agora, mas foi preciso muito tempo para que os chamados algarismos árabes (na verdade, foram inventados na Índia e só chegaram até nós através do mundo árabe) fossem considerados fiáveis na Europa”, escreve.

“Se o zero não tivesse sido inventado, ainda estaríamos a utilizar a notação romana, tal como fazíamos antes da introdução dos algarismos árabes. E continuaríamos a dar o mesmo conselho aos nossos filhos: “Se só precisa de aprender a adição e a subtração, uma universidade alemã é suficiente, mas se precisa de fazer multiplicações e divisões, tem de ir para Itália”. Se não acredita que é assim tão mau, tente multiplicar VII por VI sem passar para a notação árabe”, sugere ainda o autor.

Dos aniversários aos salários, muita coisa mudaria. Um grande exemplo de algo que não existiria são os computadores como os conhecemos, que só compreendem linguagem dos números binários, ou seja, ‘zeros’ e ‘uns’. O mesmo se aplica a softwares eletrónicos e chips.

Assim, não haveria smartphones, relógios digitais, televisão, portáteis, nem nada do que funcione com eletrónica — pelo menos, não existiriam como os conhecemos hoje.

ZAP //

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