Duas horas e meia por dia gastas nas redes sociais. Mas o panorama está a mudar em diversas casas.
Se este artigo fosse escrito há 20 anos, referir “redes sociais” seria em vão. Os leitores não saberiam o que é isso.
Em 2022, uma pessoa gasta em média cerca de duas horas e meia por dia nas redes sociais, de acordo com um estudo divulgado já neste ano.
Rotina ou hábito? Vício ou dependência? As classificações variam, mas é certo que as redes sociais tomaram conta do dia-a-dia de milhões de pessoas, ao longo da última década.
“Sem dúvida, a sociedade desenvolveu uma forte dependência das redes sociais – e da internet, de forma geral – durante a pandemia“, resume na BBC Nuno Albuquerque, consultor da UK Addiction Treatment.
A UK Addiction Treatment é uma organização, no Reino Unido, que tenta ajudar pessoas que procuram auxílio por estarem dependentes das redes sociais.
As plataformas são, muitas vezes, um escape. São um refúgio (mesmo que inconsciente).
“É simplesmente uma forma de conectar-se sem conexão, um conforto disponível a todo momento para fazer companhia a muitas pessoas”, continua Nuno.
No entanto, parece que o cenário está a mudar…
Já em 2022 o Facebook anunciou que, pela primeira vez, o número de utilizadores daquela rede social baixou ao longo de um ano. E o Twitter admitiu no mês passado que há menos publicações.
As pessoas – algumas – estão a deixar as redes sociais.
Precipício para a fuga
Gayle Macdonald é um dos exemplos. A coach pessoal, especializada em ajudar viciados em álcool, passava em média 11 horas por semana nas redes sociais.
Aos 45 anos, deixou as redes sociais por causa…de um precipício. Aconteceu em Sierra Nevada, Espanha: para se mostrar na internet, tirou uma fotografia – e poderia ter caído por causa dessa publicação, ao aproximar-se em demasia do precipício.
O marido alertou-a do perigo. E foi um aviso que foi para além daquela imagem: “Foi como se alguém dissesse que isto tinha de parar“.
E parou.
Saiu do Facebook, saiu do Instagram; apenas uma semana depois desse momento.
Deixou de pensar em tirar uma fotografia sempre que saía do carro, deixou de estar viciada em criação de conteúdos para a internet.
E não tem vontade de voltar: “Foi bem libertador. Estou agora há mais de seis meses sem entrar em redes sociais e recuperei parte daquela sensação de paz e liberdade que experimentei quando parei de beber”.
“É tão libertador sentar e tomar uma chávena de chá sem me preocupar com a imagem, com a legenda e se deve ou não ser um story, reel ou publicação. Reparei que há mesmo outras coisas na vida, além disso”, confessa.
Curiosamente, quando anunciou no Instagram que iria sair, esse anúncio foi a publicação mais vista na sua página. E nos comentários lia-se: “Que coragem, quero fazer o que estás a fazer“.
“Perda de tempo”
Urvashi Agarwal, empresária, depois de uma tentativa frustrada em 2014, conseguiu mesmo sair do Instagram.
“Era uma grande perda de tempo e mais: parece que simplesmente há cada vez menos privacidade no mundo. Tudo o que fazes é constantemente publicado”, descreve.
“Adoro esta liberdade. Agora, leio 15 páginas de um livro todas as noites”, resume, feliz.
Kashmir, directora de relações públicas, abandonou as redes sociais por causa da sua saúde mental.
“Existe muita pressão para acompanhar o que as outras pessoas estão a fazer – que na verdade não é a realidade daquela pessoa. Eu passava noites a ver as publicações dos outros e depois dormia mal”, recorda.
Agora, longe das redes sociais, deixou de estar constantemente a fazer comparações com as vidas dos outros.
Há menos utilizadores no Facebook, há menos publicações no Twitter e há mais pessoas (aumento de 5%) a tentar sair das redes sociais, com ajuda da UK Addiction Treatment.
Nuno Albuquerque deixa uma previsão pouco optimista: “É provável que, em algum momento, começaremos a perceber os danos que as redes sociais podem causar às nossas relações, à nossa saúde mental e à nossa experiência dos momentos da vida real”.
“Começaremos”? Ou já começámos?